Por Paula Arend Laier
SÃO PAULO (Reuters) - O mercado acionário brasileiro embarca para o segundo semestre em clima desfavorável, pontuado pela deterioração da economia e pelo aumento da incerteza política, enquanto dúvidas quanto à alta taxa de juros nos Estados Unidos adicionam volatilidade.
No ano até o dia 22 de junho, o principal índice da Bovespa acumulou alta de 7,7 por cento, em grande parte devido à depreciação do real frente ao dólar. Quando medido na moeda norte-americana, o Ibovespa em 2015 caiu 7,3 por cento.
Para o estrategista do BTG Pactual (SA:BBTG11) Carlos Sequeira não há razões para se animar para a segunda metade do ano.
"Os indicadores econômicos ainda vão piorar e, no cenário político, há um elemento novo, difícil de mensurar, que são os desdobramentos da nova fase da Lava Jato".
A Polícia Federal prendeu na sexta-feira os presidentes da Odebrecht e da Andrade Gutierrez, as maiores construtoras do Brasil, entre outros executivos, acusados de envolvimento no esquema de corrupção na Petrobras (SA:PETR4).
Para o gerente de pesquisa da BB (SA:BBAS3) Investimentos, Nataniel Cezimbra, no atual cenário a baixa volatilidade da bolsa reflete o ambiente de investidores evitando assumir posições de compra ou venda. "O cenário ainda é desafiador", disse.
Em junho, o Ibovespa oscilou de 52.548 pontos a 54.351 pontos, considerando movimentos intradia. O giro financeiro médio diário ficou abaixo de 6,7 bilhões de reais, após média superior a 7 bilhões em abril e maio.
O economista Fabio Cardoso, da equipe do BB, diz que todas as variáveis apontam para estabilização na entrada de capital externo após forte entrada no primeiro semestre. No ano até o dia 19, o saldo ficou positivo em 21 bilhões de reais.
"Temos eventos importantes nos próximos seis meses e ainda há a questão do crescimento", disse Cardoso, prevendo que o Ibovespa deve oscilar na faixa de 50 mil a 54 mil pontos. "Os investidores posicionados também não tem muitos motivos para vender", avalia.
No plano externo, é quase consenso entre os profissionais do mercado que a primeira alta da taxa básica de juros pelo Federal Reserve em quase uma década será o principal evento do segundo semestre, com a maioria das apostas projetando início em setembro.
Para Sequeira, do BTG, qualquer mudança de perspectiva sobre a política monetária dos EUA afeta o real, o que acaba respingando em papéis de exportadoras na Bovespa, por exemplo. "E a volatilidade em torno disso deve continuar", estimou.
CRESCIMENTO
Para o sócio e diretor de análise da Leblon Equities, Marcelo Mesquita, as operações locais podem depender menos do cenário externo se forem adotadas medidas para restaurar a confiança dos agentes no crescimento econômico.
"É preciso reconquistar essa confiança no crescimento de longo prazo, com medidas concretas que levem o setor privado a aumentar investimentos", disse Mesquita, destacando que a visibilidade do crescimento "é baixíssima" e que é há uma incógnita sobre as condições políticas para que uma melhora aconteça de forma rápida e eficiente.
A última pesquisa Focus do Banco Central mostrou piora nas expectativas para o Produto Interno Bruto (PIB), com previsão de queda de 1,45 por cento em 2015 e de expansão de apenas 0,70 por cento em 2016.
A equipe de estratégia do JPMorgan comandada por Pedro Martins manteve recomendação "neutra" para o país em relatório desta semana sobre América Latina no segundo semestre.
O JP Morgan considerou positiva a vontade do governo de fazer os ajustes necessários, como contraponto ao fraco desempenho do PIB e riscos de execução fiscal e desvalorização do real. "Há uma íngreme ladeira para subir com as melhorias de curto prazo precisando se traduzir em crescimento de médio prazo, algo que segue evasivo."
OPORTUNIDADES
Nesse ambiente, papéis com bons fundamentos, baixa volatilidade e retorno estável, como setor financeiro (bancário e não-bancário), figuram entre os preferidos, em detrimento dos segmentos de consumo, imobiliário, siderurgia e mineração.
A exposição a uma taxa de câmbio mais depreciada também tem apelo entre analistas e estrategistas, principalmente por meio de ações de algumas exportadoras, como as de papel e celulose e de alimentos.
Há também perspectivas favoráveis para educação, apesar do ruído em torno do setor diante de incertezas ainda remanescentes após mudanças nos programas do governo de financiamento ao ensino, principalmente o Fies.
"É um setor que ainda encontra um ambiente favorável, entre outros fatores, porque têm uma demanda reprimida. Ao mesmo tempo, as empresas não devem deixar de ofertar o Fies. Apenas o acesso ficou mais restrito", disse o analista Mario Bernardes, da equipe do BB.
Para o sócio e gestor da estratégia de small caps na Victoire Brasil Investimentos, Werner Roger, o quadro negativo atual pode atrair o investidor com horizonte de longo prazo.
"Caso as medidas econômicas que machucam as empresas no curto prazo consigam reverter o atual quadro econômico em dois ou três anos, os frutos serão colhidos por aqueles que compram barato hoje e ganharão no futuro a reversão do mercado e com as empresa voltando a expandir seus negócios e resultados", disse.
Mas ele afirmou que a efetividade desse raciocínio depende de governo ser bem sucedido com as medidas em curso.