Por Bernardo Caram
BRASÍLIA (Reuters) - O Banco Central subiu a Selic em 1,0 ponto percentual nesta quarta-feira, a 11,75% ao ano, colocando em prática o plano de reduzir a intensidade do ciclo de aperto monetário adotado para conter a inflação, e indicou ajuste da mesma magnitude na próxima reunião apesar de destacar a incerteza sobre o atual cenário.
O BC ressaltou que o panorama externo se deteriorou substancialmente, citando o conflito entre Rússia e Ucrânia, e disse que a atuação do Copom tem como objetivo combater os impactos secundários do choque de oferta de algumas commodities, que se manifestam com defasagem na inflação.
"O Copom avalia que o momento exige serenidade para avaliação da extensão e duração dos atuais choques. Caso esses se provem mais persistentes ou maiores que o antecipado, o Comitê estará pronto para ajustar o tamanho do ciclo de aperto monetário", afirmou o comunicado do Comitê de Política Monetária (Copom) da autarquia.
A magnitude da elevação veio em linha com a expectativa do mercado, de acordo com a mediana da pesquisa Reuters.
Com a decisão, o Copom completa um ano de aperto monetário e a Selic alcança um patamar 9,75 pontos acima da mínima histórica de 2%, nível atingido em meio à pandemia de Covid-19 e que vigorou até março de 2021, numa tentativa de recolocar a inflação nos trilhos.
Esta foi a nona alta consecutiva da Selic, que agora atinge o maior patamar desde abril de 2017, quando estava em 12,25% ao ano.
O Bacen ressaltou que diante de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas, é apropriado que o ciclo de aperto continue avançando significativamente em território "ainda mais" contracionista.
Na avaliação do economista-chefe do banco MUFG, Carlos Pedroso, o BC deixou a porta aberta para ampliar o aperto monetário.
"O que me chamou atenção é que ele coloca a extensão do ciclo, e não exatamente aperto do ciclo, como opção. Para mim, ele está descartando altas maiores de juros", disse.
No comunicado da reunião anterior, em fevereiro, o BC havia afirmado que via como adequada a redução no ritmo de ajuste da taxa básica de juros, após aumentar a Selic em 1,5 ponto percentual por três vezes consecutivas.
Nas últimas semanas, foi ampliada a incerteza no mercado sobre a intensidade do movimento a ser adotado pelo BC diante dos impactos gerados pelo conflito na Ucrânia, com pressão inflacionária sobre alimentos e alta na cotação do petróleo, o que levou a um forte reajuste nos preços de combustíveis pela Petrobras (SA:PETR4).
Em meio a esse cenário, a inflação no país vem indicando persistência em patamar elevado. O IPCA de fevereiro teve a maior alta em sete anos, com taxa em 12 meses acima de 10,5%.
PIORA DE PROJEÇÕES
No comunicado desta quarta-feira, o BC avaliou que o conflito entre Rússia e Ucrânia levou a um aperto significativo das condições financeiras e aumento da incerteza em torno do cenário econômico mundial.
"Em particular, o choque de oferta decorrente do conflito tem o potencial de exacerbar as pressões inflacionárias que já vinham se acumulando tanto em economias emergentes quanto avançadas", disse.
A autoridade monetária piorou suas projeções para a inflação em seu cenário de referência, passando a ver alta do IPCA de 7,1% em 2022 e de 3,4% em 2023, acima dos percentuais de 5,4% e 3,2% calculados no último Copom e acima das metas centrais de 3,5% e 3,25%, respectivamente, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual.
O Bacen ressaltou, contudo, que diante do cenário recente de volatilidade, o Comitê decidiu adotar também um cenário alternativo, "considerado de maior probabilidade", que espera que o preço do petróleo siga aproximadamente a curva futura de mercado até o fim de 2022, terminando o ano em 100 dólares o barril e passando a aumentar 2% ao ano a partir de janeiro de 2023.
“Nesse cenário, as projeções de inflação do Copom situam-se em 6,3% para 2022 e 3,1% para 2023”, disse.
O novo panorama econômico mundial levou o mercado a também revisar suas projeções. Segundo as estimativas captadas pelo BC no boletim Focus, a expectativa para a inflação em 2022 saltou de 5,65% no levantamento da semana passada para 6,45% no boletim desta semana, distanciando-se ainda mais da meta. Para 2023, a previsão para o IPCA passou de 3,51% para 3,70%.
Na reunião de fevereiro, o BC havia passado a dizer que o horizonte relevante da política monetária incluía 2022 e, “em maior grau”, o ano de 2023. Agora, o Copom colocou ainda mais força no foco ao próximo ano, ao afirmar que o horizonte relevante inclui 2022 e "principalmente" 2023.
O conflito entre Rússia e Ucrânia intensificou as discussões no governo e no Congresso sobre medidas para atenuar a alta dos preços de combustíveis. Até o momento, foi aprovado corte de tributos sobre esses insumos, mas também está em estudo uma proposta para liberar subsídios nessa área.
No comunicado, o BC disse que a incerteza em relação ao arcabouço fiscal mantém elevado o risco de desancoragem das expectativas.
Em relação à atividade, o BC disse que o PIB do quarto trimestre de 2021 apontou ritmo de atividade acima do esperado. O país cresceu 0,5% no quarto trimestre sobre os três meses anteriores, segundo o IBGE.