Por Luana Maria Benedito
SÃO PAULO (Reuters) - O Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil deve crescer 5% este ano e desacelerar para 1,4% em 2022, projetou a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) nesta quarta-feira, alertando para a crise hídrica e as incertezas fiscais domésticas como riscos ao desempenho da economia.
"Após uma onda muito grave da pandemia no início do ano, a economia brasileira reagiu e se recuperou de forma impressionante entre o segundo e o terceiro trimestres do ano, à medida que a campanha de vacinação progrediu e as restrições à atividade foram levantadas", disse Priscilla Fialho, economista para Brasil da OCDE, a jornalistas, após a divulgação do relatório de perspectivas econômicas da organização.
"No entanto, essa recuperação está perdendo força", alertou a especialista, destacando sinais de fraqueza mesmo em setores que têm se saído bem nos últimos meses, como o de serviços.
Segundo o relatório da OCDE, isso se deve a gargalos na cadeia de oferta, baixo poder aquisitivo da população, inflação e juros mais altos e incertezas na política econômica.
Ainda assim, as projeções da OCDE divulgadas nesta quarta-feira vieram consideravelmente mais otimistas do que as medianas das estimativas na pesquisa semanal Focus, do Banco Central, realizada com economistas. O último levantamento apontava crescimento econômico de 4,78% em 2021 e de apenas 0,58% em 2022.
Mas "existem riscos importantes de baixa para (nossa) previsão" para o ano que vem, alertou a OCDE, citando possibilidade de que a crise hídrica se arraste por mais tempo do que o esperado -- o Brasil vive o pior período úmido nas áreas das hidrelétricas em mais de 90 anos -- e a ameaça de um crescimento abaixo das expectativas na China, principal parceira comercial do Brasil.
Além disso, "a incerteza política prolongada e o aumento do risco fiscal podem minar a credibilidade das regras fiscais, desancorar as expectativas de inflação e reduzir o crescimento do investimento" no Brasil, afirmou a organização.
O governo de Jair Bolsonaro tem pressionado por mais gastos com benefícios sociais no ano que vem, quando o presidente deve tentar a reeleição, e busca financiar Auxílio Brasil de pelo menos 400 reais por família. Para custeá-lo, o governo conta com a aprovação da PEC dos Precatórios pelo Congresso.
A proposta, que altera o prazo de correção do teto de gastos pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), abriria espaço nas contas públicas para o ano que vem, mas é amplamente vista como prejudicial à credibilidade fiscal do país, já que modificaria a principal âncora para os gastos do governo.
A OCDE defendeu que o Estado brasileiro precisa melhorar a eficiência do gasto público.
"Mais de 90% do orçamento agora é determinado por lei, o que realmente reduz muito a flexibilidade do governo para responder a potenciais choques no futuro e deixa pouco espaço para novos programas e reformas estruturais", disse Fialho em resposta a pergunta da Reuters.
Esse tipo de mudança estrutural deveria almejar "reduzir a rigidez orçamentária, revisando por exemplo as vinculações de receitas, metas de gastos obrigatórios e regras de indexação", afirmou a economista.
Álvaro Pereira, diretor do departamento de economia da OCDE, afirmou que "não temos dúvidas de que o Brasil poderá fazer esse tipo de reforma", apesar de incertezas políticas, citando progresso recente do país na aprovação de outros remodelamentos estruturais, como a reforma da previdência.
INFLAÇÃO E JUROS
A OCDE mencionou em seu relatório preocupações com a inflação elevada no Brasil, afirmando que fatores globais ajudam a explicar o aumento da pressão sobre o consumidor, em meio à valorização das commodities e gargalos na cadeia de abastecimento.
Mas o órgão internacional também culpou a crise hídrica brasileira pela disparada dos preços, uma vez que tem afetado os preços de energia. "A incerteza quanto às políticas econômicas e o aumento do risco fiscal também afetam o câmbio, elevando a inflação importada", acrescentou a OCDE.
Dados da semana passada mostraram que, nos 12 meses até novembro, o IPCA-15, considerado prévia da inflação brasileira, acumulou alta de 10,73%, ficando bem acima do teto da meta oficial de 3,75%, com margem de 1,5 ponto percentual para mais ou menos.
Mesmo assim, "projeta-se que o aperto contínuo da política monetária ao longo de 2022 contenha a dinâmica da inflação e mantenha ancoradas as expectativas" sobre os aumentos de preços, apontou o relatório da OCDE, embora Fialho tenha ressaltado a jornalistas que "há lapsos de tempo entre a ação do Banco Central e resultados em termos de estatísticas na inflação e nas expectativas de inflação".
Atualmente, a taxa básica de juros Selic está em 7,75% ao ano, após o Banco Central elevá-la em 1,5 ponto percentual em seu último encontro de política monetária. Custos mais altos dos empréstimos ajudam a esfriar os gastos do consumidor, o que, consequentemente, tende a segurar a inflação.
"A ação do BC já foi significativa nos últimos meses", afirmou Fialho.