SÃO PAULO (Reuters) - Dirigido pelo jornalista premiado Peter Landesman, o drama “Um Homem Entre Gigantes” tenta concretizar-se como um exemplar do cinema-denúncia, recorrendo a uma dramática história real com um herói que é, na verdade, um homem comum – o médico nigeriano Bennet Omalu, interpretado com o carisma e dedicação habituais por Will Smith.
A esta altura, não é segredo para ninguém que Smith – e sua mulher, Jada Pinkett Smith – esperavam para ele uma indicação ao Oscar pelo papel deste médico, cujas pesquisas permitiram associar as mortes precoces e doenças de diversos jogadores de futebol americano com sua prática do violento esporte, com frequentes e violentos choques na cabeça provocando encefalopatia traumática crônica. Uma condição igualmente encontrada em outros esportistas, como boxeadores.
A não-indicação foi uma das razões para o casal encabeçar um boicote à premiação do Oscar, no último domingo, que foi marcada pela discussão em torno da falta de diversidade racial e étnica.
Independentemente desta polêmica externa, o filme é uma oportunidade de ouro para Smith desenvolver sua extraordinária capacidade de criar empatia, figurando num filme genial ou não – neste caso, não. Ele encarna com garra o papel de Omalu, um imigrante estudioso, acumulando diplomas para exercer, com gosto, a função de neuropatologista forense num hospital público de Pittsburgh.
A grande paixão de Omalu é descobrir as causas de mortes misteriosas. Ele não vê seu trabalho maquinalmente, ou seus “pacientes” como meros corpos – tanto que descobre seus nomes e tem o curioso costume de “conversar” com cada um deles, pesquisando exaustivamente os detalhes por trás de seu falecimento.
Hábitos desse tipo rendem problemas de convivência a Omalu, inclusive no próprio trabalho, onde seu chefe, Cyril Wecht (Albert Brooks), é seu único aliado. Omalu não tem realmente amigos, muito menos namorada, dia e noite dedicado ao trabalho.
O episódio que vira sua vida do avesso é a morte de um famoso jogador de futebol, Mike Webster (David Morse). Ele foi um grande campeão de um time local, os Pittsburgh Steelers, mas nos últimos anos tornou-se um marginal. Com misteriosos problemas de saúde, seu comportamento tornou-se instável, eventualmente violento. Ele separou-se da família, consumiu todo dinheiro que tinha, afundando em consumo de substâncias tóxicas.
A morte precoce deste atleta, de apenas 50 anos, intriga Omalu. A partir da pesquisa de seus tecidos cerebrais, ele prepara para sua grande descoberta, associando a violência do esporte com os males que vitimam não só Webster, como outros esportistas.
Trafegando bem pelo jargão médico, sem torná-lo obscuro, nem excessivo, o filme procura delinear o perfil de um herói abnegado, que não aspira nem fama, nem fortuna, apenas conhecimento que melhore a vida de outros. Para isso, ele conta com o chefe, Cyril, e recebe um inesperado apoio de um ex-médico do clube dos Steelers, Julian Bailes (Alec Baldwin).
Mais adiante, consegue ampliar sua pesquisa, quando tem acesso aos corpos de outros jogadores mortos, que apresentaram sintomas semelhantes ao de Webster. Sua iniciativa, porém, encontra uma firme oposição da Liga Nacional de Futebol, que tenta desacreditá-lo, temendo ver prejuízo nos seus milionários negócios.
Apesar da entrega de Smith e da competência de Brooks e Baldwin, o filme tem no roteiro alguns aspectos problemáticos. Um deles é a fragilidade da personagem de Prema (Gugu Mbatha-Raw), mulher de Omalu, que poderia dar mais peso ao lado pessoal do protagonista. Outro é uma ênfase um tanto descabida num discurso patrioteiro de Omalu sobre a “grandeza da América”.
Se fosse um pouco menos maniqueísta, o filme certamente poderia alcançar uma transcendência maior, mesmo em termos da denúncia que carrega, e da importância inegável do personagem que o inspirou.
(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)
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