Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) -A Polícia Federal deflagrou nesta quinta-feira a maior operação do país contra os atos antidemocráticos, com o cumprimento de quatro mandados de prisão e 103 de busca e apreensão expedidos pelo Supremo Tribunal Federal (STF), além de quebras de sigilo bancário, suspensão de certificados de registro de colecionadores de armas e bloqueio de contas bancárias.
Segundo comunicado do Supremo, os alvos da operação são suspeitos de "organizar e financiar atos pela abolição do Estado Democrático de Direito e outros crimes". Essas ações têm sido promovidas por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro desde que ele perdeu a disputa à reeleição.
As medidas foram autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF, e estão sendo realizadas pela PF em oito Estados: Acre, Amazonas, Espírito Santo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rondônia e Santa Catarina, além do Distrito Federal.
"Os grupos propagaram o descumprimento e o desrespeito ao resultado do pleito eleitoral para presidente e vice-presidente da República, proclamado pelo Tribunal Superior Eleitoral em 30 de outubro último, além de atuar pelo rompimento do Estado Democrático de Direito e instalação de regime de exceção, com a implantação de uma ditadura", disse o STF.
Após a diplomação do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) na segunda-feira, apoiadores de Bolsonaro munidos de paus, pedras, fogos de artifício e até mesmo bombas caseiras tentaram invadir o edifício-sede da PF em Brasília para contestar a prisão, por ordem do STF, de um líder indígena bolsonarista acusado de "envolvimento em protestos antidemocráticos".
A onda de violência ocorreu em meio a manifestações de simpatizantes de Bolsonaro em frente a unidades das Forças Armadas em vários pontos do país pregando o desrespeito ao resultado das eleições e uma intervenção militar -- o que seria um golpe, já que não existe previsão legal para isso.
A operação desta quinta-feira ocorre no âmbito dos inquéritos que apuram atos ilegais e antidemocráticos, abusos em ataques ao STF e financiamento de milícias digitais, entre outros pontos. A ação foi dividida em duas decisões de Moraes.
Em um dos casos, os alvos são grupos que atuaram no financiamento ao bloqueio do tráfego em diversas rodovias e manifestações em frente aos quartéis das Forças Armadas realizados após o segundo turno das eleições por pessoas inconformadas com a derrota de Bolsonaro em sua tentativa de reeleger-se.
O Supremo já havia determinado em outra ação medidas para identificar os caminhões e veículos que atrapalharam o trânsito, bem como os responsáveis por organizar esses atos. Essa operação teve como base relatórios de inteligência enviados pelo Ministério Público e diversos ramos da polícia, que foi capaz de identificar patrocinadores e financiadores dos atos ilegais.
A investigação apura ações de três grupos envolvidos no crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, delito previsto no Código Penal. Nessa operação, foram expedidos 80 mandados de busca e apreensão: nove no Acre, um no Amazonas, 20 no Mato Grosso, 17 no Mato Grosso do Sul, 16 no Paraná, 15 em Santa Catarina, um em Rondônia e um no Distrito Federal.
Em outra frente, foram determinadas 23 medidas de busca e apreensão no Espírito Santo envolvendo 12 pessoas, a partir de informações do Ministério Público estadual, além de quatro prisões preventivas para manutenção da ordem pública, apreensão de passaportes e decretação de afastamento do sigilo bancário e sigilo telemático.
A apuração dessas condutas se relacionam às investigações de atos contra o Supremo e a atuação das milícias digitais. As suspeitas sob investigação envolvem crimes contra a honra, além do crime de incitação ao crime e da tentativa de golpe de Estado.
"Em relação a dois deputados estaduais investigados, o ministro determinou a imposição de medidas cautelares, como uso de tornozeleira eletrônica, proibição de deixar o estado, proibição de uso de redes sociais ainda que por interpostas pessoas, proibição de concessão de entrevistas de qualquer natureza e de participação em qualquer evento público em todo o território nacional. Em caso de descumprimento, há previsão de multa diária de 20 mil reais", informou o STF no comunicado, que não divulgou os nomes dos envolvidos.
Na quarta-feira, durante um evento em Brasília, o ministro Alexandre de Moraes afirmou, sem entrar em detalhes, que "ainda tem muita gente para prender e muita multa para aplicar". O ministro, alvo de ataques constantes de Bolsonaro e seus apoiadores, comanda os inquéritos na corte sobre milícias digitais e atos antidemocráticos, além de presidir o TSE.
(Edição de Pedro Fonseca)