Por Ethan Wang e Ryan Woo e Lisandra Paraguassu
PEQUIM/BRASÍLIA (Reuters) - O Brasil restabeleceu seus laços diplomáticos com a China, seu maior parceiro comercial, com uma visita de Estado na sexta-feira, na qual os países concordaram em aumentar os investimentos e a cooperação em tecnologia e desenvolvimento sustentável, ao mesmo tempo em que pediram negociações de paz na Ucrânia.
O presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva e vários de seus ministros assinaram os acordos com o presidente Xi Jinping e outras autoridades chinesas em Pequim.
Xi disse que a China fez das relações com o Brasil uma prioridade diplomática e que os dois países devem aprofundar a cooperação prática em setores como agricultura, energia e construção de infraestrutura, informou a emissora estatal CCTV.
"Temos uma relação extraordinária com a China, uma relação que a cada dia se torna mais aguda e forte", disse Lula antes de seu encontro com Xi.
Brasil e China precisam trabalhar juntos para que a relação não seja apenas de interesse comercial, acrescentou Lula.
Os dois líderes concordaram que o diálogo e a negociação são a "única maneira viável" de resolver a guerra na Ucrânia, segundo um comunicado conjunto. Eles pediram a outros países que desempenhem um papel construtivo na promoção de um acordo político entre a Ucrânia e a Rússia.
Foi uma menção ainda sem detalhes ao tema da guerra ante às pretensões do Brasil de propor a criação de um grupo de países para negociar o fim do conflito, com a participação de Pequim.
Antes da viagem, Lula disse que gostaria de voltar da Ásia anunciando a criação do mecanismo -- o Brasil vai receber o chanceler russo Sergei Lavrov na semana.
A visita de Lula ocorre após quatro anos de relações difíceis com a China sob seu antecessor de extrema-direita, Jair Bolsonaro, quando o comércio continuou inalterado, mas o investimento de empresas chinesas caiu.
Em um novo foco para as relações bilaterais, os dois países decidiram fortalecer a cooperação em proteção ambiental e enfrentamento das mudanças climáticas, e vão criar um comitê para isso em suas negociações de parceria estratégica.
Eles concordaram em atuar em conjunto com os países em desenvolvimento em fóruns internacionais sobre questões climáticas, ao mesmo tempo em que cobraram maior financiamento para projetos de desenvolvimento sustentável.
A China se comprometeu a apoiar a produção de energia limpa e hidrogênio verde no Brasil, mas não houve anúncio sobre um fundo bilateral de investimento verde que o Brasil propôs, para financiar e subsidiar o desenvolvimento de energia renovável.
A China e o Brasil concordaram ainda em criar um grupo de trabalho para buscar a cooperação em semicondutores, fortalecendo os laços com Pequim em áreas de tecnologia sensível.
A tecnologia da informação tem sido um ponto crítico nas relações da China com os Estados Unidos e países europeus que, em alguns casos, proibiram produtos chineses por razões de segurança.
O Brasil, porém, tem interesse em atrair investimentos chineses nessas áreas, apesar da pressão do governo dos Estados Unidos nos últimos anos desestimulando o uso de equipamentos móveis de quinta geração da gigante de tecnologia Huawei Technologies.
Antes da visita, o assessor especial de Lula, Celso Amorim, disse à Reuters que o Brasil está aberto a uma eventual instalação de uma fábrica chinesa de semicondutores no país e que Brasília tem interesse em desenvolver a tecnologia em cooperação com a China.
Na quinta-feira, Lula visitou o centro de pesquisa da Huawei em Xangai e foi informado sobre sua tecnologia, experimentando também seu headset de realidade virtual.
Lula disse em declarações públicas em Pequim que sua visita à Huawei foi "uma demonstração de que queremos dizer ao mundo que não temos preconceitos em nossas relações com os chineses".
"Ninguém vai proibir o Brasil de melhorar sua relação com a China", acrescentou.
A China ultrapassou os Estados Unidos como principal parceiro comercial do Brasil em 2009 e é um importante mercado para soja, minério de ferro e petróleo brasileiros. O Brasil é hoje o maior receptor de investimentos chineses na América Latina, impulsionados pelos gastos com linhas de transmissão de energia elétrica em alta tensão e produção de petróleo.
Na sexta-feira, os dois países concordaram em incentivar suas empresas a investir em cada país em infraestrutura, transição energética, logística, mineração, agricultura e indústrias de alta tecnologia.
O ministro da Fazenda do Brasil, Fernando Haddad, disse que os dois estão aprofundando estudos para realizar comércio em moedas locais, lembrando que a ideia de diminuir a dependência do dólar já está na agenda do grupo dos Brics, formado pelos principais países emergentes.
Durante o primeiro dia da visita, em Xangai, Lula participou da cerimônia de posse da ex-presidente Dilma Rousseff no comando do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o banco dos Brics, e também defendeu um comércio global em moedas locais.
Lula deve partir da China na manhã de sábado na Ásia, e faz parada nos Emirados Árabes Unidos antes de chegar a Brasília. O mandatário brasileiro convidou o chinês Xi Jinping a visitar o Brasil em 2024.
(Reportagem de Ethan Wang, Judy Hua e Ryan Woo em Pequim, Meg Shen em Hong Kong, Lisandra Paraguassu e Anthohy Boadle em Brasília)