Por Angelo Amante
ROMA (Reuters) - Clãs da máfia italiana estão aproveitando a pandemia de coronavírus para comprar favores de famílias pobres à beira da ruína financeira, disseram procuradores e autoridades, e oferecendo empréstimos e comida no que é visto como uma tática de recrutamento de séculos de existência.
Depois de décadas fazendo campanha para limitar a influência da máfia em seus bastiões tradicionais no sul da Itália, autoridades e instituições de caridade dizem que a pandemia criou novas oportunidades para o crime organizado reconquistar a lealdade das pessoas.
"Sabemos que 'famílias de amigos', todos eles agiotas, estão se dispondo a dar dinheiro às pessoas em dificuldade", disse Amedeo Scaramella, usando um eufemismo pelo qual a quadrilha de criminosos da Camorra é conhecida.
Scaramella, advogado de formação, comanda a Fundação San Giuseppe Moscato, grupo católico de Nápoles que combate a agiotagem, em parte garantindo empréstimos bancários a pessoas normalmente consideradas como riscos de crédito.
Ele disse à Reuters que os agiotas começam oferecendo empréstimos com taxas que competem com os bancos e mais tarde acuam as vítimas elevando-as a até 300%.
Federico Cafiero De Raho, procurador nacional antimáfia da Itália, disse que seus agentes perceberam atividades suspeitas em Nápoles, entre elas clãs da Camorra distribuindo comida de graça a famílias que o isolamento nacional deixou com pouco dinheiro.
"Temos provas", disse De Raho à Reuters, sem dar detalhes porque as investigações estão em andamento.
A experiência leva a crer que a máfia pode buscar ressarcimentos de tamanha generosidade no futuro pedindo aos beneficiados que realizem atividades como transportar drogas, disse.
"A Camorra sabe que esta é a hora certa de investir."
Antonio Lucidi disse que a instituição de caridade de Nápoles em que trabalha, "L'Altra Napoli" (A Outra Nápoles), arrecadou mais de 150 mil euros para levar alimento a famílias necessitadas para que não tenham que aceitá-la da máfia durante o isolamento.
"Quando a fome se torna uma questão real, é difícil resistir à tentação", disse ele à Reuters.
O governo italiano prometeu 400 milhões de euros de amparo social aos pobres, incluindo a emissão de cupons para aqueles que não têm como ir às compras.