Divorciada francesa que parou de fazer sexo com marido ganha recurso na Corte Europeia

Publicado 23.01.2025, 11:17
© Reuters. Corte Europeia de Direitos Humanos em Estrasburgo n 26/3/2019   REUTERS/Vincent Kessler

PARIS (Reuters) - Uma mulher que foi considerada culpada pelos tribunais franceses por seu divórcio porque não fazia mais sexo com o marido ganhou um recurso no principal tribunal de direitos humanos da Europa, informou o tribunal nesta quinta-feira, reacendendo um debate na França sobre os direitos das mulheres.

A mulher francesa -- identificada como H.W, nascida em 1955 -- levou seu caso à Corte Europeia de Direitos Humanos (CEDH) em 2021, depois de esgotar as vias legais na França quase uma década após o divórcio.

A CEDH decidiu que os tribunais franceses violaram o direito da mulher ao respeito pela vida privada e familiar.

"No presente caso, a Corte não pôde identificar nenhuma razão capaz de justificar essa interferência das autoridades públicas na área da sexualidade", afirmou em um comunicado.

A decisão da CEDH ocorre em meio a um período de exame de consciência na França após o caso de destaque de Gisele Pelicot, cujo marido foi considerado culpado de drogar a esposa e convidar dezenas de homens para estuprá-la em sua casa. O caso chocou o mundo, reacendeu debates espinhosos sobre os direitos das mulheres na França e transformou Gisele Pelicot em um ícone feminista.

Em uma declaração divulgada por sua advogada, Lilia Mhissen, H.W. comemorou sua vitória jurídica.

"Espero que essa decisão marque um ponto de virada na luta pelos direitos das mulheres na França", disse ela. "Agora é imperativo que a França, assim como outros países europeus, como Portugal ou Espanha, tome medidas concretas para erradicar essa cultura do estupro e promover uma verdadeira cultura de consentimento e respeito mútuo."

GRANDE IMPACTO JURÍDICO

Mhissen afirmou que a decisão da CEDH não tem impacto sobre o divórcio de H.W., que é definitivo. No entanto, ela disse que terá um grande impacto na legislação francesa, impedindo que os juízes franceses tomem decisões semelhantes sobre divórcios no futuro.

"Essa decisão marca a abolição do dever conjugal e da visão arcaica e canônica da família", declarou ela em um comunicado. "Os tribunais finalmente deixarão de interpretar a lei francesa através das lentes do direito canônico e impor às mulheres a obrigação de manter relações sexuais dentro do casamento."

O Ministério da Europa e das Relações Exteriores da França, que representou o governo francês no caso, não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.

A mulher, que se casou com o marido em 1984 e teve quatro filhos com ele, queria o divórcio, mas contestou ser culpada pelo rompimento, argumentando que era uma intromissão injusta em sua vida privada e uma violação de sua integridade física.

Ela citou problemas de saúde e ameaças de violência por parte do marido como motivos para não ter tido relações íntimas a partir de 2004.

© Reuters. Corte Europeia de Direitos Humanos em Estrasburgo 
 26/3/2019   REUTERS/Vincent Kessler

O fato de um dos filhos do casal ser portador de deficiência física e mental aumentou a tensão no casamento.

H.W., que é de Le Chesnay, perto de Paris, disse ter ficado profundamente traumatizada com a decisão, que "legitimou um ambiente familiar em que a privacidade e a dignidade das mulheres são ignoradas e desprezadas".

(Reportagem de Sudip Kar-Gupta, Gabriel Stargardter e Juliette Jabkhiro)

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