Ao apresentar na noite de segunda-feira, 13, os números de seu desempenho no terceiro trimestre, a varejista Magazine Luiza (BVMF:MGLU3) trouxe uma surpresa em seu balanço: uma redução de R$ 830 milhões no patrimônio líquido, atribuída pela empresa a erros em lançamentos contábeis. O ajuste foi feito após uma denúncia anônima, divulgada pela própria empresa em março passado.
De acordo com a varejista, a denúncia de que práticas de bonificação feriam seu código de ética não se confirmou. Porém, depois de nove meses de auditoria externa realizada pelo escritório TozziniFreire Advogados e pela PwC, o pente-fino identificou erros no lançamento de bônus pagos a fornecedores entre janeiro de 2022 e junho de 2023.
Por essa apuração, a empresa contabilizava esses bônus com base na data da emissão das notas fiscais. A rigor, porém, esses valores só deveriam ser reconhecidos depois que todos os produtos fossem vendidos e as campanhas de venda, encerradas. Em outras palavras, Magalu e fornecedores negociavam um "abatimento" caso a varejista atingisse uma meta de vendas. Por falha de controle da área, o abatimento teria sido contabilizado antes de a meta ser efetivamente atingida.
Segundo analistas da XP (BVMF:XPBR31), a companhia "reconheceu essas receitas de bonificação (que reduziram custos e contas de fornecedores), anteriormente ao cumprimento da respectiva meta de desempenho, que faziam com que o lucro bruto e o lucro líquido fossem maiores".
Descasamento
Com isso, o ajuste acumulado foi de R$ 830 milhões no patrimônio líquido e de R$ 1,3 bilhão na conta de fornecedores. Antes de 2022, as perdas no patrimônio líquido somaram R$ 696 milhões e, após o ano passado, R$ 225 milhões. No primeiro semestre, significaram a entrada de R$ 92 milhões.
Segundo a empresa, esse descasamento, causado pela inexistência de um sistema de controle automatizado dos pagamentos, teria sido corrigido. A empresa disse ter aprimorado os sistemas de gestão de verbas de fornecedores e os mecanismos para acompanhar o cumprimento e o desempenho de cada negociação, bem como os mecanismos de governança para negociação das bonificações. Também diz ter revisto as matrizes de risco e controles internos de negociação comercial, além da rotina da auditoria interna.
Ao mesmo tempo, o Magalu informou ter reconhecido créditos fiscais referentes a PIS/Cofins, de R$ 507 milhões, sobre bonificações recebidas de seus fornecedores antes de 2022. Segundo a empresa, a mudança foi feita após uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que determinou que a compra de produtos com desconto representa redução de custo para o varejista, e não entrada de receita. Por isso, não caberia o recolhimento dos impostos.
Essa compensação, aliás, permitiu à empresa reduzir em R$ 507 milhões o impacto da baixa em seu patrimônio líquido em seu balanço.
Decisões contrárias
Porém, conforme noticiou o Estadão/Broadcast, sistema de notícias em tempo real do Grupo Estado, como a decisão do STJ não é vinculante vários tribunais têm dado decisões contrárias a essa, e o Magazine Luiza pode ter de recorrer ao Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) ou mesmo à Justiça para buscar o mesmo entendimento.
A denúncia anônima recebida pelo Magalu foi feita em meio à maior crise de crédito vivida pelo varejo no País nos últimos anos após a Americanas (BVMF:AMER3) ter anunciado um rombo de R$ 21 bilhões em seu balanço. O rombo na Americanas, porém, envolveu contratos fictícios de publicidade, além de fraudes nos registros de antecipação de recebíveis - que o comando da empresa disse se tratar de fraude contábil.
Nesta terça, 14, um grupo de acionistas minoritários do Magalu representado pelo Instituto Empresa requereu à Bolsa de Valores a "suspensão imediata" da varejista do Novo Mercado e dos índices que integra em razão dos erros nos seus lançamentos contábeis. "A arbitragem que está sendo organizada visa a responsabilização dos controladores e o ressarcimento dos investidores que adquiriram o papel com preço artificializado pelos erros contábeis", diz nota do Instituto Empresa.
Na avaliação do instituto, o investidor teria sido induzido ao erro. "Aquisições de ações e em debêntures foram realizadas com base em números falsos", afirma Eduardo Silva, presidente do Instituto Empresa.
Em resposta, a empresa afirmou "que os ajustes realizados seguiram as normas contábeis e foram feitos no melhor interesse da companhia e de seus acionistas". Ainda segundo a empresa, "tais ajustes não representaram nenhum prejuízo ou perda para nenhum de nossos investidores".
Ainda ontem, a Bolsa pediu esclarecimentos à empresa acerca de avaliações do mercado de que a varejista teria de fazer um aumento de capital da ordem de R$ 2 bilhões - no qual a família Trajano, controladora do grupo, entraria com cerca de metade do valor. Na apresentação do balanço, porém, executivos da empresa negaram a informação. "Não existe discussão, neste momento, de necessidade de aumento de capital da empresa", disse o diretor financeiro, Roberto Bellissimo.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.