SÃO PAULO (Reuters) - O setor de transmissão de energia elétrica está descapitalizado e com taxas de retornos calculadas em cima de dados defasados, o que dificulta a atração de investidores em um momento em que o financiamento é caro e escasso, afirmou o presidente da Associação Brasileira das Empresas de Transmissão (Abrate), Mário Miranda.
Na quarta-feira, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) realizou um leilão que ofertou 11 lotes de empreendimentos de transmissão, dos quais apenas quatro receberam ofertas, provenientes de três empresas --a espanhola Isolux, a estatal goiana Celg GT e a Planova, estreante no setor.
Para o representante da Abrate, um dos problemas por trás da descapitalização do setor é a demora para a definição indenizações relacionadas a renovações de concessões de contratos por uma tarifa menor. A grande maioria das trasmissoras aguarda os recursos desde 2013.
Apenas a Eletrobras (SA:ELET3) estima ter 21 bilhões de reais a receber, enquanto a Cteep calculou ter direito a 5,2 bilhões de reais e a Copel pede 882,3 milhões de reais.
"Essas empresas, que tiveram contratos prorrogados, normalmente abocanhavam 62 por cento do que era ofertado em leilão, só que agora elas estão totalmente descapitalizadas, não têm como investir", disse Miranda.
Recentemente, o especialista em energia da consultoria Deloitte, Luis Carlos Tsutomu, disse à Reuters que a definição sobre essas indenizações deve melhorar competição nos certames. "É um valor considerável no fluxo de caixa de todas elas, que deve facilitar com que elas retornem aos leilões", apontou.
Um ofício da Aneel sugeriu que as indenizações comecem a ser quitadas por meio de uma elevação nas tarifas de transmissão a partir do ciclo 2015/2016, mas ainda não há uma posição do governo sobre o assunto.
RECURSOS ESCASSOS
Segundo Miranda, com a indefinição sobre as indenizações, referentes a investimentos não amortizados das empresas quando da renovação das concessões, as empresas direcionam recursos prioritariamente para reforços e melhorias nos sistemas de transmissão existentes, uma vez que estes aportes são obrigatórios para manter a qualidade do sistema.
Além disso, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) reduziu para 50 por cento, ante 70 por cento, a participação nos empreendimentos de transmsissão.
"O restante dos recursos tem que ser buscado de outra forma, e as debêntures de infraestrutura não têm a mesma atratividade... e o ambiente não está tão bom para buscar dinheiro no exterior", apontou Miranda.
O dirigente da Abrate também questionou a taxa de retorno dos empreendimentos, embora a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) tenha afirmado na quarta-feira que elevou a remuneração "substancialmente" neste ano.
"O leilão mostrou que está havendo problema... em que pese que a Aneel promoveu o ajuste (da taxa de retorno), o banco de preços de referência utilizado pela agência para estabelecer os preços teto está desatualizado há mais de cinco anos", disse Miranda.
O especialista criticou ainda os riscos ambientais, com demora na liberação de licenciamentos pelos órgãos responsáveis, como o Ibama, o Iphan e a Funai. A Abrate estima que atrasos decorrentes de problemas ambientais resultaram em 3,8 bilhões de reais em multas às transmissoras desde 2006.
"Não está havendo uma correlação entre riscos e taxa de retorno, principalmente para os grande projetos estruturantes. Os projetos que estão sendo arrematados são os de menor porte", lamentou Miranda.
Para o presidente da Abrate, esse quadro faz com que grandes players internacionais hoje prefiram investir em outros países, o que, aliado à descapitalização das empresas brasileiras, resulta nos leilões esvaziados.
"A partir de 2012, a maioria dos lotes ofertados deu vazio ou teve apenas um competidor. Precisamos fazer um diagnóstico apurado da realidade, e não da realidade virtual", criticou o dirigente.
(Por Luciano Costa)