Por Lisandra Paraguassu e Elizabeth Pineau e Andreas Rinke
RIO DE JANEIRO (Reuters) - Delegados europeus na cúpula do G20 no Brasil ficaram insatisfeitos com a decisão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de encerrar as discussões e emitir a declaração final do grupo um dia antes, em uma tentativa de evitar debates delicados sobre a guerra na Ucrânia, disseram fontes.
O chanceler alemão, Olaf Scholz, lamentou nesta terça-feira que o comunicado do G20 não tenha destacado a responsabilidade da Rússia pelo início da guerra na Ucrânia, especialmente no milésimo dia de sua invasão em larga escala.
"É muito pouco quando o G20 não consegue encontrar palavras para deixar claro que a Rússia é responsável", disse Scholz no encerramento da cúpula de dois dias do grupo das maiores economias do mundo, realizada no Rio de Janeiro.
A redação sobre a Ucrânia tem sido um ponto sensível nas reuniões do G20 desde o início da guerra, já que a Rússia e seus aliados estão à mesa. O presidente russo, Vladimir Putin, não participou da cúpula no Rio, mas foi representado pelo ministro das Relações Exteriores, Sergey Lavrov.
O comunicado geralmente é emitido ao final da cúpula, mas Lula decidiu aprovar o texto enquanto encerrava a sessão plenária de segunda-feira, em um momento em que os líderes de França, Alemanha e Estados Unidos não estavam presentes na sala, segundo diplomatas.
"O comunicado foi fechado pelo presidente Lula. Ficou aquém da posição que poderíamos ter tido", afirmou o presidente francês, Emmanuel Macron, a repórteres na noite de segunda-feira, acrescentando que o texto teria se beneficiado de uma abordagem mais explícita sobre a guerra.
"Isso não muda nada a posição da França: é uma guerra de agressão iniciada pela Rússia contra a Ucrânia e nossa prioridade hoje é obter uma paz duradoura", completou Macron.
Uma autoridade europeia classificou a manobra de Lula como "brutal", mas seu país decidiu respeitar a prerrogativa do anfitrião da cúpula de determinar quando emitir a declaração conjunta.
O Brasil apressou a aprovação do comunicado na noite de segunda-feira para evitar o risco de a cúpula terminar sem uma declaração final, embora os europeus pedissem uma linguagem mais firme sobre o papel da Rússia na guerra, disseram à Reuters três diplomatas brasileiros presentes nas negociações.
O Ministério das Relações Exteriores do Brasil não respondeu imediatamente a um pedido de comentário.
Os sherpas (negociadores) tinham chegado a um acordo sobre a declaração final no início da manhã de domingo, após intensas negociações, mas naquela tarde França e Alemanha começaram a pressionar o Brasil para reabrir o texto devido a ataques aéreos russos significativos na Ucrânia. O Brasil se recusou.
Diplomatas franceses poderiam ter pedido na segunda-feira para adiar a aprovação do texto até que Macron estivesse na sala, mas não o fizeram, para alívio dos brasileiros.
"Reabrir o texto teria colocado em risco todo o esforço de uma semana de negociações", disse uma autoridade brasileira à Reuters.
Scholz viu a discordância sobre o texto do G20 como um sinal dos tempos em um mundo em transformação.
"Está ficando claro o quanto as tensões geopolíticas também estão tendo um impacto sobre o G20", disse ele. "O vento que sopra nas relações internacionais está ficando mais forte."
(Reportagem de Lisandra Paraguasu, Elizabeth Pineau e Andreas Rinke no Rio de Janeiro)