Por Marta Nogueira
RIO DE JANEIRO (Reuters) - Pedro Parente renunciou à presidência da Petrobras (SA:PETR4) nesta sexta-feira, em meio a discussões e pressões sobre a política de preços da petroleira estatal desencadeadas por uma grande paralisação de caminhoneiros contra a alta do diesel ter causado forte impacto na economia do país.
A saída, que veio depois de diversas negativas da Petrobras de que o executivo fosse deixar o cargo, surpreendeu o mercado e levou a bolsa paulista B3 a suspender a negociação de ações da estatal no início do pregão.
Após a liberação, as ações preferenciais e ordinária chegaram a cair 21,5 por cento e 22,3 por cento. Às 15h06, os papéis tinham recuperado algum terreno, mas ainda sofriam forte quedas, de 12,9 por cento e 12,4 por cento.
Em sua carta de demissão, dirigida ao presidente Michel Temer, Parente disse que movimentos na cotação do petróleo e no câmbio elevaram os preços de derivados, "magnificaram as distorções de tributação no setor" e levaram o governo a buscar alternativas, com a decisão de subsidiar o consumo de diesel.
"Tenho refletido muito sobre tudo o que aconteceu. Está claro, sr. presidente, que novas discussões serão necessárias. E, diante deste quadro fica claro que a minha permanência na presidência da Petrobras deixou de ser positiva e de contribuir para a construção das alternativas que o governo tem pela frente", escreveu Parente.
"Não tenho qualquer apego a cargos ou posições e não serei um empecilho para que essas alternativas sejam discutidas", acrescentou.
Uma fonte da estatal, que pediu para não ser identificada, se disse surpresa com a renúncia de Parente.
"Talvez, alguma coisa que ele tenha dito, que era absolutamente fundamental, não tenha sido possível. E ele sempre falou que enquanto havia liberdade, independência, e a direção correta, ele ficaria", disse a fonte à Reuters.
"Agora o momento político foi realmente muito grave, essa situação toda, o país parou. Pode ser que ele esteja avaliando que isso seja um ato também de grandeza para facilitar que as coisas continuem a avançar", acrescentou a fonte.
Uma segunda fonte da Petrobras afirmou que Parente já tinha manifestado algum incômodo com o que vinha ocorrendo, que ele estava sob pressão, mas não tinha falado em renunciar.
Segundo a fonte, alguma mudança na política terá que ser realizada.
"Não dá para voltar ao controle de preços e ficar na paridade internacional... temos que encontrar o meio do caminho e ver se há nesse meio do caminho outras alternativas que não venham afetar a empresa", disse a segunda fonte.
A Petrobras informou que a nomeação de um presidente interino será examinada pelo Conselho de Administração ainda nesta sexta-feira e que a composição dos demais membros da diretoria executiva da companhia não sofrerá qualquer alteração. Uma das fontes disse que a o conselho irá se reunir às 16h.
SENSIBILIDADE SOCIAL
A renúncia de Parente ocorre diante de uma forte pressão sofrida com a paralisação de caminhoneiros contra os valores do diesel, que provocou um desabastecimento generalizado e afetou diversos setores da economia.
Diante da greve, que o governo disse na quinta-feira ter chegado ao fim após acordo com a categoria, a Petrobras concordou em reduzir a frequência dos reajustes do combustível por um determinado período, contando que a União pague pelos prejuízos causados à empresa.
O presidente do Senado Federal, Eunício Oliveira, disse em sua conta do Twitter nesta sexta-feira que "o presidente de uma empresa monopolista como a Petrobras, precisa reunir visão empresarial, sensibilidade social e responsabilidade política".
Sem detalhar, Eunício defendeu ainda que a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) "deve ter participação mais ativa na formação dos preços dos combustíveis."
À Reuters, o diretor-geral da ANP, Décio Oddone, afirmou desconhecer a afirmação feita por Eunício e evitou comentar os movimentos na Petrobras.
"Não tenho nenhum comentário em relação a isso, é uma troca de executivos de uma das empresas que a gente regula, como tantas outras. É uma questão interna da Petrobras", disse Oddone.
A possível ausência de sensibilidade de Parente, na administração da política de preços da Petrobras, foi citada ainda por especialistas de mercado, que defendiam as medidas que vinham sendo implementadas pelo ex-presidente.
"É fácil dizer após, vendo depois do que aconteceu, (mas) faltou sensibilidade do governo e da Petrobras em relação a política de preços, no alinhamento diário. O governo errou porque não reduziu os impostos a tempo e a Petrobras não teve sensibilidade em relação aos impactos diários", afirmou o pesquisador do Grupo de Economia da Energia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Edmar Almeida.
"É um desastre para a empresa. O Parente era um fiador de uma estratégia", acrescentou Almeida, destacando acreditar que diversas medidas em curso, como as vendas de ativos, podem ser paralisadas no curto prazo, até que se veja maior estabilidade da empresa.
O ex-diretor da ANP Helder Queiroz afirmou que houve uma interferência enorme do governo na Petrobras e que não viu com surpresa a renúncia de Parente: "Ele certamente estava ali desconfortável com a intervenção."
Segundo Queiroz, a política de preços da empresa tinha acertos e também equívocos e que a decisão do executivo "aborta o processo de reestruturação financeira, abala também a credibilidade frente aos mercados".
Ele avaliou, no entanto, que a passagem para o reajuste diário "foi um grande equívoco", não se mostrando sustentável.
"Quando o preço (do barril) subiu a 80 dólares/barril e o câmbio se desvalorizou... faltou ali até sensibilidade política com relação a como o mercado e os consumidores se posicionam e se organizam", disse Queiroz.
NOVA POLÍTICA?
Em um vídeo disseminado nas redes sociais por executivos da companhia nesta semana, Parente defendeu a frequência diária de reajustes dos combustíveis nas refinarias da Petrobras, dizendo que a medida era fundamental para que a empresa defendesse sua participação de mercado no Brasil.
O secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Félix, afirmou a jornalistas em Brasília nesta sexta-feira que o governo federal quer propor uma nova política de preços para o consumidor final de combustíveis, mas sem impacto para a Petrobras e demais empresas do setor.
"A gente espera antes, bem antes do final do ano, já propor, já apresentar uma nova política para o consumidor, não para a Petrobras ou para qualquer fornecedor", disse ele, após uma reunião com distribuidores de combustíveis.
A política de preços da Petrobras vinha sendo alvo de ataques de políticos e de sindicatos de trabalhadores da companhia.
Os petroleiros chegaram a realizar uma greve na quarta e quinta-feira contra as práticas de preços da Petrobras e contra a continuidade da gestão de Parente.
Nesta sexta-feira, o coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), José Maria Rangel, comemorou a saída do presidente da Petrobras como uma "vitória" da categoria e dos caminhoneiros.
"Pedro Parente, vaza!"..."Tchau, querido!", escreveu o sindicalista em mensagens nas redes sociais.
Sindicatos de petroleiros faziam forte oposição à gestão de Pedro Parente, devido às decisões de cortes de pessoal, de custos, vendas de ativos, dentre outros movimentos, como a própria política de preços.
Já a reação do mercado e de investidores é bem distinta, uma vez que Parente era amplamente visto como um executivo que vinha obtendo sucesso na recuperação da companhia após anos de perdas associadas a controle de preços e corrupção.
"O mercado, em geral, não acha a mínima graça. Desta vez o nível de preocupação é maior... como efeito indireto, o mau humor (do mercado em relação ao governo) vai dar uma piorada", disse o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves.
(Reportagem adicional de Rodrigo Viga Gaier, no Rio de Janeiro, de Iuri Dantas e Luciano Costa, em São Paulo, e de Mateus Maia, em Brasília)