Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - O presidente Jair Bolsonaro defendeu nesta segunda-feira que os dados de desmatamento coletados pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) não podem ser divulgados sem terem antes passado pelos ministros da área e até por ele mesmo, porque podem prejudicar o país em negociações internacionais.
Ao ser mais uma vez questionado sobre sua fala na sexta-feira, quando afirmou que os dados mais recentes --que apontaram um crescimento recorde do desmatamento da Amazônia nas primeiras semanas de julho-- eram mentirosos, Bolsonaro disse que está acostumado com "hierarquia e disciplina" e que não pode "alguém lá na ponta" decidir pela divulgação. O presidente alegou que pode haver equívocos na coleta dos dados e isso prejudica o país.
"Nesse caso, como divulgou, há um enorme estrago para o Brasil. A questão ambiental o mundo todo leva em conta. Outros países que estamos negociando a questão do Mercosul, ou até acordos bilaterais, nos dificulta a divulgação desses dados. Então temos que ter responsabilidade", alegou.
Uma das cláusulas do acordo Mercosul-União Europeia incluiu a necessidade dos países cumprirem as normas do acordo de Paris contra o aquecimento global e tem regras sobre o combate ao desmatamento. Há, entre os europeus, uma clara desconfiança em relação às políticas ambientais do governo Bolsonaro.
"O chefe do Inpe vai ser ouvido sim pelos ministros. Vamos conversar com ele porque isso não pode continuar acontecendo. É como um sargento aqui, um cabo, passar para frente uma notícia sem checar com um capitão, coronel ou brigadeiro, não está certo isso", defendeu o presidente.
Bolsonaro afirmou que as informações sobre desmatamento podem ser divulgadas, mas "tem que passar pelas autoridades".
"Eu não posso ser surpreendido com uma informação tão importante como essa, eu não posso ser pego de calças curtas por aí. As informações têm que chegar ao nosso conhecimento de modo que possamos tomar decisões precisas em cima das informações e não ser surpreendido", afirmou.
Bolsonaro voltou a classificar os dados mais recentes do Inpe, que apontaram uma área desmatada de mais de mil quilômetros quadrados nas duas primeiras semanas de julho, de "exagerados".
Em nota, o ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes, afirmou que compartilha da "estranheza" manifestada por Bolsonaro com os dados e chamou o presidente do Inpe, Ricardo Galvão, a Brasília para "esclarecimentos e orientações".
Pontes também disse que a contestação dos dados, feita por Bolsonaro em entrevista a jornalistas de veículos estrangeiros, é normal e saudável. Ele disse que o ministério pediu ao Inpe explicações sobre os números e a metodologia aplicada.
A nota acrescenta ainda que o ministério está solicitando ao Inpe um relatório técnico completo com os resultados da série histórica dos últimos 24 meses, "assim como informações detalhadas sobre os dados brutos, a metodologia aplicada e quaisquer alterações significativas desses fatores no período".
Na nota, Pontes também afirma ter convidado Galvão para uma conversa por ter entendido que a resposta dada pelo presidente do Inpe a Bolsonaro não correspondeu "ao tratamento esperado na relação profissional, especialmente com o chefe do Executivo do país". Galvão classificou a atitude de Bolsonaro, que também disse que o presidente do Inpe poderia estar a serviço de ONGs, de "pusilânime e covarde".
"Em consequência, o diretor do Inpe foi convidado pelo MCTIC para esclarecimentos e orientações. A partir dessa reunião serão definidos novos passos", afirmou Pontes na nota.