O mercado futuro de açúcar em NY encerrou a sessão de sexta-feira com uma vigorosa alta nas cotações provocada pelas informações divulgadas pela UNICA acerca dos danos causados pelas geadas ocorridas nesta semana atingindo particularmente os estados de São Paulo e Goiás, que devem reduzir a expectativa de produção para as próximas safras.
A planta, já convalescente pelo déficit hídrico, agora sofre pelas baixas temperaturas. No entanto, agrônomos mais cuidadosos preferem aguardar alguns dias para ter uma opinião mais qualificada sobre os reais impactos da geada. Por outro lado, a cana atingida precisa ser colhida imediatamente para não perder qualidade, dizem os entendidos.
O contrato futuro com vencimento para outubro/21 em NY encerrou a 18.10 centavos de dólar por libra-peso, 39 pontos acima da semana anterior, ou 8.60 dólares por tonelada. Os demais vencimentos que se estendem até maio/24 encerraram com variações positivas entre 1.00 e 8.00 dólares por tonelada. Como o real se enfraqueceu diante do dólar, a média das cotações da safra 22/23 e 23/24 convertidas pelo câmbio mais o cupom, apresentaram um acréscimo de R$ 69 e R$ 53 por tonelada, respectivamente em relação à semana anterior.
Se ratificada a previsão de quebra na safra, a curva de preços do açúcar negociado em NY para as safras vindouras, isto é, a 22/23 e a 23/24 vai se elevar, potencializando o cenário que temos discutido aqui e que envolve, para lembrar nossos fiéis leitores, a recuperação da economia mundial pós-pandemia, a política energética na Índia dando ênfase à produção de etanol, o aumento do consumo de açúcar per capita nos principais países consumidores e a retomada do consumo interno de combustíveis cuja previsão está em 7%, apenas para citar alguns pontos.
Na nossa visão de médio e longo prazos, o mercado futuro de açúcar tem espaço para subir 150 pontos nos vencimentos compreendidos entre maio/22 até março/23 e 200-250 pontos para os vencimentos entre maio/23 até março/24, quando estes estiverem listados como primeiros meses de negociação. Resta saber se os preços em reais por tonelada permanecerão tão bons como agora, pois a moeda brasileira está bem desvalorizada em relação ao dólar e, considerando que o Banco Central do Brasil deve aumentar juros ao longo deste ano, é possível que ocorra uma sólida entrada de capital estrangeiro empurrando o real para patamares mais em linha com a curva de longo prazo acrescida da inflação (que hoje seria de aproximadamente R$ 4,7000). O argumento contra essa valorização do real é o quadro político conturbado que nos aguarda para o período eleitoral no Brasil no ano que vem. Aí reside nosso maior risco e o ingrediente que pode derrubar as cotações do açúcar.
É bom que se diga que, apesar de um cenário melhor adiante em dólares por tonelada, os preços atuais são muito atrativos e remuneradores e dentro da filosofia que “ninguém quebra com lucro no bolso”, a recomendação é de fixar preços em reais por tonelada e comprar uma call (opção de compra) out-of-the-money (opções fora-do-dinheiro) para 100% das fixações efetuadas.
De qualquer forma, as previsões de moagem de cana no Centro-Sul apresentam larga oscilação. Tem gente que aposta em 510 milhões de toneladas de cana, com um olho no próprio livro, e outros que já trabalham com uma redução para 540-550 milhões de toneladas.
Se o Centro-Sul moer 540 milhões de toneladas de cana, muito provavelmente a produção de etanol anidro estará equacionada e uma possível interrupção no fornecimento estará descartada. O problema reside se a produção de cana for bem abaixo disso. Uma eventual falta de anidro vai dar munição para que o governo proceda com a redução na mistura, que hoje é de 27%, para um percentual que equilibre a oferta do produto, trazendo enorme risco de imagem para o setor.
Como esse governo atira pra todos os lados e aponta dedos para culpar os outros, assim como “culpou” a Petrobras (SA:PETR4) pelos aumentos da gasolina, ou os governadores pelo alto preço dos combustíveis devido à alíquota do ICMS, é fato que uma redução temporária da mistura, seja ela de qual percentual for, pode ser tratada como definitiva implicando numa perda de receita importante para a indústria.
O ideal para evitar uma possível crise é se antecipar a ela, oferecendo soluções. Os agrônomos e diretores agrícolas das usinas precisam apontar seus lápis e chegar num número de produção consensual que possibilite às entidades ligadas ao setor apresentar um número ao governo e buscar alternativas para se evitar aquilo que seria um desastroso desabastecimento.
Um executivo do mercado sugere que os principais líderes produtores do setor (que representam quase 300 milhões de toneladas de produção) se reúnam e criem uma força-tarefa para produzir uma quantidade adicional de anidro evitando o risco de eventual indisponibilidade do produto. Se é para agir, que ajam rapidamente.
Uma eventual redução na disponibilidade de hidratado é resolvida via preço, já que o consumidor vai optar abastecer seu carro nos postos com o combustível que lhe for mais barato por quilômetro rodado. O anidro é um aditivo, portanto a falta dele provoca ruptura na estrutura de fornecimento e de formação de preço da gasolina. O dano ao setor é direto na veia.
Mas, e se tudo der errado? Se a produção de cana for abaixo de 540 milhões de toneladas e o setor não conseguir produzir anidro para atender a demanda? Sobram algumas alternativas, todas danosas: a importação onerosa de etanol de milho e/ou de gasolina e a redução da mistura.
Enquanto isso, os fundos aumentaram suas posições compradas (com base na terça-feira passada) para 198,000 lotes, número que deve ter aumentado ao longo desta semana. No curto prazo, recomenda-se cautela com o que pode ocorrer com os preços em NY se os fundos começarem a liquidar realizando lucros. Vejam o que ocorreu com o mercado de café esta semana. Explodiu devido à falta de pagamento dos ajustes diários e liquidação compulsória de – segundo dizem – operações (mal) estruturadas. Foi sangrento.
Como disse um amigo leitor, “o mercado de açúcar dá a impressão que ainda guarda apetite para subir, mas a volatilidade implícita aponta para a velha máxima, que o baile continua, mas com todos dançando cada vez mais perto da porta de saída”. Genial.