Por Gabriela Mello
SÃO PAULO (Reuters) - A MRV (SA:MRVE3) não espera uma ruptura do programa habitacional Minha Casa Minha Vida (MCMV), mas já vem se empenhando para diversificar negócios e desenvolver ferramentas para fomentar o mercado imobiliário, antecipando-se a mudanças significativas no comportamento do consumidor.
"A chance de ruptura é muito pequena e somos a empresa mais protegida do mercado caso haja mudanças", afirmou nesta quinta-feira o copresidente da maior construtora habitacional da América Latina, Rafael Menin.
Os comentários foram feitos em encontro com investidores e analistas no empreendimento Gran Reserva Paulista, o maior já lançado pela MRV, com 7.300 apartamentos e Valor Geral de Vendas (VGV) de quase 2 bilhões de reais.
E o projeto terá continuidade depois que a construtora fechou recentemente contrato para lançar mais 11 mil unidades em localização próxima. "Fechamos uma área para dar continuidade ao empreendimento”, contou o também copresidente da empresa, Eduardo Fischer, destacando o estágio avançado do licenciamento.
Os esforços para criar novas frentes de negócio começaram no fim do ano passado, quando a MRV anunciou a retomada de projetos para médio padrão financiados por meio do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE).
"Não me surpreenderia se dentro de cinco anos 50 por cento da nossa receita líquida já não viesse do FGTS", afirmou Menin. Atualmente, 98 por cento da receita líquida da MRV é gerada por empreendimentos de baixa renda financiados pelo FGTS.
A construtora já lançou dois projetos via SBPE em 2018 --um em Belo Horizonte e outro em Salvador-- e planeja acelerar os lançamentos a partir do próximo ano. A estimativa é de que pelo menos 5 por cento da receita líquida venha de empreendimentos de médio padrão já em 2019.
Entre outras estratégias para diversificar a operação e mitigar riscos, a MRV está criando startups dentro do grupo para desenvolver novas soluções para o mercado imobiliário. Uma delas é a Luggo, já em fase piloto em Belo Horizonte (MG), para aluguel de imóveis por meio de uma plataforma digital.
"Estamos estudando como capturar a demanda crescente (por habitação) em um cenário de financiamento limitado", explicou Menin. De acordo com ele, o modelo desenvolvido requer baixo consumo de capital e a ideia é aglutinar as unidades locadas e depois vendê-las para fundos de investimento imobiliário, os chamados FIIs.
Além do projeto em Belo Horizonte, que já está sendo alugado por valores que variam de 1 mil a 1,5 mil reais por mês, a MRV também lançará outros empreendimentos exclusivos para locação em Curitiba e Campinas no próximo ano.
A companhia também vem conversando com dois bancos privados para desenvolver no começo de 2019 um protótipo de consórcio imobiliário. "É um modelo pouco difundido… Temos uma startup dentro da companhia olhando para essa modalidade com parcela parecida à do MCMV, em torno de 800 reais", contou Menin.
Dentro do SBPE, o Santander Brasil (SA:SANB11) está lançando em parceria com a MRV um piloto para concessão de financiamento imobiliário ainda na fase de obras, uma modalidade operada atualmente apenas pela Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil (SA:BBAS3).
"Seremos o primeiro banco privado a entrar nessa modalidade", disse o diretor de produtos de crédito e recuperações, Cassio Schmitt, citando apetite para montar uma carteira de 500 milhões a 1 bilhão de reais no primeiro ano.
A construtora espera encerrar 2018 com um crescimento de 25 por cento nos lançamentos de imóveis e de 20 por cento nas vendas em relação a 2017. "E tudo indica que vamos entrar em 2019 com o pé no acelerador", disse Fischer.
2019 EM DIANTE
A MRV elevou significativamente os desembolsos nos últimos anos para se preparar para o futuro, mas os executivos avaliam que, conforme os investimentos se traduzem em ganhos de eficiência na operação, a tendência é diminuir as despesas com vendas, gerais e administrativas.
A meta é reduzir essa linha do balanço, conhecida como SG&A, para 16,5 por cento da receita líquida em 2019, ante 17,7 por cento no acumulado deste ano até setembro, e eles veem chance de níveis abaixo de 15,5 por cento nos anos posteriores.
"É a forma como a companhia gere o negócio, com SG&A um pouco mais pesado, mas esse investimento vai se pagar com uma folga lá na frente", disse Menin.
Ele também aproveitou o encontro desta quinta-feira com analistas e investidores para manifestar sua insatisfação com a atual precificação da ação da MRV. "Estamos extremamente incomodados com nossa ação a 12 reais e os menores múltiplos do setor. Custou caro entrar e atuar de forma madura em 157 cidades", desabafou.
Na avaliação dele, o desconto no preço do papel é exagerado. "Nos deixa chateados quando o mercado reconhece nosso trabalho, mas fica incerto sobre o que vem pela frente no novo governo", acrescentou, referindo-se às dúvidas sobre os planos da equipe do presidente eleito Jair Bolsonaro para o MCMV e sobre a disponibilidade de recursos para financiamento imobiliário.
"O mercado está precificando como se tudo de errado acontecesse", continuou Menin, lembrando que o grupo segue convicto de que as escolhas feitas se mostrarão acertadas no médio prazo.
O objetivo final da MRV, de acordo com ele, é agregar todas as soluções que estão sendo desenvolvidas em uma plataforma única, na qual o cliente poderá optar pela compra, consórcio ou aluguel de imóveis.
"A indústria não pensa assim hoje. A partir do momento que entrega as chaves o cliente vira passivo. Queremos torná-lo um ativo", compartilhou Menin.
Questionado sobre planos de internacionalização da MRV, ele revelou que essa é uma possibilidade no radar da companhia para o médio prazo, mas não é uma prioridade por enquanto.
Por volta das 17:10, as ações da MRV subiam 1 por cento, a 12,10 reais, enquanto o Ibovespa caía 0,64 por cento, em sessão bastante negativa na bolsa paulista, pressionada pelo cenário negativo no mercado externo.
GALPÕES LOGÍSTICOS
Em outra frente, a Log Commercial Properties, subsidiária da MRV com atuação em galpões logísticos e que está em processo de cisão, espera expandir seu portfólio para 2 milhões de metros quadrados até 2023, disse o diretor de relações com investidores da companhia, Felipe Enck.
"Nosso portfólio deve atingir já 1 milhão de metros quadrados no próximo ano", afirmou o executivo, referindo-se à Área Bruta Locável (ABL) entregue.
Enck observou que a projeção leva em conta a evolução do comércio eletrônico no país, bem como a melhora do cenário macroeconômico e os ganhos de escala e eficiência operacional da Log. "O ecommerce vai mudar a forma como os produtos são consumidos… Existe uma migração do offline para o online”, comentou Enck.
A expansão do portfólio deve impulsionar a geração de fluxo de caixa da Log, com chance de superar 260 milhões de reais em 2023, afirmou o diretor.
A subsidiária de galpões logísticos está em processo de listagem no Novo Mercado da bolsa paulista, o segmento de mais alta governança da B3. O conselho de administração da companhia se reúne em 12 de dezembro para deliberar sobre o movimento e a expectativa é de que os papéis estreiem na bolsa em 18 de dezembro.