Aforismos
Deixe-me começar recuperando frases recentes. Todas elas proferidas em novembro, já confirmada a re-eleição, de tal sorte que não podem ser associadas a um mero discurso eleitoreiro:
“Eu não acho que você consegue recuperar uma economia sem ter uma política com foco na demanda. Você não pode achar que com restrição da demanda você recupera.” - Dilma Rousseff.
“A nossa estratégia não é ortodoxa. É uma estratégia desenvolvimentista.” - Guido Mantega.
“Governo optou por não fazer ajuste ortodoxo.” Aloizio Mercadante.
Pergunta corolário: qual a chance, de fato, de abandonarmos, para além de meras migalhas, a nova matriz econômica?
Sim, a coisa vai ficar feia.
Atribui-se a Einstein a frase de que burrice é fazer a mesma coisa e esperar um resultado diferente. Não sei se foi ele mesmo que falou. Mas que faz sentido, isso faz.
Inflação e déficit em conta corrente: aí vamos nós
Apenas uma suposição, num país hipotético qualquer: o que aconteceria se, diante de um problema de oferta (produtividade estagnada e escassez de oferta de trabalho), a política econômica continuasse a estimular a demanda?
Trinta segundos para pensar...
(...)
Voltando!
R: Mais inflação e aumento do déficit em conta corrente. Bingo!
Essa é uma obra de ficção e qualquer semelhança com a realidade é mera coincidência.
O crescimento continuará medíocre, a taxa de câmbio pressionada e a inflação pode descontrolar-se.
O ajuste fiscal combatendo o óbvio
Haverá ajuste fiscal? Do ponto de vista da retórica oficial, sim. Combateremos as fraudes no seguro-desemprego e, numa hipótese otimista, tentaremos estabelecer algum rigor nos critérios para pensão por morte e abono salarial.
Obviamente, isso não será suficiente. Emprestando o argumento do grande Mansueto Almeida, uma queda de 50% no seguro-desemprego e no abono salarial - o que já nos parece uma premissa para além de otimista - representaria uma economia de 0,45 ponto do PIB.
Para quem precisa de 2,5 pontos, é bem pouco.
A situação é muito mais complicada do que supõe a base governista para adequar as contas públicas em prol da estabilização das dívidas bruta e líquida.
“Ah, mas pontualmente podemos tirar subsídios de determinados setores?”
Isso também é um problema muito maior do que admitem as almas ingênuas, e devidamente documentado pela literatura econômica.
Quando você concede um subsídio a determinado setor, a tentativa de tirá-lo implica relutância imediata do beneficiado. Em paralelo, o restante da sociedade, que não sente tão diretamente os impactos do subsídios, não vai insurgir em favor do retirada do incentivo. Há uma assimetria de forças.
Uma vez montada a rede de subsídios discricionários, desmontá-la exige coragem de enfrentar interesses privados e sustentação política muito forte - faltam-nos ambos.
Qual o tamanho do problema?
A situação da economia, há vários meses, enseja prognóstico ruim para ativos de risco brasileiros. Mas temos algo novo: o tal Petrolão.
Esse negócio acende sinais vermelhos em três frentes:
i) fluxo para ações brasileiras, ou alguém imaginaria fundos estrangeiros comprando estatais, sob risco de republicação de balanços e, no limite, interrupção de negociação dos ADRs?;
ii) restrições operacionais para Petrobras, dada a paralisia interna e até mesmo a chance de interrupção das obras com empreiteiras, impondo adversidades adicionais ao ramp up da produção; e desdobramentos eventuais até mesmo para a política fiscal e para aplicações em renda fixa.
Explico o ponto iii). Quero focar nele pois minha maior preocupação no momento é com o potencial de espraiamento.
Falando da forma mais simples e direta possível: Petrobras tem muita dívida, queima caixa e precisa tocar um ambicioso plano de investimentos. Como vai fazer isso?
Ora, difícil imaginar que o mercado de dívida estará aberto à companhia em meio aos escândalos atuais e também à alta alavancagem.
Qual o maior risco? Um aumento de capital em 2015, com garantia do maior acionista.
Pressão adicional sobre a política fiscal, com o Governo tendo de injetar grana na empresa.
Risco ainda não contemplado pelas cotações, nem pelas agências de classificação de risco.
E lá se vai o investment grade...
Relógio quebrado
Até um relógio quebrado dá a hora certa duas vezes ao dia. Depois de tanto apanhar, os mercados brasileiros esboçam uma recuperação hoje. Não vejo consistência no comportamento.
Entendo que, aos poucos, mercado dará continuidade à atribuição de maior prêmio de risco para se estar em Brasil. Ainda vejo um dólar barato, ações caras, muito risco no pré e na ponta longa da curva de juro.
Meu combo para o momento: dólar, NTN-B curta e short nas estatais. Durmo tranquilo.