Por Aluisio Alves
SÃO PAULO (Reuters) - Num passado recente, sugerir o uso de cartão de crédito para pagar transporte público no Brasil era motivo de piada, dada a conhecida repulsa dos comerciantes contra o uso desse instrumento para transações de pequenos valores devido às elevadas taxas cobradas pelas empresas de meios de pagamentos.
Agora, executivos de empresas do setor esfregam as mãos com o início do uso desses cartões para pagar viagens de ônibus na capital paulista, a ser oficializado nesta quinta-feira, o que alguns executivos da indústria vêem como o potencial propulsor dessa indústria nos chamados micropagamentos.
De fato, o espaço para crescimento é relevante. Nove em cada 10 transações no Brasil com valores abaixo de 10 reais são pagas em dinheiro, segundo dados do Banco Central referentes a 2018.
Mas com a recente guinada na concorrência, que tem derrubado tarifas e estimulado comerciantes a aceitarem cartões para pagamentos de valores nominais cada vez menores, e o crescente uso de tecnologias, como as de pagamento por aproximação, que dão ganhos de escala nos custos transacionais, o interesse do setor por operações de valor unitário baixo tem crescido rápido.
A expectativa de executivos da indústria é de que a adesão da maior cidade da América Latina no uso do pagamento eletrônico do transporte público seja um trampolim para a popularização dos cartões para pagar valores menores.
"Seria uma prévia do potencial desse mercado no Brasil", diz Carlos Netto, presidente da Matera, empresa de soluções tecnológicas para fintechs.
É verdade que o uso de cartões na mobilidade urbana já tem sido testado há três anos no país, incluindo algumas capitais. Só no Rio de Janeiro, uma parceria nesse modelo envolvendo Cielo e Visa para o metrô da capital fluminense já teve cerca de 300 mil transações desde abril, mesmo num piloto.
Mas os números superlativos da capital paulista aguçam a cobiça dessa indústria. Segundo a Secretaria Municipal de Mobilidade e Transportes de São Paulo, só em agosto o sistema de ônibus urbanos da capital transportou 232,7 milhões de passageiros.
Só o pagamento de ônibus urbano em São Paulo, a 4,30 reais por viagem, movimenta cerca de 12 bilhões de reais por ano. Uma tarifa média pouco acima de 2% de MDR, a taxa que as adquirentes cobram dos lojistas, representaria uma receita ao redor de 250 milhões de reais.
Esse bolo será dividido entre as bandeiras Mastercard e Visa, as adquirentes Cielo (SA:CIEL3) e Stone (NASDAQ:STNE), que participarão do convênio com a prefeitura paulistana, além das companhias de bilhetagem eletrônica Prodata, Digicom e Empresa 1, segundo uma fonte a par do assunto.
Em nível nacional, a estimativa de analistas é que a mobilidade urbana geral movimente cerca de 40 bilhões de reais por ano, o que representaria receitas potenciais de 1 bilhão de reais para os pagamentos eletrônicos.
Para Netto, da Matera, porém, essa indústria pode estar chegando tarde, uma vez que tende a enfrentar em breve a competição do pagamento com QR Code, por meio de telefones celulares.
"O QR Code tende a ganhar expressão a partir do ano que vem, quando entrar em vigor o pagamento instantâneo, e tem vantagem sobre o NFC porque o usuário só precisa ter o celular, mesmo que não tenha cartão de crédito", disse.