BRASÍLIA (Reuters) - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) foi irônico nesta terça-feira ao comentar o apoio declarado pelo atacante Neymar ao candidato à reeleição Jair Bolsonaro (PL) no segundo turno da disputa pelo Palácio do Planalto, ao mencionar que a posição do jogador pode estar relacionada a um perdão de dívida milionária com a Receita Federal.
O pai de Neymar já se reuniu com Bolsonaro e o ministro da Economia, Paulo Guedes, no passado, para discutir um processo no qual a Receita Federal cobra uma dívida do jogador. Segundo reportagens, a dívida teve seu valor substancialmente reduzido, passando de 188 milhões de reais para cerca de 8 milhões de reais, mas o processo ainda corre na Justiça.
Perguntado em entrevista ao canal de Youtube Flow Podcast se tinha ficado chateado com o apoio declarado por Neymar a Bolsonaro, Lula garantiu que não. "O Neymar tem o direito de escolher quem ele quiser para ser presidente", disse.
"Eu acho que ele está com medo de que se eu ganhar as eleições, eu vá ver o que o Bolsonaro perdoou da dívida do Imposto de Renda dele", brincou o ex-presidente, cuja entrevista quebrou recorde de audiência com mais de 1 milhão de expectadores simultâneos -- quase o dobro do verificado em 8 de agosto, quando Bolsonaro foi ao programa, com uma média de 550 mil pessoas assistindo ao mesmo tempo.
Procurada, a assessoria de imprensa de Neymar disse que não irá se manifestar sobre a declaração de Lula
Lula também comentou a mais recente polêmica envolvendo seu adversário, que em entrevistas se referiu a adolescentes "bonitinhas" venezuelanas que estariam se prostituindo na periferia de Brasília. Segundo o ex-presidente, o comportamento de Bolsonaro "no caso das meninas da Venezuela é o comportamento de um pedófilo".
Bolsonaro foi forçado a pedir desculpas nesta terça pela declaração em meio à imensa repercussão negativa das falas.
Confrontado com a tese de que a esquerda teria um ar de soberba e seria menos acessível a canais de podcast como o Flow, Lula argumentou que há "muita gente boa" nesse campo político, mas ele não detém "a verdade dentro de si".
"É importante a gente saber que tem muita gente séria que não é de esquerda. Muita gente boa, muita gente comprometida, muita gente que pensa no Brasil", defendeu.
O petista também utilizou a entrevista para rebater fake news divulgadas por Bolsonaro e sua campanha, lembrando, por exemplo, de medidas tomadas durante seu governo para assegurar a liberdade religiosa e reafirmando sua posição contra o aborto.
"Ele (Bolsonaro) não mede as consequências do que fala. Tem uma propensão a mentir e falar mentiras. Eu não estava acostumado a fazer política assim", disse.
O ex-presidente também lamentou na entrevista a eleição de alguns parlamentares mais radicais neste ano, mas disse ter a esperança que eles tenham "juízo" no Congresso. Lula comentava a eleição de nomes como o da ex-ministra e aliada de Bolsonaro Damares Alves (Republicanos-DF) para o Senado.
"Você elegeu algumas pessoas que, sinceramente, o Brasil não merecia", disse o petista. "Lamentavelmente essas pessoas são eleitas", afirmou, acrescentando que se eleito terá de "lidar com elas na expectativa" de que elas tenham juízo para atuar a favor da sociedade.
Perguntando sobre a descriminalização da maconha, outro tema bastante explorado pelas fake news, afirmou que o tema não cabe ao governo, mas sim ao Congresso ou ao Judiciário, se entenderem apropriado.
No campo econômico, Lula voltou a prometer que uma eventual gestão sua irá incluir "o pobre no Orçamento" e criticou o atual governo por usar o conflito entre a Rússia e a Ucrânia como motivo para os problemas econômicos do Brasil. "Querer jogar a culpa na guerra na Ucrânia já é demais", disse.
(Reportagem de Maria Carolina Marcello)