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Brasil fecha 2014 com déficit primário de R$32,5 bi, o 1º em mais de 10 anos

Publicado 30.01.2015, 14:07
© Reuters. Banco Central, em Brasília

Por Luciana Otoni e Flavia Bohone

BRASÍLIA (Reuters) - Pela primeira vez em mais de dez anos, o setor público brasileiro não conseguiu fazer economia para pagar juros da dívida em 2014, consequência da fraca atividade econômica e mau gerenciamento das contas públicas num desempenho que sinaliza um ano difícil também em 2015.

O país registrou déficit primário de 32,536 bilhões de reais no ano passado, informou o Banco Central nesta sexta-feira, o primeiro resultado negativo desde o início da série histórica, em 2001. Com isso, o saldo primário negativo foi equivalente a 0,63 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), também o pior já registrado. Em 2013, o setor público registrou superávit primário de 91,3 bilhões de reais, ou 1,88 por cento do PIB.

Só em dezembro, o déficit primário somou 12,894 bilhões de reais, muito pior que o esperado por analistas consultados pela Reuters, cuja mediana apontava saldo positivo de 11,6 bilhões de reais..

O setor público consolidado (governo central, Estados, municípios e estatais) não cumpre a meta de superávit primário desde 2012. Para 2014, o governo limou o objetivo ao conseguir aprovar no Congresso Nacional mudança na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO). Por isso, ninguém do Executivo sofrerá penalidades pelos maus resultados.

"O governo não ajustou as projeções fiscais em um quadro adverso do ano passado. Deveria ter revertido desonerações e não fez dado a iminência do quadro eleitoral", disse o especialista em contas públicas Felipe Salto.

No ano passado, o governo central (governo federal, INSS e BC) registrou déficit primário de 20,472 bilhões de reais, neste caso o primeiro desde 1997, quando o saldo ficou negativo em 2,375 bilhões de reais.

Já os governo regionais (Estados e municípios) apresentaram déficit primário de 7,790 bilhões de reais em 2014, o primeiro desde 1998 (-1,731 bilhão de reais), enquanto as empresas estatais tiveram resultado fiscal negativo de 4,274 bilhões de reais.

Com isso, o déficit nominal --receitas menos despesas, incluindo pagamento de juros-- do país foi a 343,916 bilhões de reais em 2014, equivalente a 6,70 por cento do PIB, mais do que o dobro do visto no ano anterior, de 3,25 por cento, e um recorde histórico.

No ano passado, a conta com o pagamento dos juros da dívida atingiu o recorde 311,380 bilhões de reais. Dentro desse montante está o prejuízo de 17,329 bilhões de reais com as operações de swap cambial.

A desordem nas contas públicas vinha ocorrendo há alguns anos, por meio de fortes desonerações tributárias para tentar estimular a fraca atividade e até manobras contábeis.

O cenário do ano passado aumenta ainda o desafio da nova equipe econômica --encabeçada pelos ministros Joaquim Levy (Fazenda) e Nelson Barbosa (Planejamento), além do presidente do BC, Alexandre Tombini-- de reverter a deterioração das contas públicas e reconquistar a confiança dos agentes econômicos.

Para 2015, o governo já anunciou nova meta de primário, equivalente a 1,2 por cento do PIB, ou cerca de 65 bilhões de reais, subindo para 2 por cento do PIB nos próximos dois anos.

Mas com a economia estagnada e alguns economistas prevendo até contração neste ano, atingir esse alvo está cada vez mais complicado. Segundo pesquisa Focus do BC, os economistas consultados preveem que a atividade crescerá apenas 0,13 por cento neste ano.

Na opinião do economia-chefe do banco J. Safra e ex-secretário do Tesouro, Carlos Kawall, o cumprimento da meta de superávit primário, equivalente a 1,2 por cento do PIB, em 2015, é factível, mas vai depender da vontade política de fazer o contingenciamento necessário,

"Se a economia cair um pouco mais, o governo vai ter que apertar mais o cinto. É uma questão de custo/benefício. O custo é alto, mas o benefício é melhor", disse Kawal, que projeta uma retração de 0,5 por cento do PIB neste ano, que pode aumentar para queda de 1,5 por cento, caso o país tenha racionamento de energia.

DÍVIDA SALTA

O BC informou ainda que a dívida bruta do país --que será uma dos principais focos da nova equipe econômica-- saltou para 3,25 trilhões de reais no final do ano, ou 63,4 por cento do PIB, o maior patamar da série histórica que começou em 2001.

A dívida líquida, por sua vez, subiu a 36,7 por cento do PIB no mês passado, acima dos 36,1 por cento estimados em pesquisa Reuters. No final de 2013, a dívida líquida estava em 33,6 por cento do PIB.

Para tentar estancar o aumento da dívida bruta, a nova equipe econômica anunciou que não haverá mais aportes aos bancos públicos, além de outras medidas de cortes de gastos e aumento de impostos que, juntas, equivalem a cerca de 70 bilhões de reais.

Ainda assim, o BC continua a ver aumento do endividamento, projetando para este ano dívida bruta de 65,2 por cento do PIB e dívida líquida em 38,2 por cento.

© Reuters. Banco Central, em Brasília

Na avaliação do especialista Felipe Salto, a ajuste proposto pode não ser suficiente, considerando a recente piora nas projeções de crescimento do país para este ano e exingido aperto ainda maior por parte da nova equipe econômica.

"A dívida bruta vai crescer por mais dois ou três anos porque a taxa de juros está aumentando. E a sustentabilidade considera também a ampliação do patamar da dívida e o superávit primário realizado. O avanço da dívida é nosso principal problema."

Para 2015 e 2016, ele projeta a dívida bruta em 65,5 e em 65,7 por cento do PIB, respectivamente.

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