Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - O governo norte-americano criticou a postura do presidente Jair Bolsonaro durante visita à Rússia, realizada esta semana, e a declaração de solidariedade àquele país, em meio às tensões com a possibilidade de uma invasão russa na Ucrânia.
Em uma declaração, o Departamento de Estado dos Estados Unidos afirmou que foi criada uma "falsa narrativa" de que a atuação diplomática norte-americana sobre o Brasil na questão envolveria pedir ao país que escolhesse entre os EUA e a Rússia.
"Esse não é o caso. Essa é uma questão de o Brasil, como um país importante, parecer ignorar uma agressão armada de uma grande potência contra um país vizinho menor, uma postura inconsistente com a ênfase histórica do Brasil na paz e na diplomacia", diz a declaração.
Na quarta-feira, durante a visita de Estado à Rússia, em uma declaração inicial ao lado do presidente russo, Vladimir Putin, Bolsonaro afirmou que era "solidário à Rússia", sem esclarecer sobre o que estaria falando.
Mais tarde, na declaração conjunta, de novo ao lado de Putin, elaborou:
"Somos solidários a todos aqueles países que querem e se empenham pela paz. Temos uma colaboração intensa (com a Rússia) nos principais foros internacionais como o Brics, o G20 e as Nações Unidas, onde defendemos a soberania dos Estados, o respeito ao direito internacional e a Carta das Nações Unidas."
A declaração norte-americana faz críticas diretamente à fala de Bolsonaro.
"O timing do presidente do Brasil para expressar solidariedade à Rússia, conforme as forças russas estão se preparando para lançar ataques a cidades ucranianas, não podia ser pior. Isso enfraquece a diplomacia internacional, direcionada a evitar um desastre estratégico e humanitário, assim como os próprios apelos brasileiros para uma solução pacífica para a crise", aponta.
Bolsonaro havia sido orientado a não tratar da possibilidade de uma guerra entre Rússia e Ucrânia e ele mesmo havia dito que não tocaria no assunto se Putin não o fizesse, o que acabou acontecendo não apenas na conversa entre os presidentes, mas no encontro entre os chanceleres Carlos França e Sergei Lavrov.
Na sua declaração, França afirmou que foram tratadas questões regionais, mas não elaborou, enquanto Lavrov elencou uma série de queixas contra os Estados Unidos e a União Europeia que teria falado aos brasileiros durante a reunião.
Ainda depois, em uma entrevista à imprensa brasileira, Bolsonaro confirmou que o assunto foi tema da conversa com Putin.
"Falei ao presidente Putin que o Brasil apoia qualquer país que busque a paz. E essa é a intenção dele", contou.
Nesta quinta-feira, já em Budapeste, não resistiu a falar novamente no tema. Dessa vez ao lado de Viktor Orbán, primeiro-ministro da Hungria, Bolsonaro disse que passou aos húngaros "suas impressões" sobre a situação na Rússia e que considerava que a alegada retirada de tropas russas da fronteira com a Ucrânia seria "um gesto" de Putin.
"A guerra não interessa a ninguém", disse Bolsonaro em declaração conjunta ao lado de Orbán em Budapeste.
Tanto os norte-americanos quanto europeus alegam que não houve retirada de tropas, mas apenas uma movimentação interna. Já a Rússia disse que a desmobilização de exercícios militares leva tempo.
Procurados, Itamaraty e Palácio do Planalto não responderam de imediato a pedido da Reuters de comentário sobre as declarações norte-americanas.