Por Bernardo Caram
BRASÍLIA (Reuters) - O avanço do arcabouço fiscal impacta as expectativas de inflação e já reflete em um recuo nos juros futuros, disse nesta quinta-feira o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, que também mandou sinal ao governo ao citar estudo da autoridade monetária que mostrou ineficiência de a meta de inflação seguir o ano calendário.
"Eu reconheço o grande trabalho que foi feito pelo governo, pelo ministro (Fernando) Haddad e como o Congresso se mobilizou e fez uma votação rápida e tão expressiva em um tema como o arcabouço, que é tão importante para a gente porque influi nas expectativas", disse, em entrevista à GloboNews.
"E tem influído nas expectativas, a gente vê as taxas de juros longas caindo bastante", acrescentou.
O presidente do BC não indicou quando a taxa Selic, atualmente em 13,75% ao ano, poderá cair, voltando a dizer que é apenas um voto de nove na diretoria da autoridade monetária, mas ponderou que “o cenário está melhor”.
Na entrevista, Campos Neto afirmou que o debate sobre a meta de inflação --alvo de críticas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva-- ainda precisa ser resolvido e reafirmou que em momentos de incerteza como o atual o ideal era não fazer nenhum tipo de modificação.
Ainda assim, sem mencionar o governo diretamente, ele fez uma sinalização a Haddad, que já havia defendido expressamente uma "meta contínua" para a inflação, fazendo com que o alvo deixe de ser fixo no final de cada ano.
“A gente fez um estudo algum tempo atrás, iniciado por diretores que nem estão mais no Banco Central, que chegou à conclusão que havia uma ineficiência de a meta ser o ano fiscal, porque teve alguns momentos da nossa história que foram feitas desonerações em produtos que tinham peso grande na inflação para influenciar a inflação no fim do ano e fechar dentro da meta,”, disse Campos Neto.
“Isso acaba gerando mudança de preços relativos, o que não é eficiente para a economia. Então chegou-se à conclusão, olhando o que tinha sido feito no passado, que se a meta fosse contínua naquele momento não haveria aquele incentivo e que, portanto, teria sido mais eficiente”.
Campos Neto, Haddad e a ministra do Planejamento, Simone Tebet, definirão em junho a meta de inflação de 2026 no Conselho Monetário Nacional e há uma expectativa de que possam aprovar também uma alteração no calendário do regime.
SURPRESA GRANDE
O presidente do BC disse que o dado de inflação divulgado nesta quinta-feira pelo IBGE veio melhor do que o esperado, assim como os núcleos de inflação --que desconsideram itens mais voláteis.
O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) subiu 0,51% em meio, depois de avançar 0,57% em abril, mostrou o IBGE. O resultado ficou abaixo da expectativa em pesquisa da Reuters de uma alta de 0,64%, e marcou a taxa mais baixa desde outubro de 2022.
"O dado de fato veio melhor, uma surpresa grande em vestuário, os núcleos de inflação vieram um pouco melhor, a gente tem dito que a inflação tem melhorado em um ritmo lento, a desinflação tem sido um pouco mais lenta do que a gente espera, mas a gente vê vários sinais positivos à frente", disse, citando melhoras na questão hídrica, commodities e alimentos no atacado.
Segundo ele, um fortalecimento do real, diante de uma desaceleração de crédito nos Estados Unidos, ajuda no processo de desaceleração de preços.
Campos Neto voltou a dizer que o presidente da República tem direito de falar sobre juros e afirmou que os indicados de Lula à diretoria do BC, Gabriel Galípolo e Ailton de Aquino Santos, entenderão "o quão técnico é" o processo de decisão dos juros básicos. Ressaltou ainda que permanecerá no cargo até o fim do mandato em 2024.
Ele disse que as indicações de Lula foram boas, de pessoas com capacidade técnica, e ressaltou que a diferença de opiniões na diretoria do Banco Central faz parte do processo de autonomia da autoridade monetária.
O presidente do BC afirmou que a autarquia está em processo de melhora em suas pesquisas que medem perspectivas para a inflação e ouvirá também empresários, que muitas vezes divergem de economistas ao defender redução dos juros porque sentem o custo do crédito.