SÃO PAULO (Reuters) - Não é por ser vítima das circunstâncias que alguém recebe o Prêmio Nobel da Paz. A paquistanesa Malala Yousafzai aos 15 anos foi alvejada na cabeça por radicais do Taliban, que dominavam o Vale do Swat, onde vivia. Os tiros, que não a mataram, mas feriram também suas amigas, tinham o objetivo de calar uma adolescente sempre disposta a se manifestar sobre o direito à educação de meninas. Deu-se o contrário.
Malala foi capa e conteúdo de um frenesi midiático, que a alçou à condição de heroína pela equidade de gênero, sobretudo sobre o ensino transformador de vidas. Depois de acordar de um coma induzido, sobrevivendo com mente e corpo alertas para seu, agora, objetivo de vida, a garota recebeu prêmios, condecorações e ganhou, pelas mãos do documentarista Davis Guggenheim (de "Uma Verdade Inconveniente") uma cinebiografia, intitulada simplesmente "Malala".
Pela visão do cineasta, Malala é uma menina comum, porém vítima de uma missão, quase profética, instaurada por seu pai Ziauddin Yousafzai, um ativista educacional.
Não é por acaso que intitula a produção como "He Named Me Malala" ("Ele Me Deu o Nome de Malala", em português), quando evoca a jovem Malalai, uma adolescente que fez afegãos se insurgirem contra os ingleses no século 19. Belíssima história, no entanto, sem qualquer função além do folclore.
Porém, Malala sobrevive, e no meio das entrevistas que Guggenheim utiliza para o documentário, ela se mostra capaz de uma clemência (a seus perseguidores) e obstinação (diante de seu objetivo), que emociona.
Mudando de país, com problemas de adaptação nas escolas britânicas, a adolescente não é mais do que alguém que tem um propósito muito além de se envergonhar com perguntas sobre jogadores bonitos na TV.
Criada em um ambiente que estimula o conhecimento, o que o diretor capta sem qualquer estranheza, ainda utilizando como recurso a animação para o espectador entender seu passado, esta heroína considera sua existência convencional.
"Eu sou uma menina normal. Mas, se meus pais fossem conservadores e eu ainda vivesse em Swat, provavelmente já teria dois filhos", diz ao ser questionada sobre o que seria, caso fosse uma menina "normal", por uma repórter.
Mais do que um nome, Malala é uma demonstração eloquente de quanto os pais têm muito a ver com a formação dos filhos. Por sua vez, o documentário demonstra como se pode levar técnicas (uso de animação, enquadramentos, imagens de arquivo), fictícias ou não, para apresentar eficientemente uma determinada tese.
Mas a voz de Malala, esta que o Taliban não calou, é imensamente maior do que os desejos de Guggenheim, pois ela é um ídolo de que o mundo precisa neste momento.
(Por Rodrigo Zavala, do Cineweb)
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