BRASÍLIA (Reuters) -O ministro André Mendonça pediu vista no julgamento do marco temporal das terras indígenas no Supremo Tribunal Federal (STF) nesta quarta-feira, adiando uma decisão final sobre o tema que tem oposto, de um lado, indígenas e o governo Lula e, do outro, representantes do agronegócio e a bancada ruralista no Congresso Nacional.
A decisão de Mendonça ocorreu logo após a apresentação do voto-vista do ministro Alexandre de Moraes e acaba dando mais tempo para que o Congresso -- de maioria conservadora -- possa aprovar uma lei que restringe os direitos dos indígenas.
Mendonça tem pelo regimento interno do Supremo 90 dias para devolver o processo para análise.
Na semana passada, a Câmara aprovou uma proposta favorável à adoção da tese e o projeto agora está no Senado. Atores de Hollywood como Leonardo DiCaprio e Mark Ruffalo chegaram a se manifestar nas redes sociais contra a aprovação da proposta pela Câmara.
De maneira geral, a tese do marco temporal, se vencedora no Congresso ou via Supremo, introduziria uma espécie de linha de corte para as demarcações de terras indígenas. As terras só seriam passíveis de demarcação se ficar comprovado que os índios estavam nelas até a promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988. Do contrário, não haveria esse direito.
Na retomada do julgamento paralisado desde 2021, Moraes apresentou nesta quarta um voto em que acompanha parcialmente o voto do relator Edson Fachin em que, sob condicionantes, se colocou contra a adoção do marco temporal.
No seu voto, Moraes votou contra o marco, mas defendeu uma série de condicionantes como o pagamento de indenizações a particulares em dinheiro ou títulos da dívida agrária se o ocupante das terras dos indígenas tiver, por exemplo, promovido benfeitorias.
Desde a semana passada, indígenas estão acampados na área central de Brasília para pressionar as autoridades pela rejeição da adoção do marco temporal e acompanhar a análise do caso na Esplanada dos Ministérios. Uma delegação de lideranças, entre elas do povo xokleng, que está no centro da discussão do caso, acompanhou a sessão desta quarta-fira no plenário do STF.
Dados do Mapa da Violência contra os Povos Indígenas produzido pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi) em 2021 apontam que, das 1.393 terras indígenas no Brasil, 437 foram registradas ou homologadas.
O assessor jurídico do Cimi Rafael Modesto estimou à Reuters que uma decisão a favor da adoção do marco temporal vai ter um impacto em 90% a 95% de todas as comunidades indígenas no Brasil.
Para Modesto, se a tese passar, mesmo áreas que já tiverem sido demarcadas com base na Constituição poderão ser alvos de pedidos de revisão judicial, uma vez que o marco temporal se limita à posse física em outubro de 1988.
(Por Ricardo BritoEdição de Pedro Fonseca)