Publicado originalmente em inglês em 07/05/2021
O retorno do ouro acima do patamar de US$ 1.800 é lógico, esperado e, por incrível que pareça, surpreendente, a julgar pela sua tortuosa jornada ao longo deste ano.
Mas, evidentemente, o que realmente importa é sua direção a partir deste momento. Portanto, será que esse rali vai durar?
O ouro vem tendo um comportamento infernal desde agosto do ano passado, quando se afastou das máximas históricas e ficou vagando por meses antes de despencar de forma sistêmica com o anúncio de vacinas eficazes contra a Covid-19.
Exceto por quem está comprado, a convicção tem sido uma commodity rara no ativo, que há seis meses testa a paciência dos investidores.
Por isso, diante da sua retomada do nível de US$1.800 na quinta-feira, após 10 semanas de invectivas, múltiplas demandas de preço para ouro foram definidas pelos analistas, indispostos a concordar com a sustentação do seu rompimento sem atingir tais níveis.
Phillip Streible, estrategista-chefe da Blueline Futures, em Chicago, disse ao Investing.com na quinta-feira:
“Não estou convencido ainda de que ficaremos nesse nível com o ouro. Preciso ver alguns fechamentos diários acima de US$ 1.800 para me convencer de que podemos buscar a região de US$ 1.900 e desafiar as máximas de US$ 2.000 de agosto”.
“Se você busca uma proteção contra a inflação, existem diversas outras commodities capazes de oferecer isso, desde o cobre até produtos agrícolas, como soja.”
Inflação: Dolorosa referência até agora para investidores do ouro
A referência à inflação é dolorosa para quem optou pelo ouro nos últimos meses, na esperança de que o metal se comportasse como a melhor reserva de valor e proteção em momentos de turbulência financeira e política.
O fato é que o ouro está incrivelmente atrasado na festa da inflação, mesmo com commodities como petróleo, madeira serrada e inclusive o café disparando por causa de gargalos na oferta e aumento de demanda com a reabertura econômica após meses de lockdowns da Covid.
Ole Hansen, diretor de estratégias em commodities do Saxo Bank, afirmou que o rompimento de US$ 180 foi um passo importante para o ouro, mas o metal ainda precisava fazer muito mais.
“Mas os stops de quem está vendido no longo prazo ainda precisam ser desafiados, portanto agora é que se inicia o trabalho duro de permanecer em alta”, declarou Hansen em um tuíte. Segundo ele, depois de superar US$ 1.818 na quinta-feira, o metal precisa agora retomar US$ 1.851.
Gráficos: cortesia de SK Dixit Charting
O analista técnico Sunil Kumar Dixit disse que o ouro estabeleceu uma forte contratendência após semanas de negociações moribundas, mas complementou dizendo que o movimento pode se desenvolver para ambos os lados.
"Para o atual rali continuar, o ouro precisa se firmar acima de US$ 1.812. Um movimento abaixo disso deve iniciar uma correção até a MME de 5 dias a US$ 1805, podendo se estender até 1798, 1785 e 1770.”
Apesar do acionamento de um ponto de inflexão no ouro, Dixit afirmou que o Índice de Força Relativa era positivo, dando suporte a movimentos de alta.
“Claramente se formou um fundo duplo em 1676 e 1677, antes do rompimento superior da resistência horizontal a 1755. Agora, com alvos a 1830 na retração de 38,2% de Fibonacci a partir das mínimas anteriores, existe a chance de uma extensão até a MMS de 200 dias a 1850.”
Ouro não atrai muito entusiasmo
Mas algumas das observações sobre o ouro após a disparada de quinta-feira foram bastante baixistas.
Horas após o rompimento de US$ 1800, os analistas do HSBC rebaixaram sua recomendação no metal para “neutra”, dizendo que não esperam uma valorização maior nos próximos três a seis meses.
O HSBC observou que o rendimento dos títulos de 10 anos do Tesouro americano havia se estabilizado em torno de 1,6% após atingir as máximas recentes a 1,75% no fim de março, sinalizando que pode haver um arrefecimento das preocupações com a inflação por enquanto.
Sobre a inflação em si, eles disseram que ela era:
- “Transitória” (concordando com o presidente do Fed, Jay Powell)
- Subindo diante da grande expectativa, mas parece ter atingido o topo.
- Tênue com bancos centrais ainda comprometidos em manter a política de afrouxamento monetário.
Em conclusão, eles disseram sobre o ouro:
“No curto prazo, rebaixamos o ouro para neutro, pois não esperamos uma valorização significativa nos próximos 3-6 meses, principalmente com os rendimentos dos treasuries ainda elevados”.
A IG Client Sentiment, enquanto isso, recomendou venda no ouro, dizendo que 81,24% dos investidores estavam comprados no mercado.
“Geralmente assumimos uma posição contrária ao sentimento da multidão, e o fato de os investidores estarem comprados sugere que os preços do ouro podem continuar caindo”, declarou. “As posições líquidas compradas são maiores do que ontem, mas menores do que na semana passada. A combinação do atual sentimento e das recentes mudanças nos faz adotar um viés misto para o ouro.”
Apesar desse pessimismo, o ouro estava se saindo muito bem no momento em que escrevo e demonstrava disposição para estender os ganhos de quinta-feira.
Durante a janela asiática de negociação, o ouro futuro da Comex de Nova York girava em torno de US$1.820, após registrar pico um pouco acima de US$ 1.822. Desde o fechamento de quarta-feira, o contrato se valorizou cerca de US$ 35, ou 2%.
O preço à vista do ouro estava praticamente idêntico ao futuro. Os investidores costumam decidir a direção do ouro observando o preço à vista, que reflete o lingote à pronta entrega.
Dados de emprego nos EUA é o verdadeiro teste para o ouro
É preciso ressaltar o seguinte: todos concordam que o teste decisivo para o ouro serão os dados do mercado de trabalho referentes a abril, nesta sexta-feira. Os números de emprego estão melhorando rapidamente nos Estados Unidos nos últimos três meses e a expectativa é que haja a criação de 978.000 vagas em abril, aumentando os ganhos de março de 916.000.
Thomas Westwater, analista do ouro do DailyFX, escreveu:
“O Fed acredita que a alta da inflação será transitória, sua palavra preferida, pois a vem repetindo insistentemente"
“Isso não quer dizer que os dados de emprego não irão mover os preços do ouro."
O ouro registrou uma intensa corrida em meados de 2020, quando disparou das mínimas de março abaixo de US$ 1500 até alcançar a máxima de quase US$ 2100 em agosto, respondendo a preocupações inflacionárias geradas pelo pacote de alívio fiscal dos EUA de US$ 3 trilhões contra a Covid-19.
O desenvolvimento de vacinas eficazes em novembro, além do otimismo econômico, fez com que o ouro fechasse 2020 um pouco abaixo de US$1900. Neste ano, o ouro acabou caindo para US$ 1800 em janeiro e depois colapsou para baixo de US$ 1660 em determinado momento de março.
Essa fraqueza no ouro é surpreendente, se considerarmos a perspectiva de outro grande pacote estímulo contra a Covid-19 aprovado no congresso americano em março e os planos do governo Biden de gastar mais US$ 2,2 trilhões com infraestrutura.
Aviso de isenção: Barani Krishnan utiliza diversas visões além da sua para oferecer aos leitores uma variedade de análises sobre os mercados. A bem da neutralidade, ele apresenta visões e variáveis de mercado contrárias. O analista não possui posições nos ativos e commodities sobre os quais escreve.