Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - A estatal Petrobras (SA:PETR4) elevará em 0,74 por cento a gasolina em suas refinarias a partir da quinta-feira, na primeira alta desde o agravamento de uma greve de caminhoneiros contra as cotações do diesel que levou a um desabastecimento de combustíveis generalizado no Brasil e afetou diveros setores nos últimos dias.
Se na última vez em que a Petrobras subiu a gasolina, em 22 de maio, as paralisações apenas começavam e não tinham impactos aparentes, o anúncio nesta quarta-feira vem após dias de caos e em meio a uma recém-iniciada paralisação de petroleiros na qual a categoria pede a saída do presidente da empresa, Pedro Parente, e redução nos preços dos combustíveis.
O reajuste também acontece após o presidente Michel Temer afirmar na véspera que a política de precificação da estatal poderia ser reexaminada, "mas com muito cuidado".
A declaração de Temer derrubou em mais de 5 por cento as ações da estatal no início do pregão nesta quinta-feira, antes do Palácio do Planalto enviar nota à imprensa na qual destaca que irá "preservar" as práticas da companhia.
"Esse aumento hoje é normal, está dentro da política anterior", afirmou o professor do Instituto de Energia e Ambiente da Universidade de São Paulo (USP), Edmilson Moutinho.
O petróleo Brent registra ganhos de quase 3 por cento nesta quarta-feira, após leve alta na véspera-- a cotação internacional é um fator-chave para a definição dos preços da Petrobras.
Ele ponderou, no entanto, que a Petrobras precisa ter cuidado extremo com a comunicação neste momento para não passar uma impressão de que altas na gasolina poderiam compensar o anunciado congelamento do diesel.
"Estamos bem na brasa, era bom não jogar muito combustível em cima disso".
Embora a companhia tenha fechado um acordo com o governo para reduzir e depois congelar o diesel, a gasolina não esteve envolvida nas negociações, que preveem uma subvenção federal para compensar eventuais perdas da Petrobras com a medida.
A Federação Única dos Petroleiros (FUP) criticou fortemente o reajuste em nota e qualificou o movimento como "uma decisão abusiva da gestão da Petrobras".
"Em meio ao caos que sua política de preços de derivados causou ao país, o presidente da Petrobras, Pedro Parente, volta a afrontar a sociedade", atacou o sindicato.
POLÍTICA EM XEQUE
O movimento do governo de mudar as práticas da Petrobras para os reajustes do diesel, mesmo com garantia de que a companhia não terá perdas, assustou principalmente investidores estrangeiros, o que foi agravado pela pauta política da greve dos petroleiros nesta quarta-feira, disse à Reuters um analista político.
"Está uma confusão de explicar...eles estão completamente perdidos", afirmou.
"A reação maior tem a ver com o sinal que se quis dar lá atrás, quando foi fixada a política de preços, de que não teríamos mais ingerências políticas. E de repente na primeira encrenca a Petrobras é chamada a apagar o fogo", apontou Moutinho, da USP.
Ele defendeu a política de preços da companhia, mas admitiu que o movimento de alta do petróleo nos últimos meses deveria ter sido melhor acompanhada pelo governo.
"Adotou-se essa política para compensar um pouco as perdas da Petrobras e para ela ganhar credibilidade internacional... para dar uma mensagem muito clara, e tirar da Petrobras o papel de 'amortecedor' de ciclos de preços", explicou.
Para o ex-presidente da estatal Empresa de Pesquisa Energética (EPE) Mauricio Tolmasquim, a política da estatal era adequada a momentos de tranquilidade nos mercados de petróleo, mas foi pega no contrapé por fatores geopolíticos que aumentaram os preços.
"O mais grave de tudo é o governo, que tem que olhar para todos os lados, não ter feito isso", afirmou.
Tolmasquim, que é professor da Coppe/UFRJ, defendeu que a Petrobras poderia aplicar uma política de reajustes guiados por uma média móvel, ou por análises mensais, ou trimestrais.
"O importante é ter uma fórmula de reajuste conhecida, porque isso vai dar previsibilidade... claro que você pode ter ali uma pequena defasagem, mas o dano é muito menor que essa situação que estamos vivendo hoje. Dá, sim, para preservar os ganhos da Petrobras", argumentou.
A Petrobras, no entanto, prometeu manter sua política para a gasolina em uma teleconferência convocada às pressas na terça-feira.
Na ocasião, Parente afirmou que essa política não foi uma decisão "caprichosa" da companhia, mas buscou manter tanto margens quanto a participação de mercado.
Isso porque a estatal poderia perder clientes para rivais em momentos em que praticasse preços superiores, caso aplicasse reajustes mais espaçados.
No diesel, o governo vai custear a diferença de custos para a companhia com os reajustes agora mensais, mas ainda há um desafio para Brasília em encontrar recursos para bancar essa conta, que pode somar 10 bilhões de reais até o final do ano.
Moutinho, da USP, apontou que o governo poderia viabilizar essa compensação em meio a uma renegociação com a Petrobras dos termos da chamada cessão onerosa --quando a estatal pagou bilhões de reais ao Tesouro pelo direito de explorar áreas no pré-sal.
A Petrobras entende que tem valores a receber da União porque o preço do barril de petróleo caiu desde então, enquanto o governo quer concluir um acordo com a companhia para licitar reservas extras que acredita haver na região.
"Se nessa cessão onerosa dá 1 bilhão de barris a mais para a Petrobras, paga a conta com folga. De repente a única margem que o governo tem é essa", disse.