Javier Albisu.
Paris, 13 ago (EFE).- Enquanto os poderes públicos franceses
buscam legislar temas polêmicos como o uso do burca e a poligamia, a
França inicia o mês do Ramadã contando com marcas que veem no
negócio "halal" (permitido para consumo) um lucrativo mercado com 5
milhões de consumidores potenciais.
Uma comissão de teólogos da Grande Mesquita de Paris estipulou
que o Ramadã comece hoje na França. Por isso, ao longo dos próximos
30 dias, a vida de cidades com comunidades islâmicas significativas
- como Paris, Marselha e Toulouse - será ligeiramente alterada.
O mês sagrado em que os muçulmanos fazem jejum durante a luz do
dia será este ano repleto de polêmicas sobre a eventual proibição da
burca em locais públicos e sobre a possibilidade de a poligamia,
aceita pelo Corão, possa provocar a perda da nacionalidade francesa,
como deseja o ministro do Interior, Brice Hortefeux.
No entanto, enquanto as iniciativas legislativas do Executivo são
criticadas pelos partidos de esquerda porque dizem que levam a uma
"rotulação" do Islã, a prática do Ramadã parece estar cada vez mais
difundida na França.
Segundo um estudo do instituto de pesquisas Ifop, 70% dos
muçulmanos respeitaram o jejum em 2009, um número estável em relação
a 2001 e maior se comparado ao final do século XX, tendência que
aponta o mercado muçulmano como um rentável segmento para as grandes
redes de alimentos.
Enquanto a Prefeitura de Roubaix (norte) vai se retirando de uma
batalha legal para impedir que prosperem os estabelecimentos de
fast-food "halal" da marca Quick, aos quais considera
"discriminatórios", o negócio de alimentos aceitos pela lei islâmica
parece abençoados.
De acordo com o mesmo instituto, quase 60% das pessoas de origem
muçulmana dizem consumir sistematicamente produtos "halal", um
mercado avaliado na França em 5,5 mil milhões de euros - mais do
dobro do que representam os 2,6 bilhões dos produtos biológicos - e
cujo crescimento anual se situa entre 15% e 20%.
As grandes empresas de distribuição de alimentos como Carrefour e
Casino não quiseram perder essa oportunidade e criaram marcas como
Wassila e Sabrina para comercializar um tipo de produtos que
representa 5% do volume de negócios do ano passado para a Nestlé, o
maior grupo de alimentação do mundo.
Outras grandes empresas do ramo como Alcampo e Lidl também
levaram até suas estantes salsichas merguez e almôndegas kafta com o
rótulo "halal", para concorrer com os açougues e lojas de bairro -
frequentemente regidas por muçulmanos - que há décadas vendem, por
exemplo, carne de cordeiro sem aditivos de origem suína como os
E-120, E-203 e E-288.
Mas o consumidor muçulmano não é atrativo somente para as
empresas de alimentação, mas setores como o de telefonia e turismo
também abriram brechas.
Assim, a marca finlandesa de telefonia Nokia lançará novos
aplicativos durante o mês sagrado, como os horários de orações e os
textos do Corão em mp3, uma bateria de serviços relacionados ao
ritual muçulmano similares aos da oferta do iPhone da Apple.
Outro dos setores que estuda abrir estabelecimentos na Europa
dedicados ao público muçulmano é o de hotelaria.
Suprimir as redes "para adultos" da propaganda televisiva,
eliminar os produtos com carne de porco das cozinhas e o álcool do
minibar, fornecer um Corão e um tapete de orações aos clientes são
alguns dos requisitos para obter o selo "halal".
A empresa Brussels Entreprises Commerce and Industry (BECI), a
partir de 2011, outorgará a alguns hotéis um certificado de
qualidade de acordo com a lei islâmica, explica o consultor da
companhia Bruno Bernard.
Segundo ele, tudo depois será "halal", uma oferta para que os
muçulmanos possam desfrutar de pequenos oásis condicionados para sua
fé, da mesma forma que em alguns países islâmicos os turistas se
refugiam nos hotéis para tomar bebidas alcóolicas.
Talvez os hotéis "halal" sejam uma boa opção para os quase 5
milhões que respeitarão o mês do Ramadã na França, um período que
será mais quente neste ano por coincidir com o verão no Hemisfério
Norte e que terminará no dia 10 de setembro. EFE