Donald Trump não é conhecido por meias palavras, e sua última investida contra o BRICS deixou isso ainda mais claro. Em uma postagem agressiva no Truth Social, ele ameaçou tarifas de 100% contra os países do bloco – Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul e seus novos membros – caso insistam na criação de uma moeda própria ou no apoio a alternativas ao dólar no comércio internacional. O recado foi direto: “Não há chance de o BRICS substituir o dólar. Qualquer país que tentar deve dizer adeus aos EUA.”
A ameaça soa familiar para quem acompanhou o estilo confrontador de Trump em seu primeiro mandato. Desta vez, no entanto, ele se volta a um bloco que, juntos, representa 31,5% do PIB global e quase metade da população mundial. É uma jogada ousada. Mas seria eficiente?
Por que Trump está tão incomodado?
Para Trump, a hegemonia do dólar é sinônimo do poder americano. Desde Bretton Woods, em 1944, o dólar reina absoluto como a moeda do comércio internacional. Isso dá aos EUA uma vantagem estratégica enorme – poder de sanção, controle sobre fluxos financeiros globais e uma demanda consistente pela sua moeda.
Só que o BRICS, especialmente sob o impulso de países como Rússia e China, começou a questionar esse modelo. Não é à toa. Vladimir Putin, por exemplo, já defendeu um sistema alternativo de pagamentos que bypassa o SWIFT, o padrão global controlado pelo Ocidente. Isso evitaria sanções como as que a Rússia enfrentou após a invasão da Ucrânia.
O Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), presidido por Dilma Rousseff, também é peça importante desse quebra-cabeça. Ele tem como meta financiar projetos dos países membros sem depender do dólar ou das regras das instituições de Bretton Woods – o FMI e o Banco Mundial.
O plano do BRICS é realista?
Aqui está o ponto crucial: o BRICS ainda está distante de substituir o dólar. O bloco discute há anos a possibilidade de uma moeda própria, mas esbarra em divergências políticas e práticas. Cada país tem interesses e prioridades diferentes. Além disso, a infraestrutura para um sistema global alternativo ainda é incipiente.
O objetivo do BRICS não é acabar com o sistema atual, mas complementá-lo. A ideia seria criar alternativas que deem aos emergentes mais voz em um cenário econômico dominado pelos EUA.
O que acontece se Trump seguir adiante?
Se Trump realmente impor tarifas de 100%, as consequências podem ser graves – para todos os lados. Importadores americanos teriam que lidar com custos mais altos, o que alimentaria a inflação. Isso poderia forçar o Federal Reserve a adotar políticas mais duras, como a elevação dos juros, prejudicando consumidores e investidores.
No lado do BRICS, a retaliação poderia vir na forma de alianças ainda mais fortes entre seus membros, acelerando o próprio movimento de desdolarização. No Brasil, por exemplo, Luiz Inácio Lula da Silva já defendeu abertamente o uso de moedas locais nas transações comerciais do bloco, e o país assumirá a presidência do BRICS em 2025 com a intenção de aprofundar esse debate.
O que está em jogo?
A postura de Trump não é apenas sobre comércio; é sobre manter o status quo de um mundo onde os EUA ditam as regras. O BRICS, por sua vez, representa a crescente insatisfação de economias emergentes com essa ordem.
Se há uma verdade nesse embate, é que o BRICS não substituirá o dólar tão cedo, mas sua mensagem é clara: há vida além de Washington.
E Trump, com sua retórica inflamada, pode acabar acelerando exatamente aquilo que tanto teme.