Arena do Pavini - A inflação do IPCA acelerou para 1,26% em junho, maior para o mês desde 1995 e a primeira acima de 1% desde janeiro de 2016. Mas isso não significa uma tendência, apenas o impacto da greve dos caminhoneiros e de fatores que também serão temporários, avalia Evandro Buccini, economista-chefe da Rio Bravo Investimentos. Ele vê, porém, a economia brasileira e os mercados em compasso de espera no médio prazo, por conta da eleição presidencial e da recuperação da atividade mais lenta. A inflação baixa, que era a notícia mais positiva, passa por um período de alta, enquanto o dólar se consolida em um novo patamar que pode pressionar um pouco os preços, mas vai ajudar nas exportações, especialmente de commodities.
Efeitos temporários na inflação
A inflação do IPCA veio mais alta em junho, mas dentro do esperado, com alguma surpresa apenas em serviços, que ficaram um pouco mais fortes, mas sem grande preocupação. Os alimentos puxaram o índice, mas já dão sinais de retração. “Esperamos um IPCA de 4,2% para o ano ou perto disso, e vamos esperar o IPCA de julho, mas pela coleta diária de preços da Fundação Getulio Vargas, os preços já estão se reduzindo, devagar, mas finalmente caindo”, diz. Isso é importante para a definição das expectativas e para a política monetária, explica Buccini, pois sem inflação em alta, a pressão do mercado para uma alta dos juros sobre o Banco Central (BC) tende a diminuir.
Para ele, o IPCA de julho deve fechar perto de 0,30%, registrando o efeito transitório da greve dos caminhoneiros sobre os preços. “Esperávamos uma volta mais rápida dos preços, mas ela demorou para acontecer, talvez pela discussão sobre o tabelamento do frete, que impacta os custos das empresas”, diz.
Impactos na atividade podem demorar mais para ser medidos
Já os efeitos da paralisação dos caminhoneiros na atividade econômica demorarão um pouco mais para ser avaliados, até porque não há tantos índices e levantamentos como há com a inflação, e são mais defasados, lembra Buccini. O primeiro dado de maio, a produção industrial, trouxe uma queda forte, e alguns indicadores antecedentes mostram uma recuperação em junho, mas menor que a queda. “Portanto, a greve vai impactar a atividade econômica do ano, pois a compensação em junho não vai ser tão forte”, explica. Além disso, há o impacto no apetite de consumo por bens duráveis. “A pessoa que ia comprar um carro em maio e foi surpreendida pela greve dos caminhoneiros e toda a incerteza na economia e na política que se seguiu vai adiar a compra e esperar o cenário se definir melhor”, diz.
Cenário político complicado
O cenário político também não ajuda muito, com a falta de um candidato de centro com bons índices nas pesquisas e as notícias políticas negativas. A mais recente, dos partidos do chamado centrão dizendo que vão apoiar o candidato de esquerda, Ciro Gomes, do PDT, e não Geraldo Alckmin, do PSDB, de centro. “Pode ser apenas uma tentativa do centrão se vender mais caro, mas cria espuma, e não dá para saber o que é verdade”, afirma Buccini. A definição do cenário eleitoral só ocorrerá mesmo após as convenções em agosto, mas até lá haverá muita notícia mexendo com os mercados. “E se o centrão apoiar mesmo Ciro, ai os mercados vão sofrer mais”, diz.
Menos motivos para o BC subir os juros
O ponto positivo é que a pressão exagerada para o Banco Central subir os juros para segurar o dólar não se manteve com os sinais de que a inflação está recuando e as expectativas do mercado estáveis. “E não por que o BC mexer nos juros para alterar o câmbio, temos de aceitar o novo patamar”, afirma Buccini. Segundo ele, o BC está correto ao deixar a moeda subir e atuar apenas para evitar os exageros nos mercados e nos efeitos secundários do dólar na inflação e na atividade. “Não tem por que subir os juros com a atividade fraca como está e com o volume de reservas internacionais que temos”, explica.
Dólar alto veio para ficar
Para o economista, o dólar mudou de patamar e não voltará mais para os R$ 3,20 do começo do ano. “Há uma grande mudança do dólar no exterior, com a alta dos juros americanos, e a menos que ocorra uma grande desaceleração da economia americana, o dólar continuará mais forte”, diz. Assim, o novo patamar do dólar deve ser R$ 3,60 caso o cenário no Brasil fique positivo. Já se o cenário for ruim para eleição aqui, o dólar tem espaço para subir bem mais que os atuais R$ 3,90.
Fé na continuidade do ajuste fiscal
A Rio Bravo acredita, porém, que o cenário mais provável para a eleição presidencial é de continuidade do ajuste fiscal. “Mesmo candidatos de esquerda falam em reformas, apesar de falarem também em desfazer várias coisas criadas neste governo para controlar as contas públicas”, diz. E o cenário que cada vez fica mais claro é de o candidato Jair Bolsonaro ir para o segundo turno. “Há muitas dúvidas sobre qual será a política econômica de Bolsonaro, apesar de ele dizer que Paulo Guedes (economista de linha liberal) será a esposa que vai cuidar das finanças da casa durante seu governo”, observa Buccini.
Estratégia é encurtar prazos e correr menos risco
Nas estratégias de investimento, a Rio Bravo está optando por encurtar os prazos para não correr muitos riscos. A casa ainda tem papéis longos de renda fixa, que têm prêmios altos, mas se o cenário piorar essas taxas ainda podem subir mais. “Por isso estamos reduzindo essas apostas mais longas, para reduzir o risco da eleição, que se tornará mais claro nos próximos meses”, explica. Ele diz que a estratégia era começar a reduzir o risco agora, mas o mercado foi surpreendido pela piora em maio e junho, em grande parte pela greve dos caminhoneiros. “Houve uma antecipação do cenário em maio e junho com greve.”
Bolsa, sem motivos para subir
Para a bolsa, Buccini não vê fatores que favoreçam a alta. A atividade econômica segue ruim, melhorando muito devagar, e com efeitos mais permanentes da greve dos caminhoneiros do que a inflação. Há ainda a mudança de patamar do dólar, que pode levar o Banco Central a subir mais os juros para controlar a inflação no ano que vem. “Não vejo por que a bolsa subiria, a não ser talvez a eleição de um candidato que agrade os mercados”, diz.
Dólar, sem fuga de capitais
Sobre o dólar, o economista acredita que há um piso que impede a moeda de cair que é o próprio mercado internacional. Já para cima, não há limite. Ele observa que muita gente no mercado tem dificuldade em assimilar que o dólar mudou de patamar, e que houve uma desvalorização relevante do real. Apesar disso, Buccini chama a atenção para o fato de não estarem ocorrendo saídas fortes de divisas do país. “Em junho, o saldo cambial foi ruim no começo, quando o dólar bateu mais de R$ 3,90 e o Ilan (Golfajn, presidente do BC) deu entrevistas falando que o BC ia atuar”, lembra. De lá para cá, o fluxo melhorou e junho fechou com entrada líquida de dólares, tanto no segmento comercial, da balança comercial, quanto dos investimentos financeiros. “Por isso o BC também não ofereceu dólares para o mercado, apenas hedge, via contratos de swap cambial, e fez isso só uma vez no mês, com os leilões de linhas”, explica.
Dólar ajuda exportadores, mas não muito
Já o dólar tende a ajudar os exportadores brasileiros, que receberão mais reais em suas vendas. Mas o impacto será diferenciado, explica Buccini. Os mais beneficiados devem ser os produtores agrícolas até pela guerra comercial entre China e Estados Unidos. Com a China elevando tarifas de importação de soja americana, o produto brasileiro acaba sendo beneficiado. Já no caso dos manufaturados, o impacto não é tão direto. “Nosso maior comprador de carros é a Argentina, que passa por um período difícil, de juros altos e um peso mais desvalorizado que o real, que torna nosso produto mais caro”, lembra.
No caso da celulose, por sua vez, o impacto é positivo, pois os preços do produto no exterior se mantêm e o dólar mais alto beneficia as vendas. “E o dólar subiu contra moedas do mundo inteiro, então o impacto final sobre o comércio vai depender do câmbio ajustado de cada país”, diz. De qualquer maneira, Buccini acredita que o dólar mais alto vai ajudar com uma balança comercial mais forte, especialmente por conta de commodities.
Por Arena do Pavini