Por Nelson Bocanegra
MONTERIA, Colômbia (Reuters) - O presidente Gustavo Petro, primeiro líder de esquerda da Colômbia, prometeu que seu governo adquiriria 3 milhões de hectares de terra para as vítimas do conflito de seis décadas no país, para cumprir os termos de um acordo de paz de 2016 com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).
Isso não tem sido fácil.
Milhares de fazendeiros se reuniram na cidade de Monteria, norte do país, no mês passado, para a entrega de cerca de 8.500 hectares que haviam sido confiscados por paramilitares - autores de desaparecimentos forçados e assassinatos durante o auge do conflito e um dos principais responsáveis pelos deslocamentos forçados.
"Hoje, uma esperança de muitos anos se tornará realidade: ter um pedaço de terra para trabalhar", disse Dalel Bitar, chefe de uma associação de agricultores em Buenavista, a cerca de 80 quilômetros de Monteria.
Bitar afirmou que os membros de sua família, deslocados em 2003, haviam perdido recentemente a esperança de receber indenização. "Foi justiça depois de muitas injustiças".
Mas outros ainda estão esperando.
Depois que Petro foi eleito em 2022, sua meta de redistribuição de terras foi rapidamente reduzida pela metade. O governo enfrentou a presença persistente de gangues criminosas e grupos rebeldes, restrições orçamentárias, burocracia e a relutância de alguns proprietários de terras em vender, dizem autoridades, fazendeiros e acadêmicos.
A redistribuição de terras - uma demanda de longa data de muitos agricultores pobres que apoiaram a eleição de Petro - tem uma urgência especial em meio ao conflito em curso na Colômbia.
O fracasso em melhorar a vida das vítimas pode perpetuar a violência, mantendo-as pobres e vulneráveis a novas violações de direitos ou ao recrutamento forçado por grupos armados, concordam analistas, acadêmicos e autoridades.
Enquanto isso, Petro está com dificuldades para fazer progressos concretos nas negociações intermitentes com grupos armados na Colômbia, onde a violência continua sendo uma dura realidade em determinadas regiões.
A Colômbia está entre os vários países do mundo - incluindo África do Sul, Brasil e México - que estão lutando para cumprir as promessas de redistribuição em massa.
O conflito colombiano foi originalmente desencadeado na década de 1960 por demandas de direitos à terra, com rebeldes marxistas prometendo redistribuir terras e riquezas mantidas em grande parte por um pequeno grupo de famílias da elite.
Um acordo de paz de 2016 entre o Estado e os rebeldes das Farc dá à Colômbia até 2031 para tratar da reforma agrária em duas partes: formalizar a propriedade de cerca de 17,3 milhões de acres, alguns deles ocupados por agricultores pobres que podem ter cultivado a terra por gerações, mas não possuem escrituras; e comprar 7,4 milhões de acres para serem usados como reparação às vítimas do conflito.
Nos dois anos desde que Petro assumiu o cargo, o governo comprou cerca de 1 milhão de acres por cerca de 600 milhões de dólares, um aumento acentuado em relação aos 45.000 acres comprados no governo do presidente anterior, Iván Duque, disse Felipe Harman, diretor da Agência Nacional de Terras (ANT).
As autoridades estão se concentrando primeiro na compra e distribuição de terras não utilizadas e terras expropriadas de criminosos ou entregues por ex-paramilitares de direita que se desmobilizaram em 2006, segundo ele.
O governo de Petro também formalizou a propriedade de 3,2 milhões de acres e pode acrescentar mais 1,2 milhão antes do final do ano, disse Harman.
Uma burocracia complicada dificulta a execução das reparações para as vítimas da Colômbia.
CONFLITO
O governo tem cerca de 1,1 bilhão de dólares para indenizar cerca de 600.000 pessoas antes do final do mandato de Petro, em 2026, o dobro do número de vítimas que receberam indenizações durante o governo de Duque, disse Lilia Solano, chefe da Unidade de Vítimas.
O valor que cada vítima recebe depende de seu caso individual. Cerca de um quinto da população da Colômbia, 9,75 milhões de pessoas, está registrada como vítima de conflito. Oitenta por cento sofreram deslocamento, às vezes combinado com outras violações, como assassinato de um ente querido ou estupro.
"Esperamos que o número não continue crescendo, mas isso depende de não termos um conflito armado", afirmou Solano. "O conflito é uma máquina bem lubrificada para produzir vítimas."
O pagamento de reparações a todas as vítimas do conflito custaria 80,6 bilhões de dólares, disse ela, acrescentando que muitas acabam na pobreza extrema, o que as torna alvos fáceis para o recrutamento forçado.
Mireille Girard, representante da agência de refugiados das Nações Unidas na Colômbia, disse à Reuters que cerca de 580.000 pessoas foram deslocadas recentemente em 2022 e 2023 e que é necessário mais apoio internacional para os esforços de reparação e paz.
Os quatro principais grupos armados ilegais da Colômbia cresceram em 2023 à medida que consolidam o controle territorial financiado pelo tráfico de drogas e extração ilícita de ouro, de acordo com um relatório secreto de segurança visto pela Reuters, enquanto o Comitê Internacional da Cruz Vermelha disse que milhares foram deslocados no ano passado.
"Estamos em um ciclo vicioso em que novos centros de violência podem ser criados", disse Carolina Montes, diretora do departamento de Direito Ambiental da Universidade Externado, em Bogotá.