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A governança corporativa sempre foi um processo de amadurecimento. Nasceu da necessidade de transparência financeira, evoluiu para compliance e gestão de riscos, e agora chega ao seu estágio mais desafiador: integrar definitivamente as dimensões socioambientais à estratégia das organizações. Em 2027, todas as companhias abertas terão a obrigação de reportar como tratam a sustentabilidade e os impactos das mudanças climáticas em seus negócios. Essa exigência, formalizada nos pronunciamentos CBPS 01 e CBPS 02, equivalentes aos IFRS internacionais, representa um divisor de águas.
Não se trata apenas de mais um relatório. Trata-se de uma mudança estrutural na forma como entendemos “valor empresarial”. Na temática sustentabilidade o administrador deixa de ser apenas um prestador de contas, como vinha sendo tratado, e passa a ser o gestor estratégico. O relato é apenas o fim da linha. Antes dele, há a definição da estratégia, a execução das ações e, finalmente, a comunicação dos resultados. Não existem “duas governanças” — uma financeira e outra socioambiental. Existe uma única governança, que deve integrar todas as dimensões: econômica, contábil, ambiental e social.
A obrigatoriedade do relatório (e da comprovação de que ele tem como base ações verdadeiras) é limitada às empresas de capital aberto. Porém, o impacto disso não se limitará a este nicho, com certeza atingirá o mercado como um todo no que diz respeito à cultura da sustentabilidade. Muitos acreditam que o ESG é um tema restrito às grandes corporações listadas em bolsa. Esse é um equívoco perigoso. Assim como o IFRS tradicional, que começou nas companhias abertas e depois se expandiu para pequenas e médias empresas, o ESG seguirá o mesmo caminho. Em pouco tempo, será exigido também de organizações menores, seja por pressão regulatória, seja por exigência de mercado.
O cidadão já não aceita comprar sem saber a origem do produto, da embalagem, do processo produtivo. O investidor, mesmo de varejo, já questiona práticas socioambientais. E os talentos, cada vez mais conscientes, escolhem trabalhar em empresas que tenham propósito. Pequenas e médias empresas que ignorarem essa realidade perderão competitividade, clientes e profissionais qualificados.
É preciso compreender que ESG não é custo, mas investimento. Uma padaria que decide reduzir o desperdício de alimentos, uma farmácia que cria um conselho com participação de funcionários e clientes, uma startup que adota diversidade como princípio de contratação — todas estão praticando governança e sustentabilidade. O que muda agora é que essas práticas terão de ser registradas, mensuradas e comunicadas.
Nesse cenário, o administrador assume protagonismo. O contador assina os relatórios, o advogado garante a legalidade, mas é o administrador quem planeja, organiza e integra. É ele quem define como a empresa vai lidar com resíduos sólidos, diversidade no ambiente de trabalho, impactos ambientais e sociais. É ele quem garante que a governança não seja apenas discurso, mas prática que sustenta o valor da organização no longo prazo.
O administrador precisa ser diplomata, comunicador, estrategista. Precisa entender que governança não é apenas sobre números, mas sobre alinhar interesses de diferentes públicos: acionistas, clientes, profissionais, comunidade. Precisa transformar propósito em estratégia e sustentabilidade em valor.
Aqui vai uma provocação necessária. Estamos realmente preparados para essa revolução regulatória ou ainda tratamos ESG como marketing? Durante muito tempo, responsabilidade social foi vista como uma forma de melhorar a imagem perante o público. Executivos diziam que era algo sem relevância prática. Hoje, sabemos que ESG aumenta EBITDA, fideliza clientes, atrai talentos e reduz riscos regulatórios. Mas ainda há empresas que usam o tema apenas como peça publicitária, sem prática concreta.
A partir de 2027, não haverá mais espaço para maquiagem verde. Relatórios terão de mostrar dados, métricas, resultados. O mercado financeiro já acordou: investidores institucionais só aplicam recursos em empresas que prestam contas dessas dimensões. O Fórum Econômico Mundial discute o tema há anos. E a sociedade, cada vez mais ativa, exige saber de onde vem o produto, a embalagem, o propósito da organização.
Portanto, a pergunta que precisamos responder é: estamos prontos para transformar ESG em prática estratégica ou continuaremos a tratá-lo como marketing? Se a resposta for a segunda, estaremos condenados a perder valor, credibilidade e relevância.
O futuro da governança é integrar o econômico ao socioambiental. É transformar propósito em estratégia e sustentabilidade em valor. O administrador é peça fundamental nesse processo. Ele precisa abandonar a visão de curto prazo e assumir o papel de maestro, coordenando talentos, energizando organizações e garantindo que o amor pelo que se faz esteja presente no ambiente de trabalho.
Em 2027, a obrigação regulatória será apenas o início. O verdadeiro desafio é cultural: deixar de ver ESG como discurso e assumir que sustentabilidade é, de fato, o caminho para a longevidade das organizações.
