Por Lucila Sigal
CIGUEÑA/ROSÁRIO, Argentina (Reuters) - Na localidade argentina de Cigueña, o fazendeiro Andrés Betiger luta para evitar que sua fazenda afunde em meio à pior seca do país em 60 anos, que atinge as lavouras de soja, milho e trigo e afeta os rebanhos bovinos.
Para conseguir água, Betiger percorre 52 quilômetros com um trator frágil que quebra com frequência, um reflexo de como o clima árido desde o ano passado tem pesado sobre os agricultores, que atrasaram o plantio e até abandonaram lavouras.
"As coisas estão ruins, não nos sobra, não temos margem para parar as coisas por quatro ou cinco dias. Estamos praticamente transportando água todos os dias para os animais beberem", disse Betiger, de 41 anos, que pensa em declarar falência.
"Aflige, assusta", acrescentou. "Já está se tornando financeiramente e fisicamente insustentável."
A seca na Argentina tem grandes repercussões nos mercados globais de alimentos, forçando os agricultores a reduzirem as perspectivas de colheita e prejudicando a oferta de grãos do maior exportador mundial de óleo e farelo de soja, terceiro maior de milho e um importante fornecedor de trigo e carne bovina.
Isso, por sua vez, afeta a capacidade da Argentina de acumular reservas de dólares tão necessárias, ameaçando descarrilar uma frágil recuperação econômica e deixar o governo incapaz de cumprir os pagamentos da dívida em meio a uma inflação em espiral e um profundo déficit fiscal.
"Na Argentina, esta situação de seca criou uma tempestade perfeita", disse Cristian Russo, chefe de estimativas agrícolas da bolsa de grãos de Rosário, que reduziu sua estimativa de colheita de soja neste mês para o que seria o menor volume em 14 anos.
O impacto da seca, ligada ao terceiro padrão climático consecutivo de La Niña, ainda pode piorar, acrescentou ele, o que pode levar a novos cortes nas perspectivas de soja e milho. A colheita do trigo já foi reduzida pela metade pela seca.
“Há mais razões para ser pessimista e pensar que os números vão continuar caindo”, disse Russo, acrescentando que em termos de safra está se configurando como a pior em 20 anos.
"Vai ser uma crise como nunca vimos. Isso implica que muitos produtores vão à falência."
O governo lançou algumas medidas de isenção de impostos para os agricultores, mas, com os cofres do Estado esgotados, tem poder de fogo limitado. Os agricultores com quem a Reuters conversou disseram que as medidas são apenas "remendos".
Na região visitada pela Reuters, o impacto da seca foi forte.
A lagoa El Bonete, na cidade de Vera, desapareceu completamente, assim como animais que viviam no local. Uma cidade enfrentou mais de um mês sem água da rede.
O impacto econômico da seca para os produtores pode ser de cerca de 10,5 bilhões de dólares, afirmou Julio Calzada, chefe de pesquisa econômica da bolsa de Rosário, principalmente devido à queda nas exportações.
"A Argentina perderá cerca de 8 bilhões de dólares em exportações", disse ele, acrescentando que isso representaria uma perda de cerca de 3,5 bilhões de dólares em termos de receita do governo, prejudicando os já esgotados níveis de reservas cambiais.
"A economia nacional depende da renda das áreas rurais", disse ele. "Isso (a seca) é o principal problema para a economia."
(Reportagem adicional de Maximilian Heath)