Por Hugh Bronstein e Marina Lammertyn
BUENOS AIRES (Reuters) - Em um país no qual comer carne é considerado mais um direito do que um luxo, os argentinos estão esticando o orçamento para continuar comprando bifes diante da nova alta no preço dos alimentos em consequência da crise mais recente do peso.
Para ricos e pobres, a vida social gira em torno dos churrascos de final de semana. A imagem do gaucho percorrendo os pampas a cavalo e desfrutando um bife de qualidade junto à fogueira é uma parte tão grande da identidade nacional quanto o tango, Evita Perón e crises financeiras.
O revés econômico mais recente ocorreu no início deste mês, quando uma vitória arrasadora da oposição na votação primária de 11 de agosto provocou uma corrida por dólares e prejudicou a campanha do presidente pró-mercado Mauricio Macri para se reeleger em outubro.
Surpreendidos pela queda do peso, os pecuaristas argentinos --que exportam grande parte de sua produção-- seguraram as vendas e esperaram a volatilidade passar.
O corte na oferta teve como efeito a elevação dos preços. Mas muitos argentinos continuam comprando carne, preferindo apertar o cinto em outras áreas ao invés de se privarem de sua principal fonte de proteína.
"Os argentinos podem parar de comprar roupas e outros itens, mas não deixarão de comprar carne, mesmo quando se queixam dos preços", disse Orlando Mamani, que trabalha cortando carne em um mercado de Belgrano, um bairro de Buenos Aires.
E eles de fato se queixam, ainda que façam fila em açougues da capital.
"Os preços subiram de 15% a 20% desde a primária. O resultado da eleição realmente foi uma surpresa", disse Julio Basmagian, de 70 anos, ao sair de um açougue com pacotes debaixo dos braços.
"A carne para nós é muito importante. É muito incomum um argentino passar um dia sem comer carne de uma forma ou outra".
Mas sendo um aposentado com renda fixa, Basmagian disse que pode ter que reduzir o consumo se os preços continuarem subindo. "Simplesmente não tenho o orçamento", admitiu.
A inflação dos preços ao consumidor deve ser de mais de 3% neste mês, disse Macri na terça-feira --mais do que os 2,2% de julho--, mas os aumentos do preço da carne parecem estar ultrapassando a inflação, segundo consumidores e açougueiros entrevistados pela Reuters.
"Não é que a carne esteja muito cara. É que os assalariados acreditam que está muito cara porque acreditam que têm o direito de comer carne todos os dias", disse Miguel Schiariti, chefe da câmara industrial do setor, CICCRA.
(Reportagem adicional de Miguel Lobianco)
((Tradução Redação Rio de Janeiro; 55 21 2223-7128))
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