Liquidação ou Correção de Mercado? Seja como for, aqui está o que fazer em seguidaVejas ações caras

Baixo Crescimento, Ideologia e Teimosia

Publicado 24.01.2013, 14:29
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Em artigo recente[1], o veterano Luiz Carlos Bresser-Pereira buscou defender as políticas econômicas implementadas pelo governo atual. Bresser alega que os supostos críticos estão errados tanto em premissas como em sua interpretação histórica dos fatos.

Bresser ainda alega que as políticas da administração vigente estão corretas em gênero: o erro seria apenas em grau, isto é, as mesmas estariam sendo aplicadas numa dose insuficiente.

Neste artigo, argumentaremos contra Bresser-Pereira utilizando a perspectiva da Escola Austríaca de Economia.

1. As Palavras de Bresser

Na visão de Bresser, seus oponentes alegam que:

“a baixa taxa de investimento (18% do PIB) deve-se à política industrial adotada pelo governo; que os empresários teriam ficado desorientados com as diversas medidas de estímulo fiscal e monetário que o governo vem tomando e teriam se tornado inseguros (...)”

Para ele, tal argumento é inválido, pois:

“isso não é explicação econômica; não implica pensamento, mas repetição da ideologia neoclássica e neoliberal, para a qual toda política industrial é sempre condenável porque distorceria a alocação de recursos. É ideologia equivocada, porque a experiência secular dos países mostra que isso é falso: que política industrial geralmente é um fator de desenvolvimento econômico.”

Para ele, o crescimento econômico atual não é satisfatório por outra razão:

“Não o é porque a taxa de câmbio está longe do equilíbrio (cerca de R$ 2,70 por dólar).”

De fato, segundo Bresser, o alto crescimento no PIB observado no período de 1930-1980 foi fruto de uma:

“política macroeconômica através da qual o governo mantinha a taxa de juros real baixa e a taxa de câmbio no equilíbrio industrial, neutralizando, portanto, a doença holandesa.”

2. Ideologia ou Ciência?

Poderíamos gastar horas argumentando contra cada palavra do artigo, tamanha a quantidade de falácias que o mesmo contém. Tentaremos ir direto aos pontos cruciais.

O leitor mais desavisado pode pensar que tanto a Ciência Econômica como o mundo real (e, consequentemente, a gestão de investimentos) são uma mera questão de ideologia. Sobre como o mundo deveria funcionar, ao invés de raciocinar como ele realmente funciona.

Muito pelo contrário.

Em meu primeiro artigo no Clube de Vienna[2], busquei mostrar como a Escola Austríaca de Economia fornece o melhor background para uma análise econômica. Isto justamente pelo fato da mesma buscar as implicações lógicas de fatos básicos sobre o mundo real ao invés de fazer julgamentos de valor ou fazer suposições irreais para facilitar a criação de modelos.

Por exemplo, fixar forçosamente o preço de uma mercadoria abaixo daquele preço que vigoraria num cenário livre de intervenções sempre cria uma tendência para que haja uma menor produção desse bem, considerando tudo mais constante. Isto é um fato lógico sobre a realidade[3], independentemente de conceitos de justiça.

Bresser parece desconhecer o básico sobre a natureza da análise econômica. Ela é diferente da análise ética. Do ponto de vista Austríaco, tanto a chamada “escola neoclássica” como o keynesiano Bresser-Pereira cometem erros. Mas isto porque suas premissas são irreais em diversos pontos, e não devido ao que os autores acreditam ser justo.

3. Incerteza Regulatória Não Reduz Investimentos[4]?

Coloque-se no lugar de um empresário. Você está investindo recursos escassos em busca de retorno sobre este montante. Qualquer empresário precisa tentar estimar as receitas e os custos de seu empreendimento.

Logicamente, na visão do empresário, quanto maior for a quantidade de variáveis relevantes, e quanto mais incerto for o comportamento ou tendência das mesmas, mais arriscado será o investimento em questão. Disso segue que os investimentos de longo prazo, em geral, sempre tenderão a ser mais arriscados que os de curto prazo.

Aumentar artificialmente a quantidade de varáveis relevantes a um projeto, bem como sua volatilidade e/ou incerteza intrínseca, logicamente terá como efeito aumentar o risco atribuído ao projeto, principalmente aos de longo prazo. Isto resultará numa taxa de retorno exigida mais alta, possivelmente implicando no abandono do projeto.

Nosso raciocínio foi simples, porém baseado em premissas reais. E na prática esse raciocínio encontra fundamentos nos fatos recentes da economia brasileira. Medidas tributárias, cambiais e financeiras vêm freneticamente sendo editadas, promulgadas, alteradas e revogadas com uma intensidade maior após a posse de Dilma Rousseff.

Há sim motivos para crer que muitos investimentos, principalmente os de longo prazo, vêm sendo evitados devido à incerteza regulatória. Mesmo que alguns incentivos gerem desembolsos em algum subsetor específico, a pífia performance da Formação Bruta de Capital Fixo (investimentos) desde 2011 mostra que no agregado a incerteza regulatória é relevante.

Certamente esse fator não explica 100% do fenômeno. Mas apenas no mundo de Bresser-Pereira uma incerteza maior não gera maior risco de mercado. Ou apenas no Brasil de Bresser-Pereira não houve uma avalanche de medidas intervencionistas, discricionárias e de baixa transparência.

4. Doença Holandesa ou Doença Mental?

Bresser-Pereira é um expoente nacional da teoria da “Doença Hoandesa”. Vejamos o que o próprio diz em seu website (negritos nossos)[5] :

“A doença holandesa é uma falha de mercado fundamental que se origina na existência de recursos naturais ou humanos baratos e abundantes que mantêm a taxa de câmbio sobre-apreciada por um tempo indeterminado, e, dessa forma, impedindo a produção de bens comercializáveis usando tecnologia no estado da arte. É um obstáculo ao crescimento do lado da demanda agregada porque limita as oportunidades de investimento.

Sim, leitor! De acordo com palavras desse cidadão, uma suposta abundância é um problema, pois “sobre-aprecia o câmbio” e “limita as oportunidades de investimento”. Num suspiro Orwelliano, o Sr. Bresser-Pereira acredita que riqueza é pobreza.

De fato, apenas em círculos acadêmicos (muitos deles direta ou indiretamente financiados com recursos escassos roubados de terceiros – vulgo impostos), permeados por pessoas que nunca geriram um negócio, tais ideias possuem boa aceitação. Acredito que a esmagadora maioria da população discorda fundamentalmente de Bresser-Pereira, e consideraria uma maior abundância e um maior poder de compra de seu salário uma dádiva.

Argumentando agora em favor desse nosso ponto. Suponha um produtor especializado, digamos, em bananas. Ele possui ótimas terras e expertise no negócio. Caso o valor de suas bananas (e, por tabela, de suas terras e máquinas) no mercado internacional aumente, o mesmo será capaz de comprar cada vez mais outros bens no mercado (o que se traduz em câmbio apreciado). Isto apenas abre uma série de oportunidades.

Se o produtor de bananas optar por consumir mais, ele irá criar oportunidades de lucro para investimentos nas cadeias destes produtos específicos, sem prejuízo ao consumo de outros bens (sem pressões inflacionárias).

Se ele optar por produzir mais bananas, poderá investir em formas de baratear seu custo médio, gerando oportunidades nesta cadeia produtiva específica. Se ele resolver diversificar seu portfolio de investimentos, já possui um poder de compra maior para qualquer outro tipo de investimento.

Não importa a localização geográfica dessas oportunidades. Havendo liberdade de movimentação para recursos (monetários e físicos), é possível se beneficiar do efeito em cadeia gerado pela abundância e pela riqueza. O sistema econômico não é jogo de soma zero.

Nosso ponto foi recentemente ilustrado de forma simples e eficaz pelo economista Alexandre Schwartsman[6]. Um simples gráfico mostra uma forte correlação entre a capacidade de importação de bens de capital e a Formação Bruta de Capital Fixo brasileira recente. Quanto maiores foram os preços dos bens de capital importados, menor foi o volume de investimentos. Quanto menores foram os preços (algo que foi possível com nosso câmbio em apreciação), maior foi o volume de investimentos.

Apenas alguém insano poderia propor que ao se tornar mais rica, uma pessoa se torna menos capaz de realizar um investimento. De fato, o establishment e o mainstream econômico são atualmente uma conversa de loucos travestida de ciência[7].

5. Ficando Mais Técnico: Desvalorizações Artificiais do Câmbio

Até então estivemos sendo bem superficiais em nossa argumentação, de forma a nos fazer entender aos leitores mais leigos. Agora ficaremos mais técnicos.

Uma taxa de câmbio é determinada pelo poder de compra de cada moeda. Uma taxa de equilíbrio num sistema livre de intervenções, tudo mais constante, é aquela que não mais permite operações de arbitragem (comprar algo barato para vender mais caro, lucrando sem risco) nos diversos mercados. Apenas isto.

Bresser alega que a taxa de câmbio para nossa moeda está longe da taxa de equilíbrio (a qual o clarividente alega ser R$/US$ 2,70). Alega ainda que taxas de juro real negativas e desvalorizações cambiais são a receita para superar a “doença holandesa” e acelerar o crescimento econômico.

Falácias.

Em primeiro lugar, caso não houvesse intervenções do BACEN/Tesouro em favor do lobby exportador, o caminho natural seria a apreciação cambial.

Taxação ao capital estrangeiro e incerteza regulatória impedem entrada de capital que apreciaria o câmbio e reduziria naturalmente as taxas de juro e spread bancário. Com taxas de juro zero no mundo inteiro, a taxa brasileira naturalmente tenderia a cair devido à arbitragem.

A isto ainda deve-se somar a bilionária política de acumulação de reservas cambiais, na qual o governo efetivamente paga para desvalorizar o real (imprimindo moeda/gerando inflação de preços e emitindo dívida para “esterilizar” a operação).

Segundo, uma desvalorização cambial artificial nada mais é do que uma transferência de poder de compra dos usuários da moeda desvalorizada (brasileiros usuários do real) para os usuários da moeda valorizada (usuários de moedas estrangeiras). Por quê? Simples, os usuários da moeda valorizada podem comprar mais produtos dos usuários da moeda desvalorizada produzindo a mesma quantidade de bens.

Com a desvalorização, aqueles capazes de produzir e/ou investir na produção de bens desejados pelos usuários da moeda valorizada são de fato capazes de ampliar suas receitas, ao menos no curto prazo.

Isto é o que se vê. Mas o que não se vê?

O que não se vê é que todos os demais usuários da moeda desvalorizada perdem capacidade de comprar bens. Perdem capacidade de comprar outros bens importados com sua renda. Perdem capacidade de realizar outros tipos de investimentos.

Trocando em miúdos, uma desvalorização cambial consiste num imposto. No curto prazo, a produção de certos produtos dentro dessa área geográfica pode até aumentar. Mas de que adianta se ela não será consumida por aqueles que se sacrificaram para produzi-la e vende-la mais barato? Os únicos ganhadores são os usuários da moeda valorizada e os donos das mercadorias exportadas, que aumentam de valor artificialmente.

A desvalorização cambial é uma política de transferência de renda: dos consumidores/importadores (maioria) para os exportadores (minoria) e estrangeiros. E apenas lembremos: o maior empregador no Brasil atual é o setor de serviços (importadores)...

Num primeiro momento é possível desvalorizar a moeda, conceder um desconto aos seus clientes internacionais para reduzir seus estoques, gerar capital de giro e ampliar a produção. É análogo a pegar um empréstimo para ampliar a produção e manter os estoques inalterados.

Porém, no médio e longo prazo, ao não ser capaz de reduzir os custos de produção, ou então inovar e produzir produtos de melhor qualidade a preços acessíveis, será necessário conceder descontos cada vez maiores para se manter no jogo. Trata-se de uma bola de neve. Um jogo com derrota anunciada.

E lembremos. Nesse cenário, para sustentar os exportadores ineficientes, é necessário jogar cada vez mais a população na penúria, ao desvalorizar cada vez mais a moeda e reduzir a oferta de bens disponíveis para a maioria consumidora/importadora. Foi exatamente o que aconteceu no Brasil durante 1930-1980: inflação alta, concentração de renda, maxidesvalorizações cambiais e ao final uma hiperinflação.

No mundo real, um fator crucial para o aumento dos investimentos, especialmente os de longo prazo, é o aumento da poupança (interna ou externa). A poupança externa nos vem sendo favorável, devido às loucuras dos banqueiros centrais ao longo do globo e apesar das políticas cambiais e tributárias do BACEN/Fazenda.

Entretanto, a poupança interna está em mínimas recentes. Mas o que se poderia esperar, se a carga tributária total e a incerteza regulatória apenas aumentam? E se o governo resolve despejar bilhões no Banco do Brasil e na Caixa Econômica Federal para subsidiar o crédito ao consumo?
Poupança
Fonte: IBGE/Clube de Vienna

6. Conclusão: É Necessário Olhar Para O Mundo Real

Virtualmente todos os bancos centrais do mundo estão há cerca de 5 anos procurando seguir as políticas recitadas por Bresser-Pereira, inflando ferozmente a oferta monetária e desvalorizando paridades cambiais (ao menos em relação ao ouro, a moeda “não-politizada”).

O fracasso imediato já foi visto – assim como nos anos 70, temos estagflação generalizada (euro) e desemprego alto (dólar). As consequências de longo prazo de tais políticas não são estranhas aos brasileiros: hiperinflação.

Ainda sim, vale a pena checar alguns dados reais. A seguir temos a taxa de crescimento e de inflação dos três primeiros trimestres de 2012 para alguns países da América Latina. Temos também a variação cambial e a inflação em 2012[8].
Latam
Fonte: Bloomberg; tradingeconomics.com; BACEN e Clube de Vienna

Os resultados são claros. Países com menos incerteza regulatória, políticas mais amigáveis a investimentos externos e câmbio valorizado apresentaram maior crescimento do PIB[9] e menor inflação que seus opostos. O próprio Brasil de 2010, com PIB oficial de 7,5% e valorização cambial de 4,85%[10] serve como exemplo contra o Brasil de 2012.

Os números do PIB brasileiro em 2013 podem até melhorar (e devem) em relação a 2012. Mas isso não significa que a população conseguirá consumir plenamente essa maior produção. E, mais importante, que essa maior produção de hoje não semeará uma forte queda na produção e no consumo de amanhã[11].

[1] Ver: folha.uol.com.br/colunas/luizcarlosbresserpereira/1202385-baixo-crescimento-ideologia-e-pensamento.shtml

[2] Ver: clubedevienna.com.br/frontpage/a-escola-austriaca-de-economia-e-a-gestao-de-investimentos

[3] E há boas evidências de ser exatamente o que vem sendo feito com o preço da energia elétrica atualmente. Apagões poderão vir a ocorrer no futuro, pois há um incentivo para reduzir a produção ao mesmo tempo em que há incentivos para aumentar o consumo.

[4] Trata-se de assunto abordado pelo especialista Austríaco Robert Higgs. Ver: mises.org/daily/6275/Regime-Uncertainty-Some-Clarifications

[5] Ver: bresserpereira.org.br/view.asp?cod=2470

[6] Ver: maovisivel.blogspot.com.br/2013/01/vacina-contra-realidade.html?m=0

[7] Expressão cunhada por Cristiano Chiocca. Ver: mises.org.br/Article.aspx?id=1083

[8] Inflação em 12 meses (dados mais recentes) e crescimento nos últimos 4 trimestres. Variação cambial contra o dólar americano.

[9] A Escola Austríaca e o Clube de Vienna estão cientes das deficiências e irrelevância do indicador PIB quanto mensurador do fluxo de produção de bens e serviços finais. Utilizamos e demos importância a esse indicador apenas para argumentação.

[10] Comparando média do câmbio de compra de janeiro contra dezembro.

[11] Esses assuntos são abordados de forma mais técnica e ampla em nossa série sobre a Teoria Austríaca dos Ciclos Econômicos e a gestão de investimentos. clubedevienna.com.br/frontpage/ciclos-economicos-e-analise-de-mercado-parte-13

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