Por Camila Moreira
SÃO PAULO (Reuters) - O Brasil deve registrar duas histórias diferentes na primeira e na segunda metade deste ano no que diz respeito à atividade econômica, de acordo com especialistas, com o impulso do primeiro trimestre perdendo força à frente diante do aperto monetário doméstico e da desaceleração global.
O cenário aponta para um início de 2023 também fraco, com a economia brasileira provavelmente voltando a registrar uma recessão técnica -- dois trimestres seguidos de contração do Produto Interno Bruto (PIB).
O crescimento de 1,0% do PIB no primeiro trimestre de 2022 sobre os três últimos meses do ano passado teve como importante motor a reabertura da economia das medidas contra a Covid-19, o que impulsionou o setor de serviços e, do lado da demanda, os gastos das famílias.
"Vale lembrar que a economia ainda está abrindo depois da pandemia, e ainda estamos vendo esses ganhos na primeira metade do ano. As pessoas voltaram a arrumar emprego, e vemos a população ocupada crescendo", disse Felipe Salles, economista-chefe do C6 Bank.
Estímulos fiscais anunciados pelo governo também ajudaram a atividade no início do ano, mesmo em um ambiente de inflação extremamente alta e desafiadora no país, e medidas como a antecipação do 13º para aposentados e pensionistas e a liberação de saque de até mil reais do FGTS tendem a continuar sustentando o consumo no segundo trimestre.
Mas a partir daí o enredo deve mudar.
"O grande problema é uma reversão importante no segundo semestre, marcadamente no terceiro trimestre, que terá um efeito importante do consumo que foi antecipado", explicou Flávio Serrano, chefe de análise macroeconômica da Greenbay Investimentos.
Outro importante ponto que tende a impactar a demanda e restringir a atividade no segundo semestre e em 2023 é o agressivo aperto da política monetária conduzido pelo Banco Central para controlar a inflação, que está em dois dígitos no acumulado do ano.
A Selic está atualmente em 12,75% e a perspectiva é de que volte a ser elevada. Com efeito defasado sobre a economia, os impactos da política monetária mais restritiva devem começar a aparecer com mais força no quarto trimestre e início de 2023, segundo economistas.
"A alta de juros pelo BC deve chegar na economia principalmente no segundo semestre. Na indústria e na construção civil ninguém sentiu ainda a alta de juros", disse o economista-chefe do banco BV, Roberto Padovani.
A eleição presidencial no segundo semestre também será ponto de atenção, com as incertezas relacionadas ao processo político potencialmente impactando a confiança e afetando decisões de investimento das empresas.
E um outro fator é a economia global. A perspectiva de apertos monetários também nos Estados Unidos e na Europa soma-se a questões como a pandemia na China e a guerra entre Rússia e Ucrânia para projetar uma desaceleração da atividade mundial.
A continuidade de gargalos nas cadeias globais de suprimentos e custos crescentes ainda podem prejudicar a atividade.
As projeções do mercado para o PIB este ano chegam a até 1,5%, mas para 2023 tem havido uma série de revisões para baixo, com algumas casas já prevendo retração da produção. Padovani, do BV, alerta para a possibilidade de mais correções nas estimativas, já que o ano que vem deve começar com uma dinâmica mais fraca e com a economia em recessão técnica.
Em suas contas, o crescimento do PIB brasileiro deve desacelerar a 0,2% no segundo trimestre sobre os três meses anteriores, e então registrar contrações de 0,1% e 0,3% nos dois períodos seguintes. Enquanto a estimativa para este ano é de uma de expansão de 1,0%, para 2023 o banco prevê alta de 0,5%.
Serrano, da Greenbay Investimentos, tem um cenário semelhante, com alta de 0,2% no segundo trimestre e quedas de 0,5% e 0,3% para os períodos seguintes. Segundo ele, a economia deve expandir entre 1% e 1,5% em 2022 e ficar entre 0% e 0,5% em 2023.