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Gilmar Mendes suspende "presunção de boa fé" de compradores do ouro

Publicado 05.04.2023, 08:18
Atualizado 05.04.2023, 09:10
© Reuters. Ministro do STF Gilmar Mendes durante evento em Lisboa
03/02/2023 REUTERS/Rodrigo Antunes
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Por Ricardo Brito e Lisandra Paraguassu

BRASÍLIA (Reuters) - O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), suspendeu a aplicação legal que desde 2013 instituiu a chamada "presunção de boa fé" dos compradores do ouro, iniciativa que facilitou a ampliação do garimpo ilegal no país e está no cerne da crise humanitária no território Yanomami.

Na decisão, Mendes deu prazo de 90 dias para que o governo federal adote um novo marco regulatório para a fiscalização do comércio do ouro no país. Cobrou que sejam tomadas medidas para que se inviabilize a aquisição desse minério extraído de "áreas de proteção ambiental e de Terras Indígenas".

A liminar de Mendes, que tem validade imediata, será levada a julgamento pelo plenário virtual do STF para ser confirmada ou derrubada.

A decisão do ministro do Supremo acontece num momento em que o governo Lula vinha preparando uma nova legislação tanto para derrubar a "presunção de boa fé" para o comércio do ouro como para estabelecer regras mais rígidas para as transações, mostrou reportagem publicada pela Reuters em fevereiro.

Nesta quarta-feira, o ministro da Justiça, Flávio Dino, disse à Reuters que o texto para o novo marco legal proposto pelo governo está em análise na pasta, onde estão sendo feitos últimos ajustes de redação, e deve ser enviado à Presidência semana que vem.

Dino disse que ainda não há decisão sobre qual instrumento jurídico será usado para fazer a mudança. Se for uma medida provisória, por exemplo, dependerá de ratificação pelo Congresso. Segundo o ministro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva será consultado a respeito.

A liminar de Gilmar Mendes ocorre também dias depois de a Receita Federal instituir a utilização de nota fiscal eletrônica para o ouro quando classificado como ativo financeiro ou instrumento cambial, a partir de julho, outra medida que já estava no radar desde a crise dos Yanomami.

FIM DA "DECLARAÇÃO DE BOA FÉ"

Com a decisão do Supremo, deixa de valer regra que previa que os compradores de ouro podiam aceitar a palavra do vendedor sobre a origem legal do metal sem o risco de serem responsabilizados no caso da descoberta, depois da venda, que o ouro vinha de um garimpo ilegal.

"É preciso que esse consórcio espúrio, formado entre garimpo ilegal e organizações criminosas, seja o quanto antes paralisado. O provimento de medida cautelar, pelo Supremo Tribunal Federal, é o meio adequado e necessário para tanto", considerou o magistrado.

A decisão de Mendes também foi comemorada pelo ministro da Justiça, Flávio Dino, em uma publicação no Twitter.

"Importante decisão que previne crimes contra o meio ambiente, as terras indígenas e o próprio mercado", escreveu Dino na rede social.

Na avaliação de Larissa Rodrigues, gerente de Portfólio do Instituto Escolhas, ONG que investiga o comércio de ouro ilegal, o fim da presunção de boa fé ajudará a moralizar o comércio de ouro.

"Acabar com a boa fé é o mais fundamental para moralizar o comércio de ouro dos garimpos. Não é aceitável, não é cabível, que tenhamos um comércio bilionário com base na boa fé dos envolvidos. Diante de tantas denúncias de crimes era impossível e imoral que esse sistema continuasse operando no país", avaliou.

No governo, a minuta inicial do texto que estava sendo preparada a qual a Reuters teve acesso, previa, além do documento eletrônico com diversos dados do comprador e do vendedor, a ideia de exigir dados que dêem precisão ao local de mineração do metal.

Entre outras iniciativas em discussão, as exigências deviam incluir a área de lavra, local de origem do ouro, o número do processo administrativo no órgão gestor de recursos minerais, o número do título de autorização de extração, o número da licença ambiental e o respectivo órgão emissor, bem como a massa de ouro objeto da transação.

A Polícia Federal foi um dos órgãos que tinha feito sugestões ao governo federal de modificação dessas regras. Em entrevista à Reuters no mês passado, o diretor de Meio Ambiente e Amazônia da PF, Humberto Freire, defendeu mudanças na regra.

© Reuters. Ministro do STF Gilmar Mendes durante evento em Lisboa
03/02/2023 REUTERS/Rodrigo Antunes

"A gente precisa ter realmente uma estrutura que não seja baseada na boa fé, tem que ser na comprovação da origem ilícita desse minério e uma estrutura de rastreio legal através dos documentos fiscais bastante robusta", disse Freire.

Em 2021, o Brasil registrou 52,8 toneladas de ouro com graves indícios de ilegalidade, o que equivale a 54% da produção nacional, segundo o Instituto Escolhas.

Já o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), que representa mineradoras de ouro como AngloGold Ashanti e Yamana Gold, além de gigantes como Vale (BVMF:VALE3), Rio Tinto (LON:RIO) e BHP, afirmou que 20% do ouro brasileiro não teve origem declarada naquele ano, conforme dados da Agência Nacional de Mineração.

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