Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - O governo argentino informou na sexta-feira aos demais países do Mercosul que não irá participar das negociações em andamento para futuros acordos comerciais do bloco, mantendo apenas as que já estão em conclusão com a União Europeia e a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA), disseram autoridades.
O comunicado da Argentina foi feito durante a reunião por videoconferência dos coordenadores nacionais do Mercosul, na tarde de sexta, quando os argentinos informaram os demais países do bloco --Brasil, Uruguai e Paraguai-- que não poderiam mais acompanhar as negociações extrarregionais, disse à Reuters o secretário de Negociações Bilaterais e Regionais nas Américas do Ministério de Relações Exteriores do Brasil, embaixador Pedro Miguel Costa e Silva.
"As negociações com UE e EFTA eles vão concluir com a gente porque já estão fechadas. No caso das demais --Coreia do Sul, Cingapura, Canadá, Líbano, e íamos iniciar outras--, eles abandonam o barco", disse o embaixador. "Não foi uma surpresa. Desde que mudou o governo sabíamos que iam mudar a linha".
O EFTA é formado por Islândia, Liechtenstein, Noruega e Suíça.
A alegação do governo argentino é que a situação interna e externa da sua economia, a situação social do país e o que esperavam que o mundo vá se tornar depois da epidemia de coronavírus o levam a outra opção econômica.
Em um anúncio oficial, a chancelaria do Paraguai --que ocupa a presidência pró-tempore do bloco-- informou que a "Argentina informou que adotou essa determinação em atenção a prioridades de sua política econômica interna, agravada pela pandemia de Covid-19, e indicou que não será obstáculo para que os demais Estados-membros prossigam com os diversos processos negociadores."
O Ministério das Relações Exteriores da Argentina disse separadamente que já havia comunicado preocupações ao bloco sobre acordos de livre comércio com Coreia do Sul, Cingapura, Líbano, Canadá e Índia, entre outros.
"A Argentina deixou claro que a incerteza internacional e o estado de nossa economia sugerem interromper o progresso nessas negociações", disse o ministério das Relações Exteriores da Argentina em comunicado divulgado também na sexta-feira.
A Argentina confirmou que continuará trabalhando com o Mercosul para avançar com acordos com a UE e EFTA.
Segundo o negociador brasileiro, os demais países vão agora informar aos parceiros com que há negociações em curso ou conversas iniciais sobre a decisão argentina e trabalhar os mecanismos que permitam as negociações seguirem sem a Argentina.
"Vamos começar um trabalho para encontrar os mecanismos que vão permitir os outros três continuarem as negociações e a Argentina ficar de fora. Ainda estamos debatendo isso", disse Pedro Miguel. "Não tem risco de judicialização. É uma conversa técnica, precisamos de um tempo para trabalhar. O Mercosul é uma construção de muitos anos, o bloco é muito flexível e criativo. Sempre tem espaço para encontrarmos soluções."
Essa não seria a primeira vez que um dos países do bloco fica de fora da negociação de um acordo comercial. Quando as conversas com a UE foram retomadas em 2012, ainda no governo Dilma Rousseff, a Venezuela --então recém-admitida no bloco-- preferiu ficar de fora por considerar que não teria condições de aderir ao Mercosul e participar de uma negociação deste porte ao mesmo tempo. O país acabou nunca cumprindo os requisitos de adesão e foi suspenso do Mercosul.
(Reportagem adicional de Hernan Nessi, em Buenos Aires)