Por Claudia Violante
SÃO PAULO (Reuters) - A sinalização da diretoria do Banco Central sobre a política de juros num prazo mais longo levantou críticas em parte do mercado financeiro sobre a comunicação da autoridade monetária perto do fim do mais longo ciclo de redução da Selic, bem como o fato de não ter preparado antes o terreno para o provável corte em maio.
"Nem mesmo o mais fervoroso defensor de um ciclo de cortes esperava uma decisão tão 'dovish' do Copom", avaliaram os economistas do banco Haitong, Jankiel Santos e Flávio Serrano, em comentário sobre a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) nesta semana.
Na quarta-feira, o BC cortou a taxa básica de juros em 0,25 ponto percentual, levando-a à nova mínima histórica de 6,5 por cento ao ano, e foi bastante enfático ao dizer que fará mais uma redução da Selic em maio antes de encerrar o ciclo de afrouxamento monetário. E foi mais longe, ao dizer que, no encontro de junho, não vai mexer na Selic.
Apenas fez a ponderação usual de que, se seu cenário básico não se confirmar, essa indicação será alterada.
"O BC nunca tinha dado antes uma previsão tão de médio prazo, ninguém esperava esse tipo de sinalização", disse a economista do Banco Santander (SA:SANB11) Tatiana Pinheiro, ao lembrar que são quase três meses que separam a decisão da véspera com o desfecho do encontro de junho.
O movimento do BC surpreendeu os investidores, que previam que o corte de agora seria o último do atual ciclo de afrouxamento, iniciado em outubro de 2016 e que já somou 12 reduções. Os questionamentos sobre a comunicação do BC sugiram após a autoridade monetária ter mudado sua orientação entre fevereiro e agora.
Na reunião de fevereiro, o Copom também adotou tom enfático ao dizer que via "como mais adequada a interrupção do processo de flexibilização monetária", referindo-se à reunião de março. O BC havia chegado para aquele encontro tendo como informação o índice de inflação de dezembro surpreendendo para cima das projeções.
O comunicado não chegou a pegar o mercado de surpresa e, no dia seguinte, os DIs mantiveram as mesmas apostas, de cerca de 30 por cento, para corte de 0,25 ponto percentual em março. Neste mesmo dia, no entanto, foi divulgado o IPCA bem abaixo do esperado, que começou a pavimentar a trilha de preços benigna que fez com que o BC mudasse sua orientação.
No começo deste mês, depois que o IPCA de fevereiro também surpreendeu ao registrar o menor nível em 18 anos, o presidente do BC, Ilan Goldfajn, reconheceu que os índices inflacionários benignos surpreenderam a própria autoridade monetária, direcionando de vez as apostas para nova redução no encontro de março.
Para a maior parte do mercado, no entanto, o fim do ciclo de cortes teria sido nesta semana. A curva a termo precificava na quarta-feira, antes da decisão do Copom, 20 por cento de chances de novo corte no encontro seguinte. Mas, agora, saltaram para cerca de 80 por cento.
Pesquisa da Reuters com economistas antes do Copom de março indicou que a maioria previa que os juros seriam cortados para 6,50 por cento neste mês e que esse seria o último movimento desse ciclo. Mas o levantamento já havia captado que, mesmo que ainda de forma contida, já havia quem apostasse em nova redução da Selic em maio.
Para o diretor de Tesouraria de um grande banco estrangeiro, a sinalização de mais uma queda no próximo encontro foi "completamente desnecessária". "(O BC) mudou radicalmente a comunicação sem nenhuma razão aparente", acrescentou ao lembrar que ainda persistem o risco fiscal e a ausência de reformas estruturais no país, que podem afetar o desempenho econômico.
Na avaliação do economista do Banco UBS Fabio Ramos, essa indicação sobre reuniões futuras pode ser uma forma de o BC sinalizar o ajuste fino do afrouxamento monetário.
"O mercado acreditava que havia espaço para mais corte, mas reproduzia a interpretação do que o BC ia fazer", disse ao explicar que a curva de juros precificava o corte de março como sendo o último, uma vez que o BC não deu indicação contrária. "Agora, falando dois encontros à frente, ele quer dizer que não vai continuar cortando."
(Edição de Patrícia Duarte)