Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - As hidrelétricas do Sudeste do Brasil, que concentram os maiores reservatórios, estão com o menor nível de armazenamento desde 2014, em meio a chuvas bastante abaixo da média histórica mesmo em um período tradicionalmente de boas precipitações.
Os lagos das usinas hídricas, principal fonte de geração no país, estão com capacidade abaixo dos piores momentos de 2001, ano em que os brasileiros enfrentaram um racionamento de eletricidade, mas analistas e o governo por ora descartam riscos de falta de energia em 2020.
Segundo especialistas ouvidos pela Reuters, há um considerável parque de termelétricas a ser acionado para atender a uma demanda que não tem crescido com vigor nos últimos anos, além de uma oferta bem maior proveniente de usinas eólicas e solares que não existiam no passado.
A projeção de continuidade da atual condição seca em janeiro, no entanto, deve pressionar as contas de luz, ao manter cobranças adicionais geradas pelas bandeiras tarifárias. Sem mudança no quadro hídrico, ainda, o governo poderá decidir acionar termelétricas mais caras para atender à demanda, o que também gera custos que posteriormente são repassados às tarifas.
"Não vejo riscos de suprimento. O sistema está bastante seguro, temos capacidade de geração suficiente para aguentar", disse à Reuters o consultor Ricardo Lima, sócio-diretor da Tempo Presente e ex-conselheiro da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE).
Ele destacou que há muitas termelétricas não acionadas e lembrou que um órgão do governo, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), acompanha as condições para avaliar se é necessário despachar usinas além do previsto em programas computacionais que guiam a operação do sistema de energia.
Esse despacho adicional poderá ser exigido em janeiro caso as projeções atuais de chuvas não melhorem até meados do primeiro mês de 2020, disse o presidente da Copel (SA:CPLE6) Energia, Franklin Kelly Miguel.
"Nossa visão sobre possibilidade de racionamento em 2020 é zero. Mas pode sair mais caro... temos esse problema. Atendimento à demanda, teremos, mas o custo será alto. Se escorregar mais um pouco a entrada do 'período úmido' podemos ter acionamento das térmicas já em janeiro", afirmou.
As hidrelétricas do Sudeste/Centro-Oeste estavam na quarta-feira com 20% da capacidade, contra 26,5% no mesmo dia de 2018 e 18,6% em 2014, pior registro do histórico. Em 2001, o menor volume alcançado foi de quase 21%, segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).
As chuvas nos lagos das usinas em dezembro estão projetadas em 85% da média histórica, contra apenas 62% da média em novembro, quando começou o período geralmente favorável para as chuvas nos reservatórios, que vai até abril, apontou a CCEE.
BANDEIRA TARIFÁRIA
Como ainda não há indicações de chuvas perto da média em janeiro, projeções pessimistas devem influenciar negativamente a definição pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), na sexta-feira, da bandeira tarifária da conta de luz válida para janeiro.
A bandeira tarifária aumenta custos para os consumidores em momentos de baixa oferta de energia, quando sai do patamar verde para amarelo ou vermelho. Ela está atualmente no nível amarelo, que gera cobrança extra de 1,343 real para cada 100 quilowatts-hora.
"Pelo menos amarela deve ficar, amarela ou vermelha", disse Franklin.
Janeiro, em pleno "período úmido" das hidrelétricas, tem registrado bandeira verde nas tarifas desde 2017.
GOVERNO TRANQUILO
Além dos especialistas, o governo também não vê possibilidade de racionamento de energia elétrica em 2020.
O Ministério de Minas e Energia disse em nota nesta semana que "não haverá falta de energia, mesmo que haja crescimento da economia acima de 2,5%".
A afirmação da pasta foi endossada pelo presidente Jair Bolsonaro em sua conta no Twitter na segunda-feira, após uma reportagem do jornal O Globo no final de semana ter afirmado que haveria um setor do governo preocupado com riscos de racionamento.
Rumores sobre a possibilidade de falta de energia têm surgido com relativa frequência no Brasil nesta década, em meio a uma deterioração do quadro hidrológico, mas não houve novas restrições compulsórias ao consumo depois de 2001.
O racionamento naquele ano levou a duros ataques ao governo do então presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), o que ajudou a tornar as possibilidades de falta de energia um tabu entre políticos no país ao longo dos últimos anos.
(Por Luciano Costa)