Por Philip Pullella
ROMA (Reuters) - Um chileno vítima de abuso sexual por um membro da Igreja Católica e que é testemunha-chave no caso de um bispo acusado de acobertar o acontecimento diz que uma investigação do Vaticano deve ser rigorosa e justa caso a Igreja busque salvar sua reputação sobre o assunto.
Em uma entrevista à Reuters por telefone de sua casa nos Estados Unidos na noite de quinta-feira, Juan Carlos Cruz disse que o papa Francisco “atrasou o relógio anos e anos” com seus comentários recentes colocando em dúvida a credibilidade das vítimas de abusos.
Em 30 de janeiro, o Vaticano informou que o papa havia nomeado o investigador de abusos sexuais mais experiente da Igreja para analisar acusações de que o bispo Juan Barros, da diocese de Osorno, no Chile, havia acobertado crimes contra menores de idade.
A ação foi uma dramática reviravolta para o papa, que oito dias antes disse a repórteres a bordo de seu avião retornando da América Latina que tinha certeza que Barros era inocente e que o Vaticano não havia recebido evidências concretas contra ele.
Cruz disse que ficou “muito tocado e grato” quando o investigador, o arcebispo Charles Scicluna, de Malta, lhe telefonou para organizar um encontro em Nova York na próxima semana, antes de sua viagem ao Chile.
Mas embora tenha percebido que a decisão do papa de enviar Scicluna para investigar é “uma grande coisa” para o Vaticano, ele acrescentou que isto não será suficiente para “colocar um band-aid sobre nosso caso ao trazer um investigador”.
“Nós nunca recebemos nenhum pedido de desculpas do papa. Eu quero uma investigação justa de Scicluna”, disse Cruz.
Quando adolescente, Cruz foi abusado sexualmente pelo reverendo Fernando Karadima, que foi julgado culpado em uma investigação do Vaticano em 2011 por abusar de Cruz e de outros jovens durante muitos anos. Karadima sempre negou as acusações.
O Vaticano lhe ordenou a seguir uma vida de orações e penitências e lhe baniu de ministério público, mas ele evitou acusações criminais porque sob a lei chilena muito tempo havia passado desde as ofensas. Karadima, de 87 anos, ainda mora no Chile.
Cruz diz que Barros testemunhou o abuso cometido por Karadima, que foi mentor de Barros anos atrás em uma paróquia em Santiago. Barros sempre negou isto e disse não ter ciência de qualquer ato irregular de Karadima, que havia lhe treinado para se tornar um padre.
O caso de Karadima tem dominado o Chile há anos e muitos chilenos protestaram contra a decisão do papa de tornar Barros um bispo em 2015. O caso colocou uma grande sombra sobre a viagem do papa ao Chile no mês passado.
“TUDO CALÚNIA”
Durante sua visita, o papa irritadamente disse a um repórter chileno: “O dia que eu vir provas contra o bispo Barros, então eu irei falar. Não há uma única evidência contra ele. É tudo calúnia. Isto está claro?”.
Ele posteriormente se desculpou às vítimas, reconhecendo que sua escolha de palavras e o tom de sua voz “feriram muitos”.
Cruz disse à Reuters que a investigação do Vaticano deve ser encerrada com a demissão de Barros, que muitos paroquianos e políticos exigiram.
(Reportagem adicional de Dave Sherwood, em Santiago, e Scott Malone, em Boston)