Arena do Pavini - O mercado financeiro já dá como certo um corte na taxa de juros básica Selic de 6,75% ao ano para 6,5% na reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) que começou hoje e termina amanhã no fim da tarde. A estimativa de queda está no boletim Focus do Banco Central e foi reforçada pelo Comitê de Acompanhamento Macroeconômico da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). E tanto o Focus quanto a Anbima acreditam que a taxa ficará nesse nível até o fim do ano.
Mas começam a surgir avaliações mais baixistas no mercado. Na semana passada, a LCA Consultores dizia que aumentavam as chances de o Copom continuar cortando os juros para perto de 6% ao ano, diante de sinais de inflação mais comportada por mais tempo. Isso deve tornar o comunicado que acompanha a decisão do Comitê amanhã mais importante, pois ela dará pistas sobre os próximos passos do Banco Central (BC).
O próprio comitê da Anbima indicou nova queda da mediana do IPCA, usado nas metas de inflação do BC, de 3,9% para 3,6% em 2018, abaixo das expectativas de 4,2% do Banco Central. “Diante da trajetória atual da inflação, a autoridade monetária pode não sinalizar o fim do ciclo de queda dos juros após esta reunião do Copom, deixando aberta a possibilidade de uma redução adicional da Selic em maio”, diz a nota do comitê.
Mais dois cortes
Os juros têm espaço para cair mais duas vezes além da decisão de amanhã, acredita Nicola Tingas, economista-chefe da Associação Nacional das Instituições de Crédito, Financiamento e Investimento (Acrefi). Os cortes ocorreria nas duas próximas reuniões, afirma. Para Tingas, esse cenário é possível porque a inflação está ainda numa tendência declinante. “A pressão do setor de serviço está esvaziada, assim como a dos alimentos, a indexação está enfraquecida, a atividade está reagindo de maneira lenta, janeiro frustrou, fevereiro melhorou, mas a tendência é de crescimento abaixo do esperado”, explica. “Portanto, o momento ainda é de politica monetária estimulativa, de juros mais baixos”, diz. Tingas também diz que não vê grandes riscos para a estabilidade da inflação vindos de fora. “Tem problemas com as tarifas comerciais dos Estados Unidos, mas não tem nada que possa comprometer a estabilidade”, diz.
O economista acredita que o juro real brasileiro pode ser mais baixo, diante de uma inflação de 3% ao ano. “E temos um hiato do produto (diferença entre o que o país produz e o que ele consome) significativo, com recuperação mais lenta e sem estresse”, diz. Nesse ambiente, deixar o juro mais alto seria visto como excesso de cautela do Copom.
Para Tingas, o desejo do BC, se tiver espaço, é cortar mais. “É até desejo da sociedade”, diz, acrescentando que não tem cenário para os juros em 2019. “Vai depender de muita coisa, mas especialmente da eleição presidencial”, afirma. “Mas a inflação e os juros estão em uma trajetória convergente e devem caminhar para um patamar menor”, explica.
Também o Banco Fator espera que os juros caiam para 6% este ano. Segundo José Francisco de Lima Gonçalves, a mudança na projeção ocorreu na semana passada, diante dos sinais de inflação mais controlada.
Risco é comprometer inflação de 2019
O risco de o Copom deixar a porta muito aberta para novos cortes é o mercado passar a projetar quedas muito maiores nas taxas, alerta Evandro Buccini, economista-chefe da Rio Bravo Investimentos. Para ele, o ideal é que o BC espere para ver se as projeções de inflação do mercado caem mais para este ano e para o ano que vem. “Se a estimativa para o IPCA de 2019 recuar, aí pode dar um novo corte”, acredita Buccini. Por isso, ele acredita que o Copom vai manter o mesmo comunicado de fevereiro, indicando o fim dos cortes, mas com possibilidade de rever a decisão de acordo com as projeções do mercado. “A inflação está um pouco mais volátil no curto prazo, mas a chance é de o BC repetir a nota e deixar a porta aberta”, diz.
Espaço para juro real mais baixo no futuro
Já Eduardo Levy, gestor dos fundos multimercados da Rio Bravo, lembra que há um consenso entre os economistas de que quando o juro parar de cair, ele ficará um bom tempo no novo nível. “Mas o juro real está muito baixo, se a Selic for para 6,25%, e a inflação ficar em 3,6%, estamos falando em juros reais de 2,5% ao ano, muito inferior aos 5% históricos do Brasil”, diz. Isso poderia levar a pressões inflacionárias no médio prazo que obrigariam os juros a subir mais. “O BC tem uma preocupação com a atividade econômica fraca, mas não é esse o mandato dele”, lembra.
Nesse caso, pode ser melhor ter um juro um pouco mais alto, de 6,5% ao ano agora, pensando em uma inflação mais controlada e uma taxa real mais baixa por um período mais longo depois, nos próximos anos. “E a decisão teria impacto agora sobre os juros longos futuros, que são os que definem as taxas dos empréstimos e ajudam na economia”, diz. “Não temos períodos logos, de dois, três anos com juros reais abaixo de 5%, o que podemos ter agora”, diz. “Podemos mudar o patamar da taxa no Brasil.”
PIB mais forte
Na Anbima, a visão é que o ritmo de recuperação da economia brasileira continua gradual. “Os resultados positivos da inflação neste primeiro trimestre, que ficaram abaixo do esperado, e a sinalização do Banco Central de que as perspectivas sigam otimistas, contribuíram para a nossa projeção deste novo corte dos juros”, afirma Fernando Honorato, vice-presidente do comitê da Anbima.
O comitê da Anbima revisou também as projeções para o Produto Interno Bruto (PIB) em 2018, que passou de 2,9% na reunião do grupo em fevereiro para 3% neste mês. A avaliação é que as condições para o crescimento estão mais favoráveis do que em anos anteriores, ainda que a capacidade ociosa da economia siga relevante.
Para os economistas do comitê da Anbima, o consumo das famílias é o principal elemento indutor do crescimento do PIB. Em relação ao investimento, apesar do início da recuperação de segmentos importantes, como o da construção civil, o grupo não espera uma contribuição do mesmo peso, sobretudo diante das condições das finanças públicas dos governos federais e estaduais e do grau de alavancagem das empresas. Há também a substituição dos recursos do BNDES por crédito privado via operações de mercado de capitais.
Dólar e juros nos EUA
Para o comitê da Anbima, o ciclo de elevação dos juros americanos previsto para este ano não trará reflexos imediatos aos países emergentes. Segundo o grupo, o Federal Reserve (Fed banco central americano) vem reafirmando que manterá o gradualismo nesse processo. No geral, o cenário externo segue construtivo, com crescimento da economia mundial, juros internacionais em níveis baixos e liquidez internacional relevante, diz o comitê.
Em relação ao dólar, o comitê reduziu a projeção de R$ 3,30, divulgada na reunião anterior do grupo, para R$ 3,27 no fim de 2018. Caso as expectativas se concretizem, haverá valorização de 1,1% da moeda doméstica no ano.
O Comitê de Acompanhamento Macroeconômico da Anbima é composto por 25 economistas de instituições associadas. Eles se reúnem a cada 45 dias em média, sempre na semana que antecede a reunião do Copom, para analisar a conjuntura econômica e traçar cenários para os mercados brasileiro e internacional.
Por Arena do Pavini