Por Roberto Samora
SÃO PAULO (Reuters) - Com grandes safras de soja da América do Sul a caminho em 2024/25, especialmente no Brasil, os produtores no país estão contando com os patamares recordes do dólar frente ao real para limitar perdas nos preços de seu produto na moeda brasileira, em momento em que o mercado de referência de Chicago está nos menores níveis em quatro anos, afirmaram especialistas.
Isso deve permitir que agricultores no maior produtor exportador global de soja sintam menos os impactos de uma oferta global superior à demanda na safra 2024/25, com a colheita de uma safra "gigantesca" no Brasil começando a chegar ao mercado já em janeiro.
Os contratos futuros da soja em Chicago próximos dos menores níveis desde 2020, porém, estão pressionando os prêmios de exportação da nova safra nos portos do Brasil, que ficaram negativos para embarques em março em meio à expectativa da colheita recorde.
"A questão é que a safra é gigantesca, muito grande mesmo, próximo de níveis recordes de produtividade, então esse é de longe o fator que mais deve pesar nos preços", disse Gabriel Faleiros, gestor de pesquisa LATAM da S&P Global Commodity Insights.
Várias consultorias privadas têm apontado a safra brasileira acima de 170 milhões de toneladas, o que representaria aumentos entre 10% a 15% ante a temporada anterior, dependendo da base de comparação.
"Tanto é que preços da safra nova estão 15% abaixo dos preços atuais, e os prêmios safra nova já estão próximos de zero e até negativos pra alguns vencimentos", afirmou Faleiros, comentando que tais diferenciais estavam positivos há cerca de um mês.
O especialista, que citou também um crescimento mais lento da China, maior importadora de soja, concorda, contudo, que o dólar está segurando maiores perdas em reais no Brasil.
Enquanto Chicago caiu cerca de 7% desde o pico recente de 8 de novembro, a soja em reais no mercado referencial de Paranaguá (PR) recuou aproximadamente 3%, até quinta-feira.
O dólar estava cotado no início da tarde desta quinta-feira a cerca de 6,14 reais, com queda diária em torno de 2% após dois leilões do Banco Central, mas desde 8 de novembro avançou 7%.
Luiz Fernando Roque, coordenador de Inteligência de Mercado na Hedgepoint Global Markets, destacou que a real mais fraco torna a soja brasileira mais competitiva frente ao grão dos Estados Unidos, que terminaram há pouco uma de suas maiores colheitas. Algo favorável para uma temporada em que o Brasil deverá ter sua maior safra da história.
"As lavouras estão ótimas na maioria dos Estados. Se o clima continuar positivo, vamos colher mais de 170 milhões de toneladas", disse ele. "Tendência é de exportação recorde também", acrescentou.
Consultorias e a indústria também estão apontando embarques de soja do Brasil acima de 100 milhões de toneladas, superando a marca de 2023, de quase 102 milhões de toneladas, quando a oleaginosa liderou com folga a pauta de exportação do país e só o grão rendeu mais de 50 bilhões de dólares em divisas.
"Em termos de vendas de produtores, é claro que isso (dólar) ajuda, só que o problema é que Chicago e prêmio não estão ajudando muito", disse Roque.
Ainda assim, o índice de vendas antecipadas de soja do Brasil deve terminar dezembro em cerca de 35% da safra projetada, contra média histórica de cerca de 40%. "Andou um pouco, uns quatro pontos percentuais em relação ao mês anterior, mas ainda está atrasado", pontuou ele.
Segundo o analista, a partir do momento em que as exportações começarem a ganhar força no início do ano que vem, e com produtores precisando pagar suas contas, os negócios devem avançar mais, apesar da tendência de preços sazonalmente mais fracos na colheita.
Para Lucílio Alves, pesquisador do centro de estudos Cepea, da Esalq/USP, "os preços estão se sustentando", enquanto a taxa de câmbio é "muito favorável" para produtores na safra 2024/25, em cenário de safra mundial recorde.
"O consumo (mundial) não deve crescer na mesma intensidade, elevando os estoques... isso é motivo de baixa de preços externos. Mas, para o Brasil, o real fraco deixa nosso produto mais barato para importadores e, havendo melhor demanda, os preços subiriam...".
SAFRA 25/26
Mas um dólar em patamar recorde acima de 6,20 reais traz preocupações relacionadas a custos para 2025/26, na safra de soja que será plantada no segundo semestre do ano que vem, já que a maior parte das matérias-primas dos insumos, como fertilizantes e pesticidas, são importados.
"Sem dúvidas que o dólar agora vira uma contraponto à pressão observada em Chicago... porém cria-se uma enorme preocupação para o próximo ciclo 25/26", disse o diretor da consultoria Pátria AgroNegócios, Matheus Pereira, lembrando que dois terços dos insumos usados na soja brasileira são de origem importada.
"Dólar em alta é uma 'faca de dois gumes'. Ajuda agora na receita, porém alavanca os custos do próximo ciclo."
(Por Roberto Samora; com reportagem adicional de Fernando Cardoso)