Contraditoriamente às perspectivas propagadas pouco favoráveis para o Brasil, o real, nossa moeda, mostra performance de fortalecimento frente ao dólar americano sustentando um rali que já dura quase uma semana.
Ontem, manteve esta trajetória de apreciação e confrontou com o viés de depreciação de todas demais moedas emergentes frente a moeda americana, e afora a discreta distensão política em torno da reunião ministerial do dia 22, novos fatos desalentadores na área política se sucedem e na questão saúde e economia não há sinais alvissareiros, muito pelo contrário se revelam mais preocupantes.
O país assumiu a liderança mundial como epicentro da pandemia e isto afasta a possibilidade da retomada da atividade econômica imediata dada a necessidade de continuidade do isolamento nas principais cidades do país, e ao mesmo tempo fica evidente as limitações dos governos em suprir as demandas da população com programas de suporte durante a crise muito além do que já foi feito.
O fluxo de recursos externos revela em seus números a expressiva queda de atratividade do país aos investidores estrangeiros. No mês passado, abril, os IED – investimentos diretos estrangeiros caíram para US$ 234,0 milhões enquanto no mesmo mês de 2019 registrava US$ 5,1 Bilhões, sendo o menor nível desde 1995. A previsão, já pessimista, do BC era de US$ 1,5 bilhão.
Os números das contas externas do mês de abril, divulgadas pelo BC na 3ª feira, reproduzidos pelo jornal Valor, evidenciam que os investimentos em portfólio que se mostraram resistentes em crises anteriores tiveram saída de US$ 8,0 Bi, um mês depois de quebrar o recorde de US$ 22,0 Bi.
Os investidores estrangeiros já retiraram algo em torno de US$ 15,0 Bi da bolsa de valores este ano e o ambiente deve persistir adverso para o Brasil.
O Brasil tem inúmeras oportunidades que poderiam despertar atratividade, como outrora, aos investidores estrangeiros, listadas no programa de privatizações e isto é posto por muitos como o “caminho” para saída da crise, mas não estão considerando que as perturbações políticas, interferências demasiadas entre os poderes, ambiente conflituoso permanente, insegurança jurídica e as perspectivas de que a crise possa determinar que o país à saída da crise esteja soberbamente endividado, com uma relação Dívida Líquida/PIB próxima de 100%, e que o conjunto destes pontos será ponto frustrante às expectativas.
Como o COPOM/BC optou pela alternativa “câmbio alto e juro baixo” que, como expusemos inúmeras vezes nossa compreensão a respeito como estratégia, acabou frustrado no seu objetivo primário pela baixa resposta do investimento externo e mesmo do setor privado brasileiro e se aprofundou na inviabilização com o surgimento da pandemia do coronavírus.
Os investidores estrangeiros não demonstraram atratividade pelo Brasil, e agravou-se ainda mais com a queda do juro que sempre foi o ponto maior de atratividade dos capitais estrangeiros especulativos, forjados em operações de “carry trade”, e motivaram a retirada de recursos que estavam locados em portfólio.
Então, afora as perspectivas para as exportações do agronegócio, não se vislumbra recuperação da atratividade do país aos investidores estrangeiros no médio/longo prazos, o que tende a tornar mais lenta a dinâmica da retomada da atividade econômica, contrariando todos que ainda mantém a memória antiga e não mais presente.
Todo o ambiente quando se focam os investimentos estrangeiros reduz a previsibilidade da trajetória de retorno, até porque se o governo impulsionar o programa de privatizações, sem perder de vista as reformas necessárias e que permanecem “stand by”, haverá a premente necessidade de estabelecer marcos regulatórios consistentes e imunes a judicialização, o que será bastante difícil pelos embates ideológicos e a tendência generalizada do debate conflituoso.
Então, porque num ambiente perspectivo adverso ao fluxo de capitais estrangeiros o dólar evidencia um forte rali de depreciação frente ao real.
Seria consequente do “aviso” emitido pelo BC de que poderia intervir no mercado de câmbio de forma mais contundente ancorado pelas reservas cambiais detidas pelo país? Certamente não, afinal o país de a muito tem reservas cambiais e pode utilizá-las sempre que necessário, a declaração enfática de forma nenhuma se constitui um fato novo.
Poderia ser consequente da aproximação do final do mês quando se apura a Ptax que é a taxa base para ajustes e liquidações de posições em dólares? A Ptax de 30/4 foi R$ 5,4270 e a tendência atual é que se situe com queda de 3%, o que, normalmente, determinaria resistência e volatilidade e não uma apreciação quase passiva do real.
No exterior, Estados Unidos e Europa sinalizam reabertura gradual de suas economias, o que é positivo, mas que deve ocorrer de forma lenta, ao mesmo tempo, que o “embate” Estados Unidos e China deverá ter continuidade e ser considerada de forma relativa, visto que o fato claramente está inserido na campanha eleitoral do Presidente Trump, que mantendo aceso o conflito com ameaças retaliadoras agrada seu eleitorado.
Nesta fase os êxitos externos tendem, até por nossa conveniência, contaminar o ambiente interno no mercado financeiro no Brasil, mas é preciso cuidado e atenção, pois nem sempre há sinergia efetiva entre os movimentos externos e internos.
A rigor, não há clareza sobre os fundamentos, racionalidade, que determinam o rali de apreciação do real, então vamos sinalizá-lo como “estranho”, obscuro.