Por Natalia A. Ramos Miranda
SANTIAGO (Reuters) - Um mês de protestos intensos contra a desigualdade e a repressão policial transformaram as ruas da capital do Chile em um aglomerado de grafites e pichações, cujas mensagens refletem a insatisfação profunda na outrora requintada cidade latino-americana.
O ar quente e seco típico da primavera carrega o odor duradouro do gás lacrimogêneo, e lojas e blocos de escritórios se tornaram fortalezas adornadas com cortinas de metal que os protegem das pedras ou dos coquetéis molotov dos manifestantes.
Os usuários do transporte público passam ao longo de barricadas enegrecidas ainda fumegando em muitas ruas da cidade e se arriscam em cruzamentos movimentados onde os semáforos foram vandalizados.
A rede do metrô, uma das mais modernas da América Latina, continua operando pela metade, já que mais de 20 estações danificadas por incêndios ainda estão fechadas.
Paredes cinzas de arenito vêm sendo cobertas por murais coloridos.
"A rua é nossa", proclama uma mensagem em um portão fechado. Muros exibem gritos de guerra, piadas, exigências políticas, rejeições da injustiça e da desigualdade e clamores contra a polícia "assassina".
O presidente Sebastián Piñera é abordado frequente e diretamente. Uma pichação dizia "Renuncie. Ninguém quer você."
As mensagens também refletem uma característica horrível, e em grande medida única, dos protestos chilenos: os ferimentos causados por balas de borracha ou cilindros de gás lacrimogêneo da polícia nos olhos de mais de 200 pessoas.
"Agora é um privilégio ter os dois olhos", acusa uma. Um pôster mostra o território estreito do Chile escorrendo como um fio de sangue de um olho ferido.
A polícia insiste que vem seguindo o protocolo no uso da força e que todas as alegações de irregularidades que foram relatadas serão investigadas minuciosamente.
Na semana passada, o chefe de polícia suspendeu o uso de balas de borracha e ordenou exames adicionais depois que um estudo de uma universidade indicou que elas só possuem 20% de borracha e que contêm chumbo.
"Prefiro este Chile pintado e desperto do que um oásis passivo e silencioso", disse Miguel Delso, arquiteto de 32 anos que protestava com um grupo de colegas e estudantes de arquitetura.
Já Antonio Rivas, engenheiro venezuelano de 25 anos que migrou para Santiago, tinha outra opinião: "Não entendo por que, para pedir tratamento correto e justo, você tem que sair e destruir tudo."