Por Alexandre Caverni e Maria Carolina Marcello
SÃO PAULO/BRASÍLIA (Reuters) - Alvo constante de ataques do presidente Jair Bolsonaro (PL), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) esteve na mira do candidato à reeleição mais uma vez nesta quarta-feira, a apenas quatro dias do segundo turno das eleições, agora envolvendo a acusação feita por sua campanha de que há irregularidades na propaganda eleitoral no rádio
Atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas pesquisas para a votação de domingo, Bolsonaro acusou a corte eleitoral, sem apresentar provas, de agir a favor de seu adversário, e prometeu ir "às últimas consequências" para comprovar sua denúncia, apesar da recusa do TSE em aceitá-la.
"É difícil você disputar uma eleição acirrada e tendo um TSE parcial, um TSE que tem colaborado o tempo todo com tudo o que o PT ajuíza lá", afirmou Bolsonaro, em entrevista coletiva.
O presidente do TSE, Alexandre de Moraes, rejeitou a denúncia apresentada pela campanha de Bolsonaro, em uma dura decisão, por considerar que não há "indício mínimo de prova", e por identificar possível intuito de tumultuar as eleições.
Moraes também determinou a abertura de processo administrativo sobre eventual desvio de finalidade na utilização do fundo partidário para a contratação de auditorias para subsidiar o pedido, além de enviar o caso ao Supremo Tribunal Federal (STF), onde tramita inquérito que apura a existência de organização criminosa com forte atuação digital para atentar contra a democracia e o Estado de Direito no país.
Após ter sua denúncia negada, Bolsonaro avisou que lançará mão de todos os meios para recorrer de decisão. "Nosso jurídico com toda certeza deve entrar com recurso", disse o presidente em pronunciamento convocado às pressas no Palácio da Alvorada.
"Da nossa parte, nós iremos às últimas consequências, dentro das quatro linhas da Constituição, para fazer valer o que as nossas auditorias constataram."
A acusação sobre as supostas irregularidades nas inserções de rádio acontece num momento tenso para a campanha de Bolsonaro, pressionada pela repercussão da prisão, após resistência com tiros de fuzil e granadas de efeito moral do ex-deputado Roberto Jefferson, aliado do presidente, no último domingo. Na ação, Jefferson feriu dois agentes da Polícia Federal.
A suposta irregularidade levantada tem ganhado corpo na campanha do candidato à reeleição desde segunda-feira, quando a equipe de Bolsonaro apresentou uma denúncia, sem provas consideradas cabíveis pelo TSE, de que inúmeras rádios do país não estariam veiculando adequadamente as inserções eleitorais do presidente.
Na terça-feira, em reposta ao presidente do TSE, Alexandre de Moraes, que dera prazo de 24 horas para a apresentação de provas para embasar a denúncia, os advogados da campanha apresentaram apenas um recorte de poucas rádios dos Estados da Bahia e Pernambuco que estariam descumprindo a regra de veiculação isonômica das inserções entre os dois candidatos.
Em nota nesta quarta, a Associação de Empresas de Rádio e Televisão de Pernambuco (Asserpe) assegurou cumprimento da norma legal e disse confiar na apuração das autoridades.
A rádio apontada pela campanha como supostamente responsável pela maior diferença na veiculação de inserções negou a irregularidade.
"Estamos em dia com o Tribunal Eleitoral, veiculamos todas as inserções que são enviadas para nós, e estamos fazendo nossa parte", disse a Rádio da Bispa, de Recife, no Instagram.
O TSE lembrou em nota oficial "que não é função do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) distribuir o material a ser veiculado no horário gratuito. São as emissoras de rádio e de televisão que devem se planejar para ter acesso às mídias e divulgá-las seguindo as regras estabelecidas".
De acordo com as principais pesquisas eleitorais, Bolsonaro está entre 4 e 6 pontos atrás de Lula na disputa presidencial que se encerra no próximo domingo.
Desde o começo da campanha, o atual presidente vem atacando o TSE e afirmando, sem provas, que o sistema de votação eletrônico é passível de fraude. Nas últimas semanas, Bolsonaro e aliados também têm acusado o TSE de perseguir sua candidatura.
O atual mandatário já disse que só reconhecerá os resultados se considerar que as eleições forem limpas e transparentes, sem detalhar o que isso significa, o que aumenta o temor de adversários e observadores internacionais de que ele não acate uma eventual derrota.
SERVIDOR EXONERADO
Também nesta quarta, o servidor Alexandre Gomes Machado, que ocupava cargo de confiança no TSE, foi exonerado pelo tribunal, o que alimentou ainda mais o discurso bolsonarista sobre a denúncia relativa às inserções.
Machado, que estava lotado como assessor de gabinete da Secretaria Judiciária da Secretaria-Geral da Presidência e trabalhava na área do TSE que trata das inserções, decidiu prestar depoimento na Polícia Federal após saber de sua exoneração, e alegou que desde 2018 vinha apontando problemas nas veiculações da propaganda eleitoral, segundo documento obtido pela CNN Brasil.
No meio da tarde, o TSE divulgou uma segunda nota na qual afirmou que as alegações feitas pelo servidor em depoimento perante a Polícia Federal são "falsas e criminosas".
"Ao contrário do informado em depoimento, a chefia imediata do servidor esclarece que nunca houve nenhuma informação por parte do servidor de que 'desde o ano 2018 tenha informado reiteradamente ao TSE de que existam falhas de fiscalização e acompanhamento na veiculação de inserções de propaganda eleitoral gratuita'."
O TSE disse ainda que a exoneração "foi motivada por indicações de reiteradas práticas de assédio moral, inclusive por motivação política, que serão devidamente apuradas".
Em seu depoimento à PF, Machado havia dito que temia por sua integridade física e que fossem imputados a ele "fatos desabonadores".
Machado disse ainda à PF que foi exonerado após informar que a rádio JM Online teria admitido não ter repassado 100 inserções da campanha de Bolsonaro entre os dias 7 e 10 de outubro.
A rádio de Uberaba, no entanto, disse em nota na tarde desta quarta que isso se deu porque o PL, partido do presidente, não enviou o material a ser divulgado.
"No início do segundo turno das eleições presidenciais, os mapas e materiais de uma das campanhas deixaram de ser enviados", explicou a rádio, acrescentando que procurou a Justiça em busca de uma orientação. "Da mesma forma, a emissora acionou o Partido Liberal, expondo a questão e pedindo que os mapas e materiais voltassem a ser encaminhados por email, a exemplo do que ocorreu no 1º Turno. Essa providência foi, então, adotada pelo Partido Liberal."
Em comício em Minas Gerais, pela manhã, Bolsonaro aproveitou o gancho da demissão do servidor para carregar seus ataques ao TSE e também ao PT.
"E não será demitindo um servidor do TSE que o TSE colocará uma pedra nessa situação. Aí tem dedo do PT... O que foi feito, comprovado por nós, pela nossa equipe técnica, é interferência, é manipulação de resultado... lamentavelmente PT e TSE têm muito que se explicar nesse caso", acrescentou Bolsonaro, sem elaborar como o PT poderia estar envolvido no caso.
A campanha de seu adversário, por outro lado, decidiu não entrar no debate e não alimentar o assunto.
(Reportagem adicional de Ricardo Brito, em Brasília; Eduardo Simões, em São Paulo; e Rodrigo Viga Gaier, no Rio de Janeiro)