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Emenda na reforma política exige identificação de críticas a partidos políticos na Internet

Publicado 05.10.2017, 21:11
Atualizado 05.10.2017, 21:20
© Reuters.  Emenda na reforma política exige identificação de críticas a partidos políticos na Internet

SÃO PAULO (Reuters) - Uma emenda incluída na reforma política e que institui a suspensão e possível retirada da Internet de conteúdos considerados como ofensivos a partidos políticos pode cercear o direito à liberdade de expressão e prejudicar campanhas eleitorais, disseram fontes da indústria de tecnologia e membros da sociedade civil.

O texto, de autoria do deputado Áureo (SD-RJ), permite que qualquer pessoa possa denunciar conteúdos que considerar como "discurso de ódio, disseminações de informações falsas ou ofensa em desfavor de partido, coligação ou candidato" publicados em redes sociais ou aplicativos. A partir da denúncia, as empresas que hospedam o material denunciado serão obrigadas a suspender o conteúdo por 24 horas até que o usuário se identifique, apresentando RG e CPF. Caso isso não aconteça, a publicação será removida permanentemente.

Se as companhias não cumprirem com a determinação, podem ser acionadas judicialmente por quem fez a denúncia.

Procurada pela Reuters, assessoria do deputado Áureo defendeu a medida, dizendo que "a emenda apresentada promete dar equilíbrio e transparência no uso das redes sociais", pois "a liberdade de expressão é garantida, vedado o anonimato".

Segundo os assessores do parlamentar, conteúdos publicados com identificação, como notícias de jornais, não estão sujeitos às restrições da emenda, mesmo que sejam considerados ofensivos.

Porém, em nota conjunta, a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão, a Associação Nacional de Editores de Revistas e a Associação Nacional de Jornais consideraram a emenda uma forma de censura. As entidades condenaram a disseminação de notícias falsas, mas ressaltaram que "o combate a esses males só pode acontecer dentro da legalidade".

MARCO CIVIL DA INTERNET

O texto de Áureo "na prática ignora e reverte os princípios que foram definidos no Marco Civil da Internet. Além disso, o conteúdo deverá ser removido se for 'ofensivo'. Não há qualquer definição do que venha a ser um conteúdo 'ofensivo'. Vale lembrar que nem todo conteúdo ofensivo é ilícito, ao contrário, o que é ofensivo para alguém pode não ser para outra pessoa", disse Ronaldo Lemos, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS Rio).

A obrigação de identificação também pode gerar problemas de segurança com as informações pessoais e ferir o direito de manifestação política, disse Flavia Lefèvre, advogada da Proteste e conselheira do Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br).

"Deixar a avaliação sobre o que seja ofensa a partido ou candidato aos próprios interessados representa dar um cheque em branco para os políticos brasileiros que, na sua grande maioria, estão bem distanciados do interesse público", disse Lefèvre.

Segundo fontes da indústria de internet ouvidas pelas Reuters, a medida do deputado Áureo pode ser usada para fins pessoais. Uma vez que basta ocorrer a denúncia para que conteúdos sejam obrigatoriamente suspensos até a identificação, é possível que pessoas denunciem materiais de campanha, como propagandas políticas, apenas para diminuir seu alcance, por exemplo, disseram as fontes.

PESADELO TÉCNICO

Uma fonte da indústria de tecnologia afirmou à Reuters que pela própria dinâmica da Internet, que muitas vezes não exige a identificação de usuários para cadastros, faz com que a implementação do texto não seja tecnicamente factível para as companhias onde o conteúdo é publicado.

Para as empresas, existe também a questão do ônus operacional, como a necessidade de contratação de pessoal para a verificação dos conteúdos e arcar com processos jurídicos.

"Do ponto de vista operacional isso é um pesadelo. Esse artigo é muito confuso, deixa várias brechas, ou várias questões importantes em aberto, que vão tornar a implementação muito difícil para as empresas", disse outra fonte da indústria de tecnologia. "Creio que empresas que não têm o preparo nessa escala ou nesse prazo podem optar por não oferecer seus serviços no período eleitoral."

A emenda foi aprovada na madrugada desta quinta-feira na Câmara dos Deputados e horas depois no Senado. O presidente Michel Temer decidirá sobre eventual veto à emenda na sexta-feira, disse à Reuters uma fonte palaciana.

(Por Natália Scalzaretto, com reportagem adicional de Lisandra Paraguassu, em Brasília)

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