Por Geoffrey Smith
Investing.com -- O que acontece quando uma necessidade econômica se torna um artigo de luxo?
A Europa está desesperada tentando fazer um quadrado caber num círculo: a fim de pressionar Vladimir Putin no sentido de encerrar seu ataque à Ucrânia, o continente precisa deixar de enviar dinheiro em troca de petróleo e gás importados. Mas se as importações de petróleo e gás pararem, a economia europeia desmoronará.
Os governos de toda a Europa estão lutando para encontrar formas de amenizar o suplício dos consumidores, que enfrentam custos recordes para seus veículos, e com boas razões. Os preços elevados dos combustíveis podem trazer instabilidade social com rapidez, como os bloqueios das refinarias no Reino Unido e o movimento dos “Coletes Amarelos" na França provaram nos últimos anos. Dada a emergência extrema enfrentada pela Europa neste momento, ela não se pode dar ao luxo de distrações desse tipo.
Na semana passada, os preços da gasolina na Europa variaram de € 1,46 por litro na Polônia a € 2,26 por litro na Alemanha. Isso equivale a uma faixa de US$ 7,36 a US$ 11,38 por galão. Qualquer motorista dos EUA irritado com o preço recorde da gasolina, a US$ 4,25 por galão, pode ter de lembrar que, durante os estágios iniciais da pandemia, quando os preços do petróleo caíram brevemente abaixo de zero, os preços da gasolina na Alemanha atingiram a mínima de US$ 5,90 por galão.
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Há uma explicação, de uma só palavra, para a diferença: impostos. Os impostos podem representar até 75% do que um motorista europeu paga para encher o tanque, resultado de anos de políticas públicas que buscaram incentivar a eficiência dos combustíveis e o uso do transporte público. Isso significa que ainda há muito espaço para que a ação do governo faça a diferença.
Consequentemente, uma série de cortes nos tributos dos combustíveis está a caminho. A França disse que irá reduzir em € 0,15 por litro a tributação sobre a gasolina nos próximos quatro meses. Na quarta-feira, espera-se que Rishi Sunak, Chanceler do Tesouro britânico, anuncie um corte semelhante, com prazo de validade, de 5 pence por litro, enquanto o Primeiro-Ministro da Itália - e ex-Presidente do Banco Central Europeu - Mario Draghi pretende reduzir os impostos sobre os combustíveis em € 0,25 por litro durante um mês.
Os cortes franceses e italianos por si são mais altos do que o total de impostos sobre gasolina geralmente aplicado por Maryland e Geórgia, dois estados que suspenderam a cobrança das tarifas enquanto os preços estiverem tão elevados. É a mesma situação de outros estados, como Nova York e Illinois, que também estão considerando medidas semelhantes.
Na Alemanha, o Ministro das Finanças, Christian Lindner, propôs um sistema de descontos pelo qual o governo reembolsaria os revendedores pelo corte dos preços nas bombas. Seus parceiros de coligação – os Sociais-Democratas e os Verdes, da esquerda, que tendem a dirigir menos SUVs beberrões – não gostam da ideia, mas ainda precisam apresentar algo melhor.
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Os cortes fiscais temporários podem fazer sentido: os preços dos combustíveis tendem a não se manter tão amargamente altos porque as pessoas cortam o consumo, fazendo com que os preços voltem a cair. Mas estes também são cronogramas políticos. O corte francês vencerá, convenientemente, após a eleição presidencial de abril, enquanto as medidas da Sunak tornam-se ainda mais necessárias devido ao fato de que outras tarifas energéticas domiciliares, além de alguns impostos relacionados à renda, devem aumentar em abril. Alguma coisa precisa ceder.
De maneira mais preocupante, o risco – como sempre – é que as medidas que a princípio seriam temporárias se tornem permanentes devido à dificuldade de revertê-las. Neste momento, a cada dia que passa, a noção de que a guerra na Ucrânia pode chegar a um fim rápido e que as sanções contra o principal exportador de petróleo, a Rússia, podem ser suspensas, parece cada vez mais fantasiosa.
Na verdade, está acontecendo o contrário: Os líderes da UE estão dispostos a discutir o endurecimento das suas sanções à Rússia durante uma reunião em Bruxelas, na quinta-feira, com um número crescente desejando uma proibição absoluta de compras de petróleo russo, que garante um fluxo contínuo de divisas para o Kremlin (O Presidente dos EUA, Joe Biden, também estará na cidade para reforçar sua determinação, em oposição à atual oposição da Alemanha e da Hungria).
O Vice-Primeiro-Ministro e Ministro da Energia da Rússia, Alexander Novak, tentou se antecipar a uma medida nesse sentido na segunda-feira, ao afirmar que essa ação poderia forçar os preços do petróleo a até US$ 300 por barril. A História, no entanto, sugere que os importadores ficarão sem dinheiro para comprá-lo bem antes desse ponto, desencadeando uma acentuada redução global e uma reversão igualmente acentuada dos preços.
O chefe de pesquisa de commodities do Bank of America (NYSE:BAC) (SA:BOAC34), Francisco Blanch, disse à Bloomberg, na segunda-feira, que vê os preços atingirem apenas metade desse nível, mas admite que a guerra adicionou de US$ 25 a US$ 30 a todos os seus cenários de previsão.
O suplício é verdadeiro. As únicas perguntas são: será que o Ocidente acha que vale a pena, e quanto tempo isso pode demorar?