SÃO PAULO (Reuters) - Mais celebrado como vilão de "Duro de Matar" e mago na saga "Harry Potter", o ator inglês Alan Rickman tem pouco reconhecimento por aqui por sua dedicada carreira teatral ou mesmo pelo primeiro filme que dirigiu, o incompreendido "Momento de Afeto" (de 1997). Agora, com "Um Pouco de Caos", ele quer mostrar mais de suas qualidades ao público em geral, neste romance de época que co-escreveu, ambientado na França do século XVII.
Personificando ele próprio o Rei Sol Luís XIV, em um glamour praticamente teatral, o ator e diretor leva o espectador à construção dos jardins do palácio de Versalhes. Na lista de exigências do mais absolutista dos monarcas europeus de qualquer época, seus pedidos como "que o céu seja aqui" e "paraíso" atravessam como gelo a espinha do paisagista André Le Notre (Matthias Schoenaerts).
A vontade da vez do rei é um salão de baile com fonte de água ao ar livre, que precisa harmonizar com o restante do gigantesco jardim. Quadrado como um escriba (algo curioso para quem na vida real desenhou a Champs-Élysées, por exemplo), Le Notre procura alguém original para ajudá-lo na empreitada. Encontra o tal "toque de caos" na jardineira nada ortodoxa Sra. De Barra (Kate Winslet), viúva e independente em meio ao mundo de homens. Com fantasmas próprios bem guardados em um baú, ela se entrega ao trabalho e aos braços do mestre Le Notre.
Corretíssima do ponto de vista melodramático, a produção se ampara na ambientação (no belíssimo e inglês palácio Blenheim), ressaltada pela fotografia assinada por Ellen Kuras (de "Rebobine, Por Favor"), e no trabalho polivalente de Winslet. Mas, no fim, a história e o próprio filme são apenas digestivos e nada mais do que convencionais.
Os deslizes não são necessariamente a falta de correspondência com a aristocracia francesa (esta que se vê é inglesa até o último chá, incluindo os figurinos reaproveitados da série de TV "The Tudors"), ou o embuste do trabalho de De Barra, que se mostra uma obra de engenharia, mais do que de jardinagem.
O que retira grande parte da força de "Um Pouco de Caos" é a falta de cuidado com os próprios personagens. Como um Le Notre apagado, com uma temerária e unidimensional atuação de Schoenaerts, o caricato irmão bissexual do rei (Stanley Tucci) e uma corte francesa, que afia as unhas para De Barra mas se mostra um grupo, praticamente, de auto-ajuda para senhoras arrasadas por perdas afetivas.
Com o orçamento micro, Rickman fez o que pôde, usando a criatividade habitual de atores de teatro para adequar texto à produção. No entanto, usar sensibilidade moderna em drama de época não funciona nem em teatro conceitual de rua.
(Por Rodrigo Zavala, do Cineweb)
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