Por Roberto Samora
SÃO PAULO (Reuters) - Após venderem antecipadamente soja, milho e café como nunca, embalados nos patamares recordes do dólar frente ao real, produtores do Brasil deverão limitar seus negócios, agora que a moeda norte-americana perdeu quase 15% de seu valor na comparação com as máximas do ano, avaliaram especialistas do Itaú BBA nesta quinta-feira.
"Teve um nível recorde de fixação. O produtor fixou o produto e o câmbio, aproveitou bem do momento. Se ele estiver bem travado, ele vai travar menos", disse o diretor de Agronegócio do Itaú BBA, Pedro Fernandes, ao comentar o nível de vendas de soja em Mato Grosso, onde ele observou que os negócios estão bastante avançados.
O dólar atingiu uma máxima de fechamento de 5,9012 reais em 13 de maio, e era negociado na venda a cerca de 5,10 reais, mas ainda assim registrava ganhos de mais de 25% no acumulado do ano. Em junho, até quarta-feira, a queda foi de 4,76%.
Com a queda do dólar, "há uma diminuída do ritmo de fixação, porque fizeram muito bem a lição de casa...", disse Fernandes, lembrando que o produtor aproveitou bem os patamares mais elevados da moeda norte-americana para travar preços.
Segundo dados do Itaú BBA, os produtores brasileiros tinham vendido cerca de 30% da soja da nova safra até o final de maio, três vezes mais ante anos anteriores.
Pelos últimos dados do Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária (Imea), divulgados em 11 de maio, as vendas de soja da nova safra (2020/21) em Mato Grosso, maior produtor de grãos do Brasil, tinham atingido 37,25% até o final de abril, um nível recorde --os negócios de milho também nunca estiveram tão adiantados.
Para o gerente de Consultoria Agro do Itaú BBA, Guilherme Bellotti, a relação de troca piorou um pouco, com o recuo do dólar, mas ainda assim é vantajosa para o produtor.
"É um momento em que todos os elos da cadeia devem olhar para a gestão de riscos com muito bons olhos", afirmou ele, em referência à melhor forma de se enfrentar a volatilidade.
Bellotti comentou ainda que os preços dos fertilizantes, como cloreto de potássio e fosfatados, caíram em dólar, enquanto os valores dos defensivos estão "acomodados", o que sinaliza uma boa safra futura para os agricultores, considerando os preços das commodities em reais.
CAFÉ
No caso do café, produtores também estão com vendas bastante antecipadas por influência do câmbio. No caso da Cooxupé, maior cooperativa de cafeicultores do Brasil, 60% dos embarques programados para o ano já estão com preços travados, nível jamais visto nesta época.
Para o consultor César de Castro Alves, também do Itaú BBA, os produtores de café, de maneira geral, estão protegidos, principalmente aquele que vendeu o produto a cerca de 600 reais a saca de 60 kg, patamar bastante elevado ante os cerca de 500 reais atualmente.
"Ele está absolutamente protegido... O produtor que usou o mercado em dois ralis fortíssimos...", disse Alves, ressaltando que até o momento tudo caminha para uma safra volumosa e com qualidade no Brasil, diferentemente de 2019, quando chuvas atrapalharam e o ano era de baixa bianualidade.
Problemas de qualidade fizeram o cafeicultor receber 100 reais por saca a menos no ano passado, observou o consultor.
Alves disse ainda que avalia que os números do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), de 68 milhões de sacas para a safra do Brasil, "façam mais sentido". Os números oficiais do governo brasileiro apontam uma safra em torno de 60 milhões.
Se confirmados os números do USDA, a safra superaria a temporada anterior, abaixo de 60 milhões de sacas, e a de 2018/19, quando o país colheu 65 milhões de sacas, segundo departamento norte-americano.
(Por Roberto Samora)