Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - O Banco Central piorou suas projeções de inflação para este ano e o próximo, indicando enxergar a alta de preços no centro da meta apenas no início de 2018, fora do objetivo que vem pregando de que esse movimento deve ocorrer em 2017.
Diante do cenário, reiterou em seu Relatório Trimestral de Inflação, divulgado nesta quinta-feira, que não trabalha com a possibilidade de cortar a taxa básica de juros apesar da forte retração econômica, e que fará o necessário para cumprir seu intuito.
"(O BC) adotará as medidas necessárias de forma a assegurar o cumprimento dos objetivos do regime de metas, ou seja, circunscrever a inflação aos limites estabelecidos pelo CMN (Conselho Monetário Nacional), em 2016, e fazer convergir a inflação para a meta de 4,5 por cento, em 2017", informou.
E acrescentou: "reitera que essas condições não permitem trabalhar com a hipótese de flexibilização monetária", referindo-se às recentes expectativas e taxas de inflação e à situação fiscal do país, entre outros.
O diretor de Política Econômica do BC, Altamir Lopes, disse diversas vezes a jornalistas que há "desinflação contratada significativa" para o ano, sobretudo no setor de serviços e que não espera mais altas significativas do dólar sobre o real, mas ressaltou que o ajuste monetário ainda está em curso.
Ele também afirmou que o balanço de riscos para a inflação segue marcado por incertezas, incluindo as contas públicas. Segundo Lopes, o BC passou a enxergar o quadro fiscal como expansionista, diferente da visão anterior de neutralidade.
Os cálculos do BC consideraram superávit primário para o setor público consolidado de 0,5 por cento do PIB no ano, meta dada pela lei orçamentária, por conta da data de corte do documento, 18 de março. Ou seja, antes de o governo encaminhar proposta ao Congresso Nacional de redução da meta a 0,15 por cento do PIB, mas com abatimentos que empurrariam o resultado para o vermelho.
"Não é (superávit de) 0,5 ou 0,15 por cento do PIB que vai mudar nossa projeção de inflação levando-se em consideração o cálculo estrutural que fazemos", disse Lopes.
As taxas dos contratos de juros futuros reagiram à mensagem, com DIs em alta e a curva já precificando menos apostas na queda da Selic este ano, que segue em 14,25 por cento ao ano desde julho passado. O afrouxamento da política estava no radar de parte dos agentes, com alguns esperando que isso fosse ocorrer já no segundo semestre.
MAIS INFLAÇÃO
Segundo o relatório, o BC vê inflação subindo 6,6 por cento em 2016 --e estourando a meta-- e 4,9 por cento em 2017, sobre projeção anterior de elevação de 6,2 e 4,8 por cento, respectivamente, pelo cenário de referência (dólar a 3,70 reais e Selic a 14,25 por cento).
O BC mostrou ainda que vê a inflação a 4,5 por cento só no primeiro trimestre de 2018. A meta de inflação é de 4,5 por cento pelo IPCA, com margem de 2 pontos percentuais para mais ou menos em 2016 e de 1,5 ponto em 2017.
"Acho que o BC está correto em aguardar e ver os desdobramentos. Qualquer tom de corte de juros agora é para lá de precipitado", afirmou a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif, acrescentando que não trabalha com redução "tão cedo".
"Se a gente não tiver boa notícia da parte fiscal, há risco para inflação voltar a acelerar", completou.
No relatório, o BC também piorou a probabilidade de a inflação estourar a meta de inflação, indo a cerca de 55 por cento este ano, sobre 41 por cento antes. Para 2017, vê chance de 22 por cento, acima dos 20 por cento de antes.
As expectativas piores para o avanço de preços na economia vêm apesar da perspectiva de recessão bem mais forte. O BC piorou sua projeção para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2016, passando a ver contração de 3,5 por cento, contra 1,9 por cento.
O BC informou ainda que as incertezas em relação ao cenário externo prosseguem e novamente chamou a atenção para o processo de realinhamento de preços relativos mais demorado e intenso que o previsto.
Pelo relatório, o BC destacou ainda que os desenvolvimentos de eventos não econômicos "influenciam, e continuarão a influenciar, os preços dos ativos financeiros".
A mensagem é dada num momento em que a crise política ganha contornos agudos, em meio ao andamento do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Congresso.