Por Luciana Bruno
RIO DE JANEIRO (Reuters) - As receitas de dados das operadoras de telecomunicações devem subir a um ritmo superior após elas cortarem a Internet dos usuários de telefonia móvel que consumirem toda a franquia -- em vez de reduzir a velocidade como ocorre atualmente.
As receitas líquidas das operadoras com serviços de dados têm crescido numa média de 20 por cento ano a ano, segundo dados de balanço das operadoras. De acordo com especialistas, esse crescimento tende a se intensificar com a decisão de cortar a Internet após o consumo da franquia, o que pode elevar o número de consumidores que contratam pacote adicional.
A Telefônica Brasil, dona da Vivo, informou nesta segunda-feira que a partir de novembro, nos Estados do Rio Grande do Sul e Minas Gerais, não mais reduzirá a velocidade da Internet móvel dos usuários pré-pagos após o fim da franquia de dados. A Internet será agora cortada e, caso os usuários queiram voltar a acessar a Web, precisarão fazer pagamento adicional.
Segundo a empresa, a mudança poderá ser estendida a outras regiões nos próximos meses. Os clientes vão receber um SMS quando o consumo atingir 80 por cento da franquia e outro no momento em que ela acabar, com a opção de contratação de pacote adicional. De acordo com a empresa, o mesmo ajuste será feito para clientes pós-pagos, sem especificar quando isso ocorrerá.
"A empresa está trabalhando em ajustes sistêmicos e fará o anúncio sobre a mudança aos seus usuários com a antecedência necessária", disse a Telefônica Brasil, em nota.
A Oi informou por sua vez que está avaliando se adotará a mesma estratégia, e que o fim da velocidade reduzida, aliada ao modelo de cobrança adicional, é uma tendência mundial.
A TIM disse que por enquanto não fará ajustes, mas que avalia "diferentes possibilidades". Segundo a empresa, "mudanças no formato de tarifação de dados móveis são um movimento natural, em linha com o crescimento contínuo do uso de Internet nos celulares". Já a Claro declarou que mantém a velocidade reduzida e não informou se analisa tomar a mesma medida que as concorrentes.
O aumento da receita de dados é a forma que as operadoras encontraram de compensar a queda das receitas com o serviço de voz. Com a mudança de estratégia, a previsão é que as receitas de dados cresçam mais rápido, disse Eduardo Tude, presidente da consultoria especializada Teleco. Atualmente, as receitas de dados respondem por 30 por cento do faturamento das operadoras.
"Quando começou a banda larga, as operadoras ofereciam pacotes ilimitados como ocorre na fixa. Depois viram que não era viável fazer isso no móvel, por uma questão de custo", disse Tude, mencionando a infraestrutura das redes móveis.
A medida é vista com ceticismo pelo sociólogo e ativista da inclusão digital Sérgio Amadeu. "Certamente, é uma medida de completo desequilíbrio econômico em relação ao consumidor", disse. Segundo ele, mesmo com a franquia integralmente disponível, o consumidor paga por uma Internet que não recebe.
De fato, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) estabelece que as operadoras entreguem no mínimo 70 por cento da velocidade da banda larga fixa ou móvel contratada. Esse patamar mínimo subirá para 80 por cento em 1º de novembro, disse a agência por meio de sua assessoria de imprensa.
A Anatel informou ainda que a oferta de banda larga é feita em regime privado, de acordo com a Lei Geral de Telecomunicações (LGT). "Este regime pressupõe liberdade como regra, inclusive tarifária, constituindo exceção as proibições, restrições e interferências do poder público", disse em comunicado.
A organização de defesa do consumidor Proteste disse que vai questionar a Anatel sobre os planos das operadoras, disse Maria Inês Dolci, coordenadora institucional da entidade.
MARCO CIVIL
A decisão das operadoras não fere o Marco Civil da Internet, espécie de Constituição da Web no Brasil, aprovado este ano e que aguarda regulamentação, disse Ronaldo Lemos, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro e um de seus idealizadores.
"O artigo sétimo do Marco Civil diz que o usuário tem direito à não suspensão do serviço de Internet, exceto se houver débito", declarou. "Nesse sentido, quando é por questão econômica, está permitida a suspensão da conexão", disse.
Segundo Lemos, o Marco Civil protege o usuário apenas quando há corte abusivo. "Como ocorreu na França, que chegou a cortar a Internet de usuários que fizessem download de música."
O advogado Renato Ópice Blum, especializado em direito eletrônico, endossou essa visão. Segundo ele, esse artigo da lei não precisa de regulamentação porque não há dupla interpretação.
A expectativa é que o Marco Civil seja regulamentado após as eleições presidenciais.
(Por Luciana Bruno; edição de Aluísio Alves)